01/01/2025

Breve Comentário as Categorias de Aristóteles

Prefácio.

O livro dos Predicamentos, ou livro das Categorias, é um dos livros mais debatidos da história da filosofia; um dos últimos livros a serem coletados por Aristóteles das notas de suas aulas (de seus escritos exotéricos), de quando o Filósofo estava já doente e próximo a morte; por isso, as Categorias, icônico livro da história da filosofia, não foi burilado corretamente e de maneira precisa tal como outras de suas obras.

E é um fato curioso, que justamente o livro mais importante da lógica, tenha ficado fragmentário e em grande parte sem os nexos adequados; pois, a partir dos problemas predicamentais, a história das ideias foi de uma parte a outra; épocas se ergueram e épocas caíram sob as interpretações que surgiram deste livro do Filósofo, tanto na civilização ocidental quanto na civilização oriental.

Ora, por exemplo, a escolástica se inicia com um problema evocado a partir dos predicamentos, o problema dos universais, descritos por Porfírio e abalizados por Boécio. No entanto, a escolástica também decai a partir dos predicamentos, com os problemas propugnados por Ockham, que se apercebeu destes em seu comentário as Categorias, mas que infelizmente a eles sucumbira (um mistério das épocas? Talvez!?); pois, filosoficamente, o nominalismo surge a partir de um problema predicamental não resolvido e/ou tomado de maneira errônea.

E, isto, sem evocar o problema da analogia que emerge como um dos maiores problemas da filosofia a partir do livro das Categorias, e que mesmo Santiago Ramirez em sua monumental obra De Analogia não conseguira solucionar; além de vários outros problemas que não foram analisados de maneira adequada.

E, apesar de Porfírio ter aclarado toda a problemática dos universais a partir do cap. II das Categorias, e os predicamentos, principalmente a substância (cap. V), terem sido muito debatidos ao longo da história, há ainda inúmeros outros problemas que não foram sequer evocados; e, sem nenhuma hipérbole, se pode afirmar que o livro das Categorias é um “campo minado” de problemas filosóficos.

Deste modo, diante deste livro, que é superado em profundidade apenas pela Metafísica, que Avicena chamou de o livro mais difícil de todos, se estabelece os problemas fundamentais que permeiam da física a ética e as artes; basicamente toda a filosofia é permeada pelos problemas predicamentais, pois, o contato com a realidade, e o conhecimento haurido da realidade, sempre se defronta com as proposições predicamentais, já que estes, em ordem as operações do intelecto, estão sob a primeira operação do intelecto.

Portanto, se vai comentar esta obra a fim de aclarar todas estas questões, e extrair novos problemas, para demonstrar toda a profundidade peculiar do livro das Categorias.

E este comentário menor, é talhado para abalizar estas questões de modo a apresentar o que concerne ao livro das Categorias, para que, depois, no comentário médio se possa explicar, comentar, reavaliar, reestruturar e abalizar este livro, a fim de acrescentar as digressões necessárias para explicar e demonstrar os nexos faltantes deste texto em ordem a toda a filosofia aristotélica.

Por fim, se relembra que fora dito que através da Metafísica se pode provar, de maneira irrefutável, que Aristóteles é o maior de todos os filósofos; realmente, isso é um fato; todavia, não somente através da Metafísica, mas também através das Categorias se pode constatar que Aristóteles é, por honra mais do que devida, o Filósofo.

Soli Deo Gloria!

In Nomine Iesus!

Dezembro de 2024.

 

Esboço do Livro das Categorias. 

Parte I: Os Anti-Predicamentos (Caps. I-III).

Capítulo I: As Coisas Predicáveis.

Capítulo II: As Coisas Predicamentais.

Capítulo III: As Coisas Predicamentadas.

Parte II: Os Predicamentos (Caps. IV-IX).

A. A Primeira Categoria Geral (Caps. IV-V).

Capítulo IV: O Preâmbulo às Categorias.

Capítulo V: A Substância.

B. A Segunda Categoria Geral e Suas Características (Caps. VI-IX).

Capítulo VI: A Quantidade.

Capítulo VII: A Relação.

Capítulo VIII: A Qualidade.

Capítulo IX: Os Seis Predicamentos em Comum.

Parte III: Os Pós-Predicamentos (Caps. X-XIV).

Capítulo X: Os Opostos.

Capítulo XI: Os Contrários.

Capítulo XII: O Anterior.

Capítulo XIII: O Simultâneo.

Capítulo XIV: O Movimento.

Capítulo XV: O Ter.

 

Prólogo.

1. O livro dos Predicamentos, ou Categorias, segundo Boécio, versa sobre as dez palavras que concernem aos dez primeiros gêneros das coisas no que são significantes[1], isto é, a partir de quando estão na dialógica predicáveis-predicadas; pois, o que concerne a lógica, é a consideração das coisas que são significantes, ao passo que a medida que são significadas se as compreende não apenas como intenções lógicas, mas como realidades.

2. Deste modo, o Filósofo, neste livro, inicia as elucubrações sobre a lógica enquanto ciência dos predicamentos, em ordem ao ente; mas, não ao ente enquanto ente, como se faz na Metafísica, mas ao ente predicável e suas nuances; pois, compreender as partes do ente e suas elucubrações, é o que antecede o estudo da sabedoria; mais propriamente, é uma propedêutica do estudo da sabedoria; e, como as partes do ente, diz respeito inicialmente ao ente predicável, então, compete analisar o que concerne ao ente predicável antes de propriamente se adentrar as esferas modais do ente.

3. E a lógica é a parte da filosofia que versa sobre o ente predicável (por isso, é a propedêutica da filosofia); especificamente, a primeira parte da lógica; pois, a lógica é subdividida em duas partes: a teórica e a prática; a teórica versa sobre o ente predicável, e consta nas Categorias e no Sobre a Interpretação; a prática versa sobre o silogismo e consta dos Analíticos aos Elencos Sofísticos (ou Refutações Sofísticas).

Ora, quanto a parte prática, não há muito o que se afirmar de antecedência, visto estar basicamente completa, embora se tenham muitos textos faltantes em relação a sofística; no entanto, quanto a parte teórica, apenas o Sobre a Interpretação é um tratado mais completo, enquanto as Categorias é um texto fragmentário e com inúmeros problemas teoréticos, mas que demonstram uma óbvia “ambição metafísica”, embora sujeita a dialógica ambígua entre o que é predicável e o que de fato é predicamentado (ou: entre as noções lógicas e as coisas e/ou os seres).

4. Portanto, na elucubração sobre as Categorias há de se compreender que os problemas predicamentais evocados são de suma importância, conquanto sejam de grande dificuldade; por isso, se compreende que mesmo que o livro dos Predicamentos esteja incompleto e seja fragmentário, é um dos mais importantes livros da filosofia.

Assim sendo, compreender estes problemas é iniciar o estudo da filosofia pela propedêutica da filosofia, ao mesmo tempo em que elenca-se questões que inferem diretamente a compreensão sobre a Filosofia Primeira; no entanto, os problemas predicamentais, hão de ser analisados tendo em vista a lógica.

Logo, se deve primeiro evocar estes problemas e demonstrá-los de acordo com a ordem do texto, para depois, se procurar explicá-los e resolvê-los.

