Ao evocar este elogio, quase em forma de prédica, a um
diletíssimo pastor dado o seu passamento, se nos surge a indagação: se será o
evangelho que nos será pregado ou se o evangelho se há de se pregar a nós; no
entanto, diante deste momento, e sob a mui grande honra do diletíssimo pastor,
o caminho é outro do que o costume estabelecera, o qual sempre está imbuído
nestes dois sentidos; por isso, nem o evangelho nos será pregado e nem o
evangelho se há de se pregar a nós, mas algo além: a vida, o exemplo e o testemunho
do diletíssimo pastor é que se nos há de pregar.
A Escritura nos ensina: “Mas a vereda dos justos é
como a luz da aurora, que vai brilhando mais e mais até ser dia perfeito”
(Pv 4.18); querido irmão, tu chegaste ao seu dia perfeito, tu chegaste ao
encontro do Senhor; e isso, a uma, nos traz dois sentimentos: primeiro, a
profunda tristeza, pela perda de um querido amigo e servo de Deus; segundo, o
consolo esperançoso, pois estás nas mãos benditas e benfazejas de nosso Senhor
e Salvador Jesus Cristo.
A vossa vida, querido irmão, longe dos muitos
holofotes, mas foi um grande holofote para espargir a luz de Cristo; sua vida,
prezado pastor, fora confirmada pelo Senhor; e sobre ti se evoca, de maneira
justa e honrada, o dito do salmista: “Os passos de um homem bom são
confirmados pelo Senhor, e ele deleita-se no seu caminho. Ainda que caia, não
ficará prostrado, pois o Senhor o sustém com a sua mão” (Sl 37.23-24).
E este é o texto sagrado que certamente melhor nos
exemplifica sua vida; sua vida foi um pregão que confirma este texto e o
dignifica para a glória de Deus.
Querido irmão, vós fostes um “homem bom”; a
bondade, a misericórdia e a verdade foram características marcantes de sua vida
e obra; foram os pilares de seu ministério; e sua carreira pastoral, desde
ainda como diácono, pois mesmo sendo um diácono com o coração já era um exímio
pastor, é um testemunho da bondade de Deus. Poucos foram tão bons, poucos foram
bons, mas entre estes poucos se pode colocar o vosso testemunho: tu foste tão
bom, ao mesmo tempo em que permaneceste bom. A bondade de Deus transpareceu de forma
límpida e grandiosa em vossa vida.
Além disso, querido pastor, vós fostes “confirmado
pelo Senhor”; sua vida foi um exemplo da confirmação de Deus; seu
ministério foi aprovado pelo Senhor, e sobre vós repousa a bendita esperança
que o Senhor Jesus nos ensinara: “Bem está, servo bom e fiel. Sobre o pouco
foste fiel, sobre muito te colocarei; entra no gozo do teu senhor” (Mt
25.21); vós fostes confirmado pelo Senhor, ao pregar o evangelho e ao evangelho
ser pregado a partir de sua vida, e quantas almas foram alcançadas, quantos
fiéis foram consolados, quantas vidas abençoadas; e as Igrejas de Deus foram por
suas palavras e exemplo, consoladas e fortificadas na fé. A confirmação de Deus
foi o selo de seu ministério pastoral.
Ademais, querido pastor, vós fostes “sustentado
pela mão de Deus”; sua provação, suas dores, sua doença, não somente foram
para ti uma vicissitude, mas espargiram, a partir de ti, o bom perfume de
Cristo; o que poderia ser dito de sua provação? Ah! Tantas palavras; mas, nos
revolve a mente as palavras do Apóstolo: “E sabemos que todas as coisas
contribuem juntamente para o bem daqueles que amam a Deus, daqueles que são
chamados por seu decreto” (Rm 8.28); estas palavras se confirmaram em vossa
vida; e sabemos que todas as coisas, mesmo as lutas renhidas, contribuíram para
a glória de Deus; em meio a vossa provação querido pastor, fizeste coisas
grandiosas sob a mão de Deus; fostes sustentado e guardado por Deus; sua vida
foi uma prova visível que Deus cuida e protege os seus; sua vida foi uma
confirmação, a nós, da sentença do evangelho: “As minhas ovelhas ouvem a
minha voz, e eu conheço-as, e elas me seguem; e dou-lhes a vida eterna, e nunca
hão de perecer, e ninguém as arrebatará das minhas mãos. Meu Pai, que mas deu,
é maior do que todos; e ninguém pode arrebatá-las das mãos de meu Pai” (Jo
10.27-29).
Estas são, querido pastor, apenas algumas palavras que
são pronunciadas em vossa memória; ainda muitas outras poderiam ser ditas; mas,
a vossa vida e o vosso testemunho, nos falam mais que os mais belos discursos;
pois, onde as palavras não podem ir, o exemplo sempre alcança; onde as palavras
faltam, o exemplo fala mais alto e com mais impressionantes palavras do que o
discurso; como o Dr. Albert Schweitzer afirmara: “Dar exemplo não é a melhor
maneira de influenciar os outros. É a única”.
E, por fim, gostaria de tecer-lhe um elogio pessoal;
quem diria querido pastor, que as vossas aulas dominicais, serviriam para
ensinar e conduzir pelo exemplo uma criança, a qual, cerca de uma década
depois, estaria ensinando a Palavra de Deus; e, de acordo com o vosso exemplo,
pude fazer uma série de exposições, em estilo diverso, no estilo do lendário aquinate; entretanto, posso
afirmar, com certeza absoluta, que só fiz estas preleções, conduzido pelo
Espírito Santo, dado o vosso exemplo; por isto, e por tantas outras coisas,
rendo graças a Deus pela vossa vida e pelo vosso ministério.
Deste modo, ao concluir este breve elogio, podemos,
ainda que com poucas palavras, contemplar que vossa vida e exemplo, se nos
pregam mais do que as palavras de qualquer pregador, mesmo se fossem as do
maior dos pregadores; querido irmão, querido pastor Marcos, sua vida, neste momento lúgubre, se nos
prega ainda mais; a memória de um servo fiel sempre é um eloquentíssimo sermão.
Com isso, sob a morte, diante da qual não há
sabedoria, nem ciência, nem discurso (cf. Ec 9.10), temos a bendita esperança
do céu, da vida eterna, e cremos que do mesmo modo como morremos, uma dia
haveremos de ressuscitar; que isto que é corruptível, um dia se há de revestir
da incorruptibilidade (cf. 1Co 15.53); e felizes são aqueles que morrem no
Senhor, como diz a voz do céu: “Bem-aventurados os mortos que, desde agora,
morrem no Senhor. Sim, diz o Espírito, para que descansem dos seus trabalhos, e
as suas obras os sigam” (Ap 14.13).
Certos destas palavras, rogo que Deus conforte a família enlutada, que console os amigos entristecidos, e que dê ânimo à Igreja que perde seu pastor, e que o Senhor da Glória suscite homens e mulheres fiéis a Ele como fora este diletíssimo pastor.
Requiem aeternam dona eis,
Domine, et luz perpetua luceat eis.
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