Prólogo.
1. “Vês aqui a grande máquina do Mundo, / Etérea e
elemental, que fabricada / Assim foi do Saber, alto e profundo, / Que é sem
princípio e meta limitada” (Os Lusíadas, X, 80); esta sentença do grande
Luís de Camões, retoma um dos princípios fundamentais do saber humano, a saber:
a concepção de que todo o cosmos é uma máquina; uma máquina funcional, etérea,
elemental, que fora fabricada pelo Sumo Artífice; pois, o cosmos como um todo,
em sua definição mais ampla e englobante, além de por si demonstrar que fora
fabricado, que fora criado, também demonstra que é “alto e profundo”, isto é,
que é imenso; mas também que é “sem princípio”, isto é, não é possível a
observação de seu ponto de partida, e que tem uma “meta limitada”, isto é, terá
um fim, ou seja, não é infinito.
2. Ora, estas descrições, talhadas de maneira singular
pelo maior poeta da língua portuguesa, demonstram o que concerne a uma máquina;
pois, analogamente, o cosmos pode ser comparado ao funcionamento de um motor,
de uma máquina; logo, ao se compreender sobre a máquina do mundo, se compreende
a razão do que concerne a natureza e suas causas, já que o entendimento sobre o
modo de funcionamento do universo abaliza o entendimento sobre as causas da
natureza e sobre as substâncias de todo o cosmos, e isto de acordo com a ordem
das substâncias tal como foram criadas e tal como foram engendradas pelo
Criador na máquina do mundo.
Pois, do mesmo modo como um motor, as substâncias criadas foram colocadas em ordem, e numa ordem a partir do movimento, que sendo o princípio da natureza, estabelece o amplo escopo que estas substâncias terão ao se moverem e ao se desenvolverem nas tecituras desta máquina. Assim, compreender sobre a máquina do mundo abaliza a compreensão sobre o próprio mundo e sobre o que é necessário para compreender o universo.
Capítulo I: O cosmos como uma “máquina”.
3. Ora, a razão de se aferir o cosmos com esta
analogia, é porque a mesma compreende, ainda que de modo equívoco, a essência
do próprio cosmos; deste modo, cumpre investigar as razões desta analogia; e
estas razões são três: primeiro, pelo funcionamento do cosmos; segundo, pelo
movimento dos corpos celestes; terceiro, pelas substâncias cósmicas.
4. Primeiro, pelo funcionamento do cosmos; o cosmos
funciona tal como uma máquina, onde tudo funciona tendo em vista o
funcionamento de todo o cosmos; o movimento cósmico fora iniciado pelo Criador
e é mantido por Ele; e este movimento é tal como as peças de uma máquina, onde
as peças maiores se relacionam com as peças menores e existe uma força
propulsora que orienta estas peças a se moverem tal como foram criadas para se
moverem; portanto, o cosmos, tanto em sua esfera física quanto em sua esfera
oculta, funciona tal como uma máquina; e o funcionamento das peças menores está
em ordem ao funcionamento das peças maiores, pois os movimentos ocultos são os
que dão forma aos movimentos visíveis do cosmos.
Por isso, do modo, da espécie e da ordem dos
movimentos ocultos se tem a formação dos movimentos visíveis. Isto, em suma,
pode ser explicado por analogia tal como o funcionamento de um motor, de uma
engrenagem, de uma máquina; etc.
5. Segundo, pelo movimento dos corpos celestes; ora, o
funcionamento do cosmos, primeiro, tem de ser entendido de acordo com o
movimento dos corpos celestes; pois, as diversas espécies dos corpos celestes,
estão em ordem ao funcionamento e desenvolvimento do cosmos; por isso, os
corpos celestes ao se moverem, se movem para expandir o universo de acordo com
a força de expansão do próprio universo, a saber, a matéria escura.
Pois, o propósito da matéria escura é proporcionar a
constate de energia e força para que o cosmos se dilate e se expanda e com isso
crie novas condições para a geração de outros corpos celestes, tais como
galáxias, estrelas, buracos negros, etc.; assim, o movimento dos corpos
celestes como um todo tem este propósito; no entanto, não mais se aplica a
costumeira e antiga definição ptolomaica de definir o cosmos como uma máquina,
mas sim em definir o cosmos pela teoria das cordas.
Em suma, é apenas uma descrição mais precisa para
entender a relação entre as peças desta máquina; mas a descrição de máquina
continua sendo o epiteto geral mais adequado para se compreender o universo.
6. Terceiro, pelas substâncias cósmicas; ora, tudo o
que existe no cosmos possui algum tipo de substâncias; as substâncias primárias
que dão origem e forma as substâncias secundárias, e assim por diante; no
entanto, a substância primária do orbe, é a matéria escura; logo, emana da
matéria escura os outros tipos substâncias do orbe, as quais funcionam como
peças girando em função da expansão do orbe; e onde há esta expansão se tem a
geração de corpos celestes para a formação de pequenas máquinas tal como a máquina
maior, ou seja, a formação de galáxias, e assim, a formação dos componentes que
tomam forma no desenvolvimento da vida de uma galáxia.
Além disso, do mesmo como num motor, as vezes o
funcionamento se torna um pouco mais complexo; para isso existem substâncias
cósmicas colocadas para por ordem ao funcionamento da máquina cósmica e
preservar o ímpeto original da geração das substâncias cósmicas; este tipo de
substância são os buracos negros, que existem como uma forma de “purificação”
dos elementos estranhos ou corrompíveis do funcionamento da máquina do cosmos,
devorando galáxias e/ou outros corpos celestes, sendo assim uma espécie de
mantenedor da ordem cósmica, ao passo que ao fazer estas coisas, produz
novamente o ímpeto e os elementos necessários que num tempo bem demorado
proporciona o que é necessário para o surgimento de novos corpos celestes ou de
um outro "tecido" para que os corpos celestes possam se desenvolver.