5. E isto não é algo tão simples; pois, ao se evocar estes aspectos, o texto das Categorias, que historicamente é dividido em três partes: anti-predicamentos (caps. I-III), predicamentos (caps. IV-IX) e pós-predicamentos (caps. X-XV), certamente evocará problemas tão aporéticos que pensar-se-á serem mais de três livros distintos que foram acoplados juntos; muito embora isso possa assim parecer, no entanto, se compreende que é apenas um único livro, que fora junções das notas de aulas sobre este assunto, muito provavelmente coletados pelo Filósofo quando este estava doente e pouco antes de morrer[2], demonstrando com isso que não teve o tempo e as forças necessárias para elaborar um tratado mais preciso, tal como fizera com o Sobre a Interpretação e em outros escritos.

6. Deste modo, a estrutura fragmentária, e os grandes nexos faltantes entre uma parte e outra, principalmente nos anti-predicamentos e nos pós-predicamentos, ao serem olhados com mais cuidado, fornecerão instrumentos significativos para a elucubração filosófica; com isso, se estabelece tais reflexões com o objetivo de aclarar o significado das partes gerais e o conteúdo do livro das Categorias, para abalizar a primeira coluna da parte teórica da lógica, seguindo a linha dos comentadores antigos, a fim de esclarecer da melhor maneira possível este singular texto do Filósofo.

Pois, além de versar sobre os problemas predicamentais, as reflexões provenientes deste livro, fornecera os insights necessários para as elucubrações que formaram outros icônicos livros da história da filosofia, tais como, a Isagoge de Porfírio, tida como um modo de introdução as Categorias; a Paráfrase Temistiana, um outro modo de compreender a designação das dez categorias; o Livro dos Seis Princípios; etc. Na verdade, estes três livros supramencionados se concatenam quanto aos problemas anti-predicamentais; etc.

7. Portanto, ao se explicar as Categorias, tendo em vista estes aspectos, se compreende que é o texto fundamental pelo qual se entende o propósito e a intenção do Filósofo nos livros que compõem o Órganon; por isso, para Alberto, a lógica é a ciência pela qual se alcança o conhecimento do que é desconhecido através do que é conhecido[3]; logo, a partir do conhecimento do que versa as Categorias, se consegue aclarar os aspectos desconhecidos, através dos quais, se avança em direção ao que é conhecido e ao próprio de modo de conhecer e ao modo de significar.

8. Pois, a lógica, principalmente em sua parte teórica, versa sobre aspectos desconhecidos a partir dos conhecidos, para que o que é desconhecido seja mais facilmente compreendido, e assim, o modo de conhecer se torne mais abalizado pela explicação do que já se conhece; por isso, posteriormente, o Filósofo vai afirmar que todo ensino e toda instrução intelectual procedem de conhecimento pré-existente (cf. Anal. Post. 71a1); etc.

Logo, a instrução intelectual precedente fundamental a qualquer saber e conhecimento, é o conhecimento e o entendimento sobre os preceitos lógicos concernentes a predicação (Categorias) e a interpretação (Sobre a Interpretação), e modo como os entes são expressos racionalmente de maneira correta, a saber, através do silogismo, que se subdivide em algumas espécies, dando forma aos livros subsequentes a primeira parte da lógica, isto é, os livros da segunda parte da lógica; etc.

 

§ 1. A razão dos anti-predicamentos.

(Cat., I-III, 1a1-1b24)

9. A primeira parte do livro das Categorias são os anti-predicamentos (caps. I-III); e os anti-predicamentos são subdivididos de dois modos: primeiro, quanto a estrutura predicatória; segundo, quanto aos preceitos predicatórios.

10. Em relação ao primeiro, se o subdivide em três modos: primeiro, as coisas predicáveis (cap. I); segundo, as coisas predicamentais (cap. II); terceiro, as coisas predicamentadas (cap. III).

Ora, esta subdivisão é a que concerne quanto aos três capítulos dos anti-predicamentos, e está em ordem a estrutura geral do livro, que embora fragmentário, tem o nexo geral quanto ao tema fundamental da primeira parte da parte teórica da lógica.

11. Em relação ao segundo, se o subdivide em dois modos: primeiro, em relação aos modos e as formas de predicação, ou primeiros princípios anti-predicamentais (cap. I); segundo, em relação aos preceitos ontológicos dos anti-predicamentos (caps. II-III).

Ora, esta subdivisão concerne ao entendimento da profundidade e de toda a ampla gama de problemas predicatórios e ontológicos que estão imbuídos nos anti-predicamentos; pois, enquanto no cap. I se aclara uma série de problemas e pressuposições quanto as noções lógicas, que permeia desde a noção do ato predicatório até a noção da posição da analogia na ciência dos predicamentos, nos caps. II-III se aclara uma série de problemas e pressuposições quanto as noções ontológicas, tanto em relação as coisas quanto em relação aos seres, muito embora sob a estrutura predicamental.

Por isso, dos caps. II-III, surge uma série de preceitos que dão origem tanto a Isagoge de Porfírio, que neste sentido busca ser uma introdução aos predicamentos (caps. IV-IX), ao invés de uma introdução geral as Categorias como muitos parecem propugnar; quanto ao Livro dos Seis Princípios, que emerge da dialógica que está no cap. II (e que também está no cap. IX); mas que mesmo com estas obras parece permanecer incompletas, alcançando alguma completude de sentido apenas com o “Tractatus brevis de modis distinctionum” (Tratado breve sobre o modo das distinções) de Pedro Tomás.

12. Além disso, a estrutura disposta no cap. II, demonstra tanto o que concerne a predicação, nas Categorias, quanto aponta para o que concerne a interpretação; portanto, se estabelece tanto o preceito a respeito de como se predica as coisas incomplexas, através das dez categorias, quanto o preceito de como se entende as coisas complexas, através das orações, tal como se demonstra nas duas partes do Sobre a Interpretação.

13. Deste modo, a razão dos anti-predicamentos se estabelece em um preceito tríplice, a saber: primeiro, os aspectos antecedentes aos predicamentos; segundo, os preceitos ontológicos da lógica; terceiro, as primeiras percepções quanto ao ato predicatório.

14. Primeiro, os aspectos antecedentes aos predicamentos; ora, os anti-predicamentos, evidentemente, são os antecedentes dos predicamentos; Alberto os intitula de “antecedentibus ad scientiam libri preadicamentorum” (antecedentes ao livro da ciência dos predicamentos); na verdade, não somente antecedentes aos predicamentos, mas nos preceitos imbuídos nos anti-predicamentos, se haure o necessário para estabelecer a base introdutória da lógica; pois, para Alberto, é a partir da Isagoge de Porfírio que se tem uma introdução a lógica, o que o grande mestre alemão chama de “antecedentibus ad logicam” (antecedentes a lógica); todavia, como já fora afirmado, a Isagoge não é uma introdução às Categorias como um todo, mas uma introdução específica aos predicamentos (caps. IV-IX); logo, não está em ordem a Isagoge o dignar os antecedentes da lógica, mas sim os anti-predicamentos, que em linha gerais não é somente a parte inicial das Categorias, mas de toda a lógica.  

Portanto, os anti-predicamentos estabelecem os antecedentes aos predicamentos, ao mesmo tempo em que fornece os preceitos necessários para os antecedentes a lógica como um todo; por isso, antes de adentrar aos predicamentos é necessário se compreender três coisas: primeiro, a designação da possibilidade da predicação, ao evocar o ente como algo predicável, e, consequentemente, em sua tríplice relação predicamental, a saber, os equívocos, os unívocos e os cognominados (cap. I); segundo, a demonstração da predicação, ao evocar o ente predicado numa relação quadrupla com a designação predicamental, e isto a partir de sua dupla distinção, a saber, ou como incomplexo, ou como complexo (cap. II), sendo o objeto próprio das Categorias, os incomplexos; terceiro, a evidência da predicação, ao evocar o modo como as coisas predicamentadas estão dispostas num enunciado com sujeito e predicado, e isto a partir de uma dupla distinção, a dos gêneros e a das diferenças (cap. III).

E isto tudo abalizado propriamente pelo encargo textual, pela estrutura textual, pela normativa textual, e por tudo aquilo que está disposto de modo peculiar nas entrelinhas do cap. I.

15. Segundo, os preceitos ontológicos da lógica; ora, o cap. I, abaliza tudo quanto diz respeito aos anti-predicamentais, mas também abaliza um preceito fundamental nas entrelinhas do cap. II, a saber, os preceitos ontológicos da lógica; a lógica não é ciência real, mas é instrumento para ciência real (Metafísica), como Calov demonstrara[4].

Logo, na estrutura quadrilátera evocada no cap. II a partir da designação do sujeito, se tem um preceito ontológico que evoca a própria estrutura ontológica da realidade, bem como o modo como esta estrutura se dá no ato predicatório; ora, isto é demonstrado através dos quatro tipos de ente evocados nas distinções do sujeito propugnadas pelo Filósofo na segunda parte do cap. II, pois, como se sabe o cap. II é subdividido em duas partes: a primeira, onde se fazem duas divisões; uma, onde trata das coisas incomplexas e complexas (cf. Cat. 1a16-19); e outra, onde trata dos quatro tipos de ente de acordo com a designação do sujeito (cf. Cat. 1a20-28). E a segunda, onde a evoca a definição do que existe no sujeito (cf. Cat. 1a29-1b9).

16. Terceiro, as primeiras percepções quanto ao ato predicatório; ora, os anti-predicamentos abalizam as percepções iniciais a respeito do ato predicatório, a fim de ajuizar o que concerne a este ato feito indistintamente por todos os seres humanos, mas que muitas vezes sequer é elucubrado de modo adequado; assim, as primeiras percepções quanto ao ato predicatório são compreendidas a partir do modo da predicação e da maneira como a predicação é demonstrada e evidenciada.

Pois, existe uma diferença entre o que é predicado de acordo com a preceituação silogística, e expresso em dez categorias, e o que é predicado mormente com a preceituação real, e expresso em dez gêneros de realidades; os vocábulos são os mesmos, o número de categorias também, mas a forma de expressar e o entendimento no ato predicatório são diversos.

Assim sendo, as primeiras percepções quanto ao ato predicatório demonstram a diferença entre o preceito tópico a respeito das categorias, tal como no livro dos Tópicos, e parte do sujeito da parte prática da lógica, e o preceito predicamental a respeito das categorias, tal como no livro das Categorias, e parte do sujeito da parte teórica da lógica. Ou, como um estudioso aristotélico bem afirmara: “As duas obras tratam a mesma relação mas com nuances diferentes: os Top. concentram-se nos dez predicados, as Cat. nos gêneros de realidades expressados por aqueles[5]; ou dito de outro modo, as categorias a partir do preceito tópico dizem respeito ao silogismo, e as categorias a partir do preceito predicamental dizem respeito aos gêneros de realidade.

Com isso, o que concerne ao preceito tópico, é entendido a quem já dominou o raciocínio como algo consciente; enquanto que o que concerne ao preceito predicamental, é entendido por quem está desenvolvendo a compreensão sobre o saber e sobre a primeira das operações do intelecto; assim, as operações do intelecto são sempre lógicas, pois, um intelecto permeado pela sobriedade racional está em ordem, e esta ordem é demonstrada pela forma como a estrutura da lógica está disposta. Por isso, a inteligência se desenvolve na abstração da realidade, já que está em consonância com a ordem da realidade, expressa em termos lógicos com e nas operações do intelecto.

17. A razão dos anti-predicamentos está em ordem ao que significa o livro das Categorias, como primeira coluna da parte teórica da lógica; e, mesmo que o texto esteja fragmentário, as possibilidades demonstradas no texto concernem aos mais importantes problemas lógicos, que depois são retomados e analisados de outro modo na Metafísica; pois, as noções lógicas são permeadas pelo ser já que provêm da realidade, muito embora não versem sobre o ser enquanto o ser, objeto da Metafísica, mas versam sobre o ser enquanto bem que está inerente nas coisas e nos seres; por isso, as noções lógicas também tem algo deste bem; portanto, as noções lógicas são permeadas pelo ser enquanto bem presente nas coisas e na natureza das coisas, tal como se demonstra no ato predicatório, ou a apreensão dos indivisíveis (cf. De An. 430a26).

18. Portanto, compete compreender o que concerne a cada um dos capítulos dos anti-predicamentos. Pois, em cada capítulo dos anti-predicamentos, se tem um preceito que abaliza o entendimento sobre os predicamentos e do que concerne a tarefa da predicação; e, embora o livro das Categorias careça de um proêmio, pois, já adentra na descrição dos três modos de predicar, os problemas anti-predicamentais são por si um caso a parte nas elucubrações lógicas; no entanto, o que está delineado nos anti-predicamentos é suficiente quanto ao entendimento sobre o que antecede a compreensão sobre os predicamentos e sobre a lógica como um todo; por isso, podem ser intitulados de problemas concernentes a “lógica pura”.

19. Ora, o que concerne ao cap. I, são as coisas predicáveis; pois, toma-se o termo coisa como descrição genérica para os entes existentes; logo, o cap. I versa sobre as coisas predicáveis, sobre o que pode ou não ser predicado; com isso, se afere a possibilidade da predicação e sua compreensão quanto ao modo como o que é predicado é expresso enquanto tem por parâmetro outro algo real; pois, se se predica determinado algo, o modo de expressar este algo predicado se coaduna com outro algo real que já fora predicado; portanto, o que é predicado demonstra-se ou pela homonímia, ou pela sinonímia, ou pela paronímia, tendo como parâmetro outro algo demonstrado desta forma.

E, isto, evidentemente, embora pareça destoado da reflexão predicatória, descreve um princípio fundamental, já que tudo que é predicado ou se defronta com alguma dessemelhança em algo já predicado, que dá origem aos homônimos; ou com alguma semelhança em algo já predicado, que dá origem aos sinônimos; ou ainda ao mesmo tempo com alguma semelhança-dessemelhança em algo já predicado, que dá origem aos parônimos.

Além disso, a ordem propugnada também infere algo em relação a predicação; pois, o Filósofo, respectivamente, apresenta os homônimos, depois os sinônimos, depois os parônimos; e esta é a ordem que ocorre realmente quanto ao ato predicatório; pois, sempre se predica algo em equivocidade, depois, compara-o ou acomoda-o a algo em univocidade, e, por fim, surge algo em estrutura cognominada. Logo, o que primeiro é conhecido é o que é desconhecido, ou que não é expresso num enunciado, mas que é apresentado por um dos dez gêneros de realidades ou categorias.

Mas, em suma, esta designação do cap. I, ainda se mantém propriamente no âmbito apenas das noções lógicas, embora a significação seja algo que ocorra realmente, isto é, com um referente. Pois, como versa sobre o que é predicável, então, estabelece-se na possibilidade de ser predicado, a qual se for efetivada, se dá do modo que fora descrito. Logo, somente o que se mostra como predicável, é que realmente se torna algo predicamental e/ou predicamentado.