7. Deste modo, estes três aspectos ora evocados sumariam o que concerne a compreensão sobre a máquina do mundo; logo, o que concerne a todo o orbe enquanto uma máquina funciona deste modo descrito de maneira mais simples; portanto, se sabe que o movimento do cosmos, tem em si outros movimentos, que juntos se tornam um grande movimento em conjunto, dando forma e gerando o necessário para que a máquina do mundo funcione e se mantenha funcionando nas coisas naturais; tal como houvera afirmado Camões: “Este orbe que, primeiro, vai cercando / Os outros mais pequenos que tem em si” (Os Lusíadas, X, 81).
Capítulo II: As leis da natureza.
8. Ora, o cosmos pode ser comparado a uma máquina
devido as leis da natureza; as leis da natureza que permeiam todo o Orbe, são
tão funcionais e tão bem estabelecidas, tal como as peças de uma máquina; pois,
em todo o orbe existem leis gerais e leis específicas que estão dispostas em
toda a extensão do cosmos; estas leis, a uma, se relacionam e estão
amalgamadas; logo, em todos os orbes se tem leis que estão em ordem a todo o
Orbe; pois, o próprio curso do mover cósmico estabelece isso, tal como Camões afirmara:
“Em todos estes orbes, diferente / Curso verás, nuns grave e noutros leve”
(Os Lusíadas, X, 90); o curso, isto é, o movimento dos orbes, seque uma
sequência determinada; nuns é grave, isto é, é movimento violento, mas noutros
é leve, isto é, é movimento menos violento. E, realmente em todos os orbes do
Orbe, se tem um tipo diferente de movimento imbuído no mover de todo o Orbe.
9. Deste modo, as leis da natureza atestam sobre a
máquina do mundo; e este máquina funciona, de acordo com as leis da natureza,
de dois modos: primeiro, de modo circular e englobante; ora, o funcionamento da
máquina da mundo obedece a uma lei geral que coloca todo o cosmos em movimento
nos corpos celestes maiores em suas respectivas esferas, a qual permeia os
corpos celestes menores em suas respectivas esferas; logo, este movimento é
circular, isto é, é cíclico, e obedece um ciclo cósmico de geração e corrupção;
além disso, este movimento é englobante, pois tudo quanto há na máquina do
mundo está de acordo com este movimento e cumpre seu propósito específico.
Neste sentido, é deveras verdadeira a sentença de Sirach que a natureza não
falha no que lhe compete (cf. Eclo. 16.27).
Segundo, de modo subsequente e expansivo; ora, o
funcionamento de uma máquina depende de alguma combustão; mas o funcionamento
da máquina do mundo depende das leis gerais mais importantes da natureza, as
quais, por sua vez, mantém a combustão da máquina do mundo, tanto no movimento,
quanto nos processos geracionais dos corpos celestes, que estão em ordem a
processão e ao mantenimento deste movimento; assim, todo o funcionamento das
peças da máquina do mundo, são tanto adequados ao funcionamento de cada orbe
quanto de todo o Orbe, pois, este funcionamento é subsequente, isto é, segue um
padrão específico tanto para a natureza inerente a determinado corpo, quando
para o funcionamento de sua posição na tecitura cósmica; e, este funcionamento,
por ser subsequente, contribui com a expansão do universo a partir da natureza
da matéria escura a qual existe para se expandir, numa expansão que alcança
quantidades imensas.
10. Portanto, estes dois modos, que funcionam de modo concêntrico, na verdade, designam grande parte do funcionamento do cosmos a partir de suas leis gerais; e nestas leis gerais, existem outras leis mais específicas; e isto pode ser explicado pela comparação com duas hélices, onde a hélice principal move-se numa determina velocidade (as mais das vezes, uma velocidade observável), que é embasada por uma hélice secundária que move-se numa velocidade muito maior (as mais das vezes, uma velocidade inobservável), a qual é a base para tudo quanto concerne ao movimento da hélice principal; explicado de modo análogo: é deste modo que funciona a estrutura da máquina do cosmos entendido a partir das leis da natureza.
Capítulo III: A ordem das coisas naturais.
11. As leis da natureza, engendram a compreensão de
que a máquina do mundo, funciona de modo estabelecido e imutável; assim, se
compreende que a ordem das coisas naturais segue um curso estabelecido pelo
Criador, e tal qual máquina mantém este curso inalterado; a isto, geralmente,
se chama de ciclo da vida natural; mas, do mesmo modo como o funcionamento de
um motor tem uma ordem de acordo com suas peças, logo, se compreende que o
cosmos tem uma ordem de funcionamento, tal como estabelecido na ordem de eminência
dos corpos celestes em geral (tanto os corpos propriamente ditos, quanto as
formas corpóreas).
Ora, esta ordem de eminência, designa na ordem de
funcionamento do cosmos, também se descortina a ordem das causas, e o modo de
efluência das mesmas; quanto a isso, Camões houvera afirmado que Deus obra no
mundo por segundas causas (cf. Os Lusíadas, X, 85); pois, estas causas
segundas, estão em ordem ao funcionamento do cosmos, mas em relação a corpos
inferiores, ou a substâncias secundárias na ordenação acima do firmamento. E,
esta ordem, demonstra o modo de funcionamento desta máquina e o que emana de
cada peça desta máquina em toda a tecitura cósmica.
12. Deste modo, a primeira substância do cosmos, é
aquela que serve de elemento para o desenvolvimento do próprio cosmos; alguns a
chama de matéria primeira; ora, esta matéria primeira, é de onde o universo foi
modelado pela obra do Sumo Artífice; assim, se compreende