20. Ora, o que concerne ao cap. II, são as coisas predicamentais; pois, o que é descrito como predicável, ao ser predicado, se torna algo predicamental; assim, tudo o que é predicamental, em suma, é algo que já fora predicado, ou está expresso como incomplexo, e assim se defronta com alguma das categorias, ou está expresso como complexo, e assim está disposto num enunciado. Logo, as coisas predicamentais, estão dispostas de dois modos: primeiro, em relação a distinção entre incomplexos e complexos; segundo, a definição das coisas predicamentais em quatro classificações.

Deste modo, o que concerne ao primeiro modo, abaliza a distinção da parte teórica da lógica em dois princípios gerais: o primeiro, quanto as coisas incomplexas, nas Categorias; o segundo, quanto as coisas complexas, no Sobre a Interpretação. E o que concerne ao segundo modo, abaliza a compreensão sobre os tipos de ente de acordo com a ordem ontológica da realidade.

Portanto, as coisas predicamentais, abalizam o que concerne aos preceitos constituintes da lógica, bem como abaliza a compreensão do que concerne as coisas complexas, já que demonstra que as coisas complexas estão no sujeito, e possuem algum predicado, embora só sejam realmente elucubradas a partir da investigação sobre o enunciado; no entanto, a segunda parte do cap. II e o cap. III, são uma forma de introdução geral à segunda operação do intelecto.

21. Ora, o que concerne ao cap. III, são as coisas predicamentadas; pois, o que é predicamental, ao ser demonstrado, se torna algo predicamentado; assim, o que fora predicado, se demonstra como predicamentado através de um sujeito e de um predicado, isto é, num enunciado, onde se tornam evidentes os gêneros e as diferenças do que fora predicado; com isso, as coisas predicamentadas, complementam a designação das coisas predicamentais, e encerram o que concerne a compreensão sobre as coisas complexas; e, conquanto as Categorias versem sobre as coisas incomplexas, antes de propriamente designar o que concerne as categorias pelas quais as coisas incomplexas são expressas, é necessário compreender o modo como as coisas que estão em combinação (ou em proposição) são expressas, donde se afirmar as mesmas como coisas predicamentadas, isto é, as coisas predicadas que estão em combinação, e por isso possuem sujeito e predicado.

Deste modo, as coisas predicamentadas são um anteposto aos predicamentos; pois, tudo quanto concerne as coisas predicamentais (cf. Cat. 1a16-19), segue-se logicamente a partir do cap. IV; no entanto, as coisas predicamentadas são colocadas para complementar o entendimento designado no cap. II (cf. Cat. 1a20-22), bem como para abalizar esta questão; por isso, pode-se afirmar que as coisas predicamentadas são uma espécie de adendo antes dos predicamentos; e isto não impugna a importância do cap. III, mas esclarece a razão de ser deste capítulo diante da estrutura e dos preceitos concernentes a ciência predicamental.

22. E o que fora dito basta quanto a compreensão a respeito da razão dos anti-predicamentos, que serve não somente de antecedente aos predicamentos, mas que se for analisada e extraída toda a profundidade que está imbuída neste pequeno texto, se obtém os princípios teóricos basilares do que se constitui a lógica, e, por consequência, de todo a enciclopédia do saber. Ora, isto basta quanto a uma apresentação dos anti-predicamentos.

 

§ 2. A razão dos predicamentos.

(Cat., IV, 1b25-2a10)

23. A segunda parte do livro das Categorias são os predicamentos (caps. IV-IX); e, os predicamentos são entendidos de dois modos: primeiro, em relação a uma definição em dez vocábulos; segundo, em relação a uma dupla distinção geral.

24. Em relação ao primeiro, se o subdivide em dez vocábulos que concernem aos dez predicamentos, os quais são: substância, quantidade, qualidade, relação, lugar, tempo, posição, estado, ação e paixão. Estes dez vocábulos designam basicamente o que concerne aos predicamentos. E, quanto a esta designação não há muito o que falar pois é conhecida e costumeira na interpretação do livro das Categorias.

25. Em relação ao segundo, se o subdivide em duas distinções: uma, com a primeira categoria geral; a outra, a segunda categoria geral e suas características. A primeira categoria geral é a substância (cap. V); a segunda categoria geral é o acidente e suas características (caps. VI-IX). E esta dupla distinção, também utilizada em muitos comentaristas antigos, é a que melhor convém sobre o que concerne a ciência dos predicamentos.

Logo, nesta dupla distinção geral se compreende melhor o propósito e o encargo dos predicamentos, pois, tudo o que não é substância, necessariamente é acidente, pois, como Alfarábi afirmara, não há nada além de substância e acidente[6]; portanto, ao se subdividir os predicamentos em dois blocos gerais, se compreende a inter-relação entre as categorias, bem como a suficiência das categorias, tanto em relação aos dez vocábulos quanto em relação a ordem dos mesmos, e o próprio modo como as coisas são expressas tanto a partir de si mesmas quanto na própria ordem da realidade.

26. E, justamente o cap. IV, é o que faz o nexo entre o que é afirmado na primeira parte do cap. II (cf. Cat. 1a16-19), e entre o que concerne as coisas incomplexas, a saber, as categorias (cf. Cat. 1b25ss); assim sendo, é um preâmbulo aos predicamentos; pois, volve-se à linha de argumentação básica do que concerne as coisas incomplexas, propriamente como aquilo que ao ser predicado não possui combinação; etc.

27. Deste modo, a razão dos predicamentos é tríplice, a saber: primeiro, evoca o que se refere as coisas incomplexas; segundo, delineia o que é necessário compreender primeiro em relação ao ato predicatório; terceiro, designa os preceitos básicos da análise da realidade.

28. Quanto ao primeiro, se entende duas coisas: primeiro, que tudo que não possui combinação, é algo incomplexo; pois, a não-combinação afere algo que não foi relacionado de maneira real com outro algo quanto a expressão formal na linguagem. Segundo, que os incomplexos são a base para o conhecimento dos complexos, e com isso, proporciona o conhecimento do que é desconhecido através do que é conhecido; por isso, Alberto assevera: “as duas coisas que, quando são desconhecidas, desejamos conhecer, a saber, o incomplexo e o complexo[7]; logo, os incomplexos são a base para o conhecimento dos complexos, bem como da apreensão do que é desconhecido através do que é conhecido.

29. Quanto ao segundo, se entende que o ato predicatório se dá de uma determinada maneira; e, em relação a isso, se compreende tanto o que concerne as operações do intelecto, quanto o que concerne ao que primeiro é necessário compreender no ato predicatório, pois, do mesmo modo como o que é incomplexo abaliza a compreensão do que é complexo, o ato predicatório demonstra o modo de operação do intelecto quanto ao que é predicado, a saber, por assimilação e acomodação; assimilar o que é desconhecido e acomodá-lo com o que é conhecido. O ato predicatório fundamentalmente se dá desta maneira, donde a primeira coluna da parte teórica da lógica ter por objeto a apreensão dos indivisíveis.  

30. Quanto ao terceiro, se entende duas coisas: primeiro, que a análise da realidade é feita tanto de modo abstrativo, ao se abstrair o saber da realidade, quanto de modo estrutural, ao se compreender que o saber que emerge da realidade tem uma estrutura ressoante com a própria realidade; logo, da análise da realidade se abstrai o saber que se coaduna com a própria realidade e com a ordem da realidade demonstrada na ordem do próprio saber. Segundo, que a análise da realidade desenvolve a inteligência, pois, a ordem das operações da inteligência é a mesma que a das operações reais dos entes na realidade, bem como é mesma da ordem das operações lógicas; logo, na análise da realidade existe uma harmonia entre as operações dos entes reais, a abstração destas operações pela inteligência, e das próprias operações da inteligência na abstração da realidade; e estas são, por sua vez, demonstradas na ciência da lógica[8].

31. Assim, fica designado o que concerne aos predicamentos, numa estrutura geral mais abalizada e menos fragmentária do que os anti-predicamentos; mas, com vários aspectos imbuídos nas entrelinhas que tornam os predicamentos uma mina de ouro que permeia não só a lógica, mas a física, a metafísica, a ética e as artes, isto é, em como está disposto todo o corpus aristotelicum.

Logo, os predicamentos são uma forma de entender não somente as coisas incomplexas, mas de tudo aquilo que está como incomplexo em toda a realidade, desde os entes naturais visíveis, até as operações ocultas da natureza; etc.

Pois, os entes reais, quando são predicados, estão em ordem aos predicamentos, que nada mais é do que a descrição em preceitos instrumentais do que concerne a própria ordem da realidade. Donde, a lógica ser o instrumento do saber e para o saber, e a base instrumental da enciclopédia do saber humano.

32. Portanto, o que concerne aos predicamentos está delineado no cap. IV, tanto na descrição das categorias, quanto no modo como estão as categorias. Com isso, cumpre analisar os predicamentos a partir da dupla distinção geral, a saber: a substância (cap. V), e o acidente e suas características (caps. VI-IX).

 

§ 3. A substância.

(Cat., V, 2a11-4b19)

33. A primeira categoria geral é a substância (cap. V); pois, entre o que é predicado, é necessário que venha em primeiro lugar o que é predicado primeiro tanto na ordem ontológica quanto na ordem de eminência, a saber, a substância; por isso, se afirma que da primeira categoria geral se haure o princípio do primado ontológico do indivíduo (cf. Cat. 2a11-14); e, isto está ordenado quanto a ordem da realidade, tanto no sentido lógico, quanto no sentido metafísico; ora, no sentido lógico se prova na própria definição de substância, o que o Filósofo faz neste livro; já no sentido metafísico, se prova na Metafísica; etc.

34. Embora tal descrição demonstre o preceito do primado ontológico do indivíduo de acordo com a filosofia e a teologia, se nos interessa primordialmente aqui a descrição filosófica; logo, cumpre entender os modos como a substância está disposta como primeira categoria geral a partir da filosofia; e, sobre isso, se constata que este capítulo está subdivido em duas partes: primeiro, a definição de substância; segundo, as propriedades da substância.

35. Primeiro, a definição de substância; em primeiro lugar, o Filósofo fornece uma definição de substância (cf. Cat. 2a11-3a7); ora, quanto a isso faz duas coisas: primeiro, define o termo substância (cf. Cat. 2a11-34); segundo, distingue as espécies de substâncias em primárias e secundárias (cf. Cat. 2a35-3a7).

Ora, quanto ao primeiro, ao definir substância, define tanto o que concerne a esta categoria em particular, quanto ao que concerne a ordem ontológica em geral, já que ao definir a substância, também estabelece o primado ontológico do indivíduo demonstrando assim os entes necessários da ordem da realidade. Além do que, a substância primária, como não é predicada, é a condição necessária de toda predicação, como afirmara Trendelenburg[9]; o que faz aferir os graus de eminência em relação as substâncias primárias, chegando assim a Substância Primeira, fundamento de toda ordem e de todas as substâncias primárias; etc.

Ora, quanto ao segundo, ao se distinguir substâncias primárias e secundárias, se faz a distinção entre os seres eternos e necessários tais como Deus, as inteligências separadas (cf. Da Inter. 23a23-24), etc., e os seres temporais tais como os corpos celestes, as coisas, o homem, os animais, etc.; e, desta distinção depende toda a compreensão sobre a ordem ontológica da realidade (Metafísica ou Filosofia Primeira), bem como a ordem de eminência na natureza e no movimento das coisas naturais (Física ou Filosofia Segunda).

36. Segundo, as propriedades da substância; em segundo lugar, o Filósofo analisa as propriedades da substância (cf. Cat. 3a8-4b19); e, evidentemente, esta é a parte mais longa deste capítulo; pois, as substâncias possuem propriedades que demonstram se são substância primárias ou secundárias, bem como demonstram que tipo de substâncias são quanto a ordem da realidade, se são naturais e geradas, ou espirituais e não-geradas; etc.

Por isso, as propriedades das substâncias, são um modo de compreender o que substancial e o que não é substancial; pois, entre as substâncias, existem as substâncias substanciais e as que não são substanciais; ora, as substâncias substanciais são as que existem por si além da máquina do mundo, e as substâncias que não são substanciais existem entre si e são mantidas pela causa primeira através de segundas causas; e esta distinção se aplica tanto no que concerne as substâncias primárias quanto ao que concerne as substâncias secundárias; mas é propriamente parte da investigação que concerne a Metafisica.

Pois, as propriedades da substância são aferidas no ato predicatório, a partir da própria substância, ou de maneira unívoca, ou de maneira equívoca, ou quando da inter-relação com outra substância, de maneira cognominada; portanto, se compreende a razão do Filósofo ter iniciado o livro das Categorias, primeiro pela tríplice distinção como primeiros princípios anti-predicamentais, e tal distinção se mostrar evidente tanto na primeira categoria geral, a substância, quanto na segunda categoria geral, o acidente.

37. Na verdade, as propriedades de uma categoria geral é o que demonstra como o que fora predicado está em relação ao sujeito e/ou como se encontra em um sujeito; no caso da substância, se constata que a mesma não se encontra num sujeito e nem é afirmada de um (cf. Cat. 2a11-13), e isto em relação a um sujeito predicado tendo por base um sujeito predicador; etc.

Pois, dos princípios da substância se abstrai a natureza do acidente, como afirma Kilwardby[10]; por isso, Alberto afirma que a substância é o primeiro gênero de todos [os predicamentos], e um certo princípio de todos os predicamentos[11].

Assim, das propriedades da substância se haure os princípios da segunda categoria geral e de suas características, bem como dos princípios pós-predicamentais; pois, os princípios da substância delineiam e abalizam os princípios de todos os predicamentos, tanto na lógica, quanto na metafísica; pois, a substância primeira, é que abaliza as substâncias primárias, e assim por diante, tanto na ordem das causas quanto na ordem dos causados.

38. Portanto, quanto aos predicamentos, principalmente quanto a primeira categoria geral, o Filósofo conseguira alocar tudo corretamente e esta parte do texto dos Predicamentos quase não é fragmentária e nem possui nexos faltantes tal como os anti-predicamentos e os pós-predicamentos; logo, não há muito o que falar a título de introdução além do que fora descrito, sendo propriamente a explicação deste texto o que melhor delineia o que concerne a própria substância enquanto termo predicamental. Ora, isto que fora dito basta quanto a apresentação da primeira categoria geral.

 

§ 4. O acidente e suas características.

(Cat., VI-IX, 4b20-11b14)

39. A segunda categoria geral é o acidente, e, consequentemente, suas características mais comuns (caps. VI-IX); pois, como se afirma a partir dos antigos comentaristas, o acidente é algo que acontece ao sujeito passível de corrupção; por isso, a definição de Porfírio é a mais utilizada, a saber: “o acidente é o que pode aparecer e desaparecer sem provocar a destruição do sujeito[12]; a qual é embasada na definição do Filósofo no livro V da Metafísica, de que acidente é qualquer atributo que se possa aplicar a um sujeito, não em função de ser um sujeito em particular ou de se ter um tempo ou lugar particulares (cf. Met. 1025a23-25).

Logo, a definição de acidente se dá a partir da designação do sujeito; ora, como a substância, a primeira categoria geral, é aquilo que não é nem dito nem afirmado de um sujeito (cf. Cat. 2a12), então, o acidente, a segunda categoria geral, é o que é passível de ser sujeito ou de ser afirmado a partir de um sujeito.

Por isso, na segunda parte do cap. II, o Filósofo houvera feito a descrição da divisão ontológica dos seres, e das classificações a partir do sujeito, na qual se encontra a própria subdivisão dos predicamentos em substância e acidente.

40. Deste modo, segundo Alberto, o ente passível por si de ser predicável é substância, enquanto que o ente que não é por si predicável ou é passível de ser sujeito, é acidente[13]; ora, o ente passível de ser predicável por si, na definição ferreirina, é a matéria; pois, a matéria é passível de ser predicada por si; e o ente que não é passível de ser predicável por si, o acidente, como na definição ferreirina, é a forma; pois, a forma não é passível de ser predicada por si; a forma permeia o que é per accidens, por isso mesmo, adquirindo formas predicamentais diversas, que se estende em nove predicamentos distintos.

E, embora a distinção matéria-forma se dê mais propriamente na Metafísica, tal distinção já se encontra presente nos predicamentos, dado a lidar com realidades e não apenas com noções lógicas; por isso, as definições ferreirinas são corretas neste sentido, muito embora o filósofo brasileiro as tenha empregado no sentido metafísico nos predicamentos, o que, por si, é um erro - basicamente o erro comum de quase todos os filósofos posteriores a Scotus e Ockham[14]; etc.

Assim, se pode acoplar tal distinção para melhor compreender os gêneros de realidade aos quais se referem as categorias; no entanto, não em relação ao ente enquanto ente, mas ao ente enquanto predicável ordenável a partir das coisas existentes. Por isso, o que é predicável por si é forma, e o que não é, é matéria; e isto em ordem as noções lógicas as quais são extraídas das realidades; pois, o que é predicado, não diz respeito a apenas noções lógicas, mas a realidades; e, sendo realidades, ou lidam com a matéria ou então com a forma; mas estas enquanto são predicáveis e não quanto a essência das mesmas (o que concerne a Metafísica).

41. Assim sendo, as características mais comuns ao acidente são nove, as que o Filósofo enumera nos caps. VI-IX; logo, compete analisar como cada uma destas características se dá a partir da matéria como forma, a saber: quantidade, relação, qualidade, lugar, tempo, posição, estado, ação e paixão.

42. A primeira destas características é a quantidade; isto é, a medida da extensão de algo que exista continuamente ou discretamente; por isso, se diz que algo mede 2 metros ou 3 metros, ou então se algo pesa 2kg ou 3 kg, etc., então se tem a quantidade; logo, a quantidade versa sobre o contínuo e/ou sobre a descrição da extensão de um ser ou de uma coisa; além disso, quantidade significa aquilo que é divisível (cf. Met. 1020a8). Ora, o que é divisível, o é porque é ordenável e dizível; por isso, a primeira das características do acidente é ser divisível, já que é algo incomplexo; pois, os incomplexos dizíveis são divisíveis, e, por isso, passíveis de alguma quantidade.

43. A segunda destas características é o relativo; isto é, o que está relativo a algo, ou em similitude ou em dissimilitude; pois, o ser relativo se dá em coisas opostas ou diversas entre si; por exemplo, o dobro e a metade, são relativos; ou ainda, o triplo e o um terço, são relativos; e neste sentido os relativos estão em ordem a quantidade ou em relação com a quantidade.

Além disso, os relativos se relacionam com a qualidade, pois, algo relativo pode ter semelhança com outro algo, e neste sentido diz respeito a qualidade (cf. Met. 1021a11).

E, assim, o relativo se relaciona de algum modo com as outras características do acidente; pois, tudo que possui alguma relação de similitude ou dissimilitude, ou então da relação entre ambas, é açambarcado em algum modo de relação.

Mas, além disso, os relativos também podem ser descrições a partir de pessoas, onde se afirma da relação entre uma ou mais pessoas, tanto que divergem entre si quanto que concordam entre si; etc.

44. A terceira destas características é a qualidade; isto é, as características circundantes e mais particulares de um ente quanto ao modo de sua existência no que lhe compete; por exemplo, a cor, como branco, negro, etc., a qual é expressão de um acidente nos entes existentes quanto ao modo de sua existência e não tanto em relação a sua essência. Por isso, se diz que qualidade é a diferença na substância, isto é, na essência de algo (cf. Met. 1020a34); donde a partir da qualidade se inferir a diferença entre virtude e vício, ou das paixões inerentes ao movimento (cf. Met. 1020b14-25), e similares; etc.

45. A quarta destas características é o lugar; isto é, a posição dos entes existentes quanto ao seu modo de existir, ou ubicação; por exemplo, o habitat de um determinado animal, ou então, a posição de uma coisa ou um ser no espaço, se está em tal ou tal lugar, se está de acordo com as posições espaciais, ou então, se está dentro ou fora de determinado lugar, e coisas similares; etc. Por isso, tudo que é incomplexo se enquadra num lugar ou numa posição espacial, e de acordo com as propriedades ordenantes deste lugar.

46. A quinta destas características é o tempo; isto é, o movimento do ente existente quanto a sua duração; pois, um ente existe, em relação a matéria, o tanto quanto é durável em relação ao tempo, mas o ente não é propriamente o tempo; por isso, quanto a isso, se identifica o tempo, seja em sua divisão mais simples, em dias, semanas, meses e anos, ou então em sua divisão mais complexa, a saber, entre tempo e eternidade; pois, todo acidente tem a característica inegável de estar sob o tempo e não sob a eternidade, e assim, tem as propriedades inerentes a temporalidade, a saber, o “quando” característico de todo ente. Por isso, se pode afirmar que o tempo de um ente, isto é, o “quando” de um ente, é algo incomplexo. Na verdade, quanto a disposição do tempo em relação a matéria, se pode afirmar que o tempo é algo de incomplexo.

47. A sexta destas características é a posição; isto é, o modo como o ente existente está em determinado momento; por isso, tem ligação com o lugar e o tempo, ou com a ubicação e o quando; logo, se está situado ou de acordo com a posição espacial (seres), ou de acordo com a posição no reino natural (coisas); assim, o estar situado diz respeito ou a estar posicionado (seres animados) ou a ter sido posicionado (as coisas inanimadas). Por isso, a posição de um ente, seja um ser ou uma coisa, diz respeito ao modo deste ente na ordem da realidade, já que sendo incomplexo está sujeito as propriedades da posição em que se encontra.

48. A sétima destas características é o estado (ou ter); isto é, o que as coisas ou os seres possuem enquanto estão em determinado lugar, tempo e/ou posição; por exemplo, um ser humano tem um calçado em determinado local que não o tem em outro, etc.; do mesmo modo, o ter ou não uma arma, e o estar armado; assim, se constata que o estado de uma coisa ou de um ser, neste sentido, é o que esta coisa ou ser tem ou possui de acordo com as características anteriores, ou o que esta coisa ou ser demonstra de si ao existir (também chamado de hábito).

49. A oitava destas características é a ação; isto é, a ação que se acomete sobre determinada coisa ou ser; por exemplo, o cortar, que sucede a um objeto cortável; ou o queimar, que se sucede a um objeto queimável; etc. A ação tem por característica, tal como se diz no Livro dos Seis Princípios, o “agir naquilo em que subjaz, tal como se diz 'cortante' daquele que corta” (II, 16). Por isso, a ação diz respeito ao fazer, enquanto potência de um ser que está em ato, mas que tende a potência do fazer.

50. A nona destas características é a paixão (ou padecer); isto é, a ação que se lhe é acometida; por exemplo, o ser queimado é algo que padece a madeira ou o feno quando nestes é colocado fogo; pois, o ato de queimar é ação, mas o ser queimado é paixão; no caso da madeira, o queimar é ação, o ser queimado, é paixão; etc. Por isso, no Livro dos Seis Princípios se diz que “a paixão é o efeito e a consequência da ação” (III, 29).

Além disso, os entes ao possuírem paixões próprias, isto permite que a partir destas paixões, isto é, a partir do que padecem, se possa chegar à cognição dos sujeitos, tal como afirma o Comentador (cf. Met., IX, cap. 2); pois, a ação que sofre um ente demonstra o modo como se pode inteligir este ente; e isto se aplica principalmente no que concerne ao ente móvel; etc.

51. E estas são as características do acidente; evidentemente, o Filósofo também enumera uma lista similar no livro V da Metafísica, a qual tem alguns insights que ajudam a clarificar estas que enumera no livro dos Predicamentos; todavia, ao lidar com o ente predicável, o Filósofo defronta-se com outro problema do que ao lidar com o ente enquanto ente, já que o ente predicável diz respeito ao modo como as coisas estão e são, e isto em relação ao modo como estão na realidade, que é o modo como se apresentam a inteligência já que isto está em ordem a maneira como se as percebe.

Portanto, o acidente que tem sua natureza proveniente da substância, tanto de modo essencial em ordem ao Ser, ao provir da Substância Primeira, quanto de modo natural em ordem a natureza, ao surgir e/ou a sofrerem ação a partir das substâncias primárias e das substâncias secundárias, etc.; assim, diante dos sujeitos primários da natureza, os acidentes surgem a partir do movimento destes e da inter-relação entre os mesmos e do que surge desta inter-relação.

52. No entanto, além destas características que se evidenciam a partir da descrição do acidente como forma, a partir do cap. IX se apresentam ainda mais dois aspectos: primeiro, a partir do próprio texto deste capítulo, que muitos comentaristas pensam ser um adendo para complementar os predicamentos; segundo, a partir da designação da inter-relação, daquilo que é chamado dos seis predicamentos em comum, que tem ligação com as seis distinções evocadas no cap. II (donde surge, como fora dito, uma das pressuposições fundantes do Livro dos Seis Princípios).

Logo, os seis predicamentos em comum, diz respeito a certa comunicabilidade da forma a partir da matéria dada algumas características em comum que são mais próximas do que outras; por isso, da designação dos predicamentos em comum surge as questões evocadas sobre as divisões predicamentais (que Boécio esclarece em parte no livro De Divisionibus).

53. Assim, dos seis predicamentos em comum evocados no cap. IX, surgem muitas possibilidades predicamentais, que ao serem colocadas em ordem, e de modo adequado, fornecem inúmeros princípios não só para as características comuns ao acidente, mas principalmente para o que concerne tanto a estrutura da ciência dos predicamentos, quanto para as noções inerentes aos pós-predicamentos.

Pois, do mesmo modo como os predicamentos se referem aos incomplexos, os pós-predicamentos se referem ao modo como os incomplexos estão ou ao modo como se os compreende dado a estrutura da luz interior, não somente quanto a apreensão dos indivisíveis, mas também quanto ao compor e o dividir, e ainda mais propriamente em relação ao raciocinar.

Por isso, do mesmo como há uma inter-relação entre os seis predicamentos em comum, também há uma inter-relação entre as noções dos pós-predicamentos, e esta é aferida pelos seis predicamentos em comum e pelo que destes surge; e uma inter-relação entre ambos, de modo subsequente e complementar.

Pois, como diz o Expositor, “onde há seis divisões, é necessário fazer uma sétima dividida[15]; e esta é a razão do Filósofo evocar os seis predicamentos em comum no cap. IX, delineando-os como seis divisões predicamentais, das quais, evidentemente, emerge uma sétima dividida, a saber, as noções pós-predicamentais; etc. Ora, o que fora dito basta quanto a uma apresentação do que concerne a segunda categoria geral.

 

§ 5. A razão dos pós-predicamentos.

(Cat., X-XV, 11b15-15b31)

54. Após os predicamentos, se tem os pós-predicamentos (caps. X-XV); e os pós-predicamentos tem o mesmo problema dos anti-predicamentos, a saber, estrutura fragmentária e os nexos faltantes; no entanto, em menor grau do que nos anti-predicamentos; por isso, a razão dos pós-predicamentos é fornecer noções funcionais para os termos predicamentais, como se mostra necessário a partir do cap. IX; pois, logicamente, os conceitos funcionais dos pós-predicamentos, abalizam muitos aspectos sobre os predicamentos bem como os abalizam sobre os preceitos comuns ao ente, principalmente para a compreensão das esferas modais do ente finito para além da intenção do lógico; ou mais propriamente, ao modo como o ente finito é predicado e enunciado pelo lógico, e depois explicado pelo metafísico.

55. Assim, nos pós-predicamentos se extraem quatro princípios fundamentais: primeiro, o da relação opostos-contrários; segundo, o da inter-relação anterior-posterior; terceiro, o que concerne ao movimento enquanto noção lógica; quarto, o que concerne as circunstâncias.

56. Primeiro, o da relação opostos-contrários (cap. X-XI); ora, a relação opostos-contrários designa o modo e a espécie de oposição e de contrariedade; por isso, o Filósofo investiga primeiro quatro tipos de oposição, e a partir disso, delineia o que concerne aos contrários; pois, os tipos de oposição, entre relativos, entre contrários, entre privação e posse, e entre afirmação e negação, estão, evidentemente, em ordem ao modo e a espécie da contrariedade, tendo em vista se pertencem ao mesmo gênero; pois, da relação opostos-contrários, se consegue compreender a relação de proporcionalidade ou de desproporcionalidade entre um ser e uma coisa, e vice-versa, ou entre um ser e outro ser, ou entre uma coisa e outra coisa. Portanto, da compreensão sobre a relação opostos-contrários, se tem a compreensão sobre o modo da existência dos entes quanto a ordem de eminência da realidade.

57. Segundo, o da inter-relação anterior-simultâneo (cap. XII-XIII); ora, se afirma a respeito do anterior (e do posterior), em relação as coisas (cf. Met. 1018b9); com isso, se pode acoplar cinco distinções predicamentais a respeito de uma coisa ser dita anterior, a saber: quanto ao tempo, quanto a existência de outra coisa, quanto a ordem, quanto a qualidade, quanto a causa e os causados. Portanto, uma coisa é anterior a outra, de acordo com estes modos; e ao constatar que uma coisa é anterior, se constata o modo como esta coisa está na ordem predicamental, tanto em relação aos primeiros princípios predicamentais quanto em relação aos predicamentos.

Além disso, se afirma a respeito do simultâneo, tendo por base o anterior (ou o posterior); pois, se tem uma tríplice distinção a respeito da simultaneidade, a saber: em relação ao tempo, em relação ao estado da causa, e em relação da coordenação do mesmo gênero. Ora, a partir da designação do simultâneo, se constata se uma coisa é ou está em simultaneidade com outra, o que infere diretamente na interpretação desta coisa que fora predicada; portanto, o modo da simultaneidade, além de se relacionar com o modo de anterioridade, também está disposto em ordem a enunciação, pois, tudo o que é enunciado demonstra o algo do que é anterior e/ou o algo de que é simultâneo; ou dito de outro modo, demonstra do que provêm e o modo como está; e isto tanto indica se está em ordem a matéria e o tipo de matéria, quanto indica se está em ordem a forma e o tipo de forma.

58. Terceiro, o que concerne ao movimento enquanto noção lógica (cap. XIV); ora, o movimento, enquanto noção lógica, não se refere ao modo do princípio da natureza, mas a forma deste princípio, a saber, a mudança; por isso, o movimento enquanto noção lógica se  refere a mudança de um ente, seja uma coisa seja um ser, e o movimento enquanto princípio da natureza se refere ao modo como os entes estão na ordem natureza; assim, o Filósofo apresenta seis tipos de mudança, a saber: a geração, a corrupção, o aumento, a diminuição, a alteração e a mudança de lugar.

Ora, se há mudança, o modo como um ente está, se dá de acordo com a ordem predicamental, que infere, lugar, posição, etc.; com isso, se constata que da espécie de mudança se pode aclarar o que um ente é e como o ente está, isto é, se pode aferir algo tanto sobre sua essência quanto sobre o modo de sua existência. E isto é fundamental para o lógico, a fim de que a predicação também esteja em ordem as coisas naturais e não somente ao ser das coisas enquanto são.

Pois, o lógico não somente predica e enuncia o que metafísico interpreta, mas também predica e enuncia o que o físico interpreta. Portanto, a lógica está em ordem tanto à metafísica quanto à física; etc.

59. Quarto, o que concerne as circunstâncias (cap. XV); ora, todo ente real é acometido por circunstâncias; e as circunstâncias, as mais das vezes, se dão tanto pela relação opostos-contrários, quanto pela inter-relação anterior-posterior, bem como pelo movimento; tudo isso, de algum modo, afeta o ente real, e assim, neste afetar, neste padecer, surgem as circunstâncias que se acometem ao ente; por isso, se fala, a partir destes aspectos, que o ente tem algo; os sentidos de ter estão abalizados por estes aspectos que lhe são antecedentes, já que são os que lhe dão alguma forma.

Pois, tudo o que acontece a um ente na realidade, será parte do que concerne a este ente; logo, se afirma que tal ente tem isso ou aquilo, tal como os exemplos evocados pelo Filósofo: o homem tem conhecimento, tem determinada altura, tem isso ou aquilo, etc. Ora, aquilo que se é difere do que aquilo que se tem; então, aquilo que um ente tem é acidente em relação ao que é, mesmo quando deste de algum modo provêm.

60. Deste modo, se observa que nos pós-predicamentos estão delineados, enquanto noções lógicas e de acordo com a intenção do lógico, tudo quanto concerne a filosofia; pois, em consonância com os quatro princípios fundamentais elencados, se estabelecem quatro preceitos filosóficos fundamentais: primeiro, da relação de dessemelhança dos entes existentes; segundo, os princípios anteriores e simultâneos ao modo que os entes existem e estão; terceiro, o preceito que concerne ao movimento, já que tudo quanto existe está em movimento, pois o movimento é princípio da natureza (cf. Phys. 192b); quarto, o que concerne ao ser enquanto ente existente e suas circunstâncias tanto na ordem do ser (ontologia) quanto ao ter - no caso aqui ter como fazer (filosofia prática ou ética), através do qual se mostra o estado geral de algo. Ora, nestes princípios se fundam toda e qualquer análise da realidade e da elucubração filosófica.

61. Além disso, estes princípios fundamentais também delineiam as regras predicamentais e a estrutura da lógica como ciência, tanto da parte teórica quanto da parte prática; mas não somente da lógica, mas das outras partes da filosofia, como por exemplo, se inere a partir dos próprios pós-predicamentos: a lógica com os caps. X-XI; a metafísica com os caps. XII-XIII; a física com o cap. XIV; a ética com o cap. XV; etc. Logo, se observa que em ordem os preceitos pós-predicamentais perfazem toda a estrutura da filosofia: lógica, filosofia segunda, filosofia primeira, filosofia terceira, artes.

62. Portanto, os preceitos pós-predicamentais estão em ordem a toda a filosofia; mais propriamente alguns dos preceitos pós-predicamentais são aplicados aos princípios fundamentais do ente móvel; pois, a inter-relação opostos-contrários, e anterior-simultâneo, bem como a descrição das propriedades do movimento, e a descrição genérica da categoria estado, estão em ordem aos adjuntos naturais; donde, os pós-predicamentos também demonstrarem o que se segue a lógica, aquilo que versa sobre os preceitos instrumentais do que o homem pode fazer e/ou laborar, a saber, as artes; etc.

63. Com isso, os pós-predicamentos não apenas apresentam novos conceitos funcionais aos preceitos predicamentais; mas também versam sobre vários aspectos da filosofia, tanto em relação aos princípios instrumentais quanto em relação aos princípios reais; logo, o que se segue aos predicamentos, necessariamente tanto diz respeito a segunda operação do intelecto, quanto aos elementos fundamentais da reflexão racional; ora, o que se segue aos predicamentos quanto a operação do intelecto, o Filósofo o trabalha no Sobre a Interpretação; e o que se segue aos predicamentos quanto aos elementos da reflexão racional, se estabelecem paulatinamente na sequência dos assuntos do próprio Corpus Aristotelicum, bem como em relação a ordem mais adequada à compreensão; etc. Ora, isto que fora dito basta quanto a uma apresentação do que concerne aos pós-predicamentos.

64. E termina aqui este breve comentário as Categorias de Aristóteles. Bendito seja Deus por todas as coisas. Amém.



[1] cf. Boécio, In Categorias Aristotelis Commentaria, livro I, prol.

[2] As teorias a respeito de quando o livro das Categorias fora compilado são várias; mas, certamente a mais provável é de que o Filósofo o compilara das notas de suas aulas de quando já estava doente, provavelmente numa situação similar a descrita no Livro da Maçã.

[3] cf. Albertus Magnus, Super Porphyrium De V Universalibus, trat. I, cap. 1.

[4] cf. Abraham Calov, Encyclopaedias Disciplinarum Realium Ideiae [Lubecae, 1652], § I.

[5] cf. Carlo Natali, Aristóteles [São Paulo: Paulus, 2016], pág. 51.

[6] cf. Alfarábi, De Ortu Scientiarum, cap. I.

[7] Alberto Magno, De Praedicamentis, trat. I, cap. I.

[8] E deixe-se bem claro que se afirma a proposição de “ciência da lógica” enquanto lógica pura, e não em relação ao preceito de Hegel.

[9] cf. Adolf Trendelenburg, Geschichte der Kategorienlehre [Berlim: G. Bethge, 1846], I, § 10, pág. 53ss.

[10] cf. Robert Kilwardby, Notulae Super Librum Praedicamentorum, lect. 5.

[11] cf. Alberto Magno, De Praedicamentis, trat. I, cap. 7.

[12] Porfírio, Isagoge: Introdução às Categorias de Aristóteles [São Paulo: Attar Editora, 2002], V, n. 1, pág. 51.

[13] cf. Alberto Magno, De Praedicamentis, trat. I, cap. 7.

[14] Em relação a lógica, e depois em relação a metafísica, se pode afirmar que o único filósofo, desde o advento da modernidade (a partir de Scotus), que não decaíra neste erro fora Edmund Husserl.

[15] Tomás de Aquino, Comentário ao Sobre a Alma de Aristóteles [Campinas, SP: Vide Editorial, 2024], livro I, lect. 7, pág 104s. 


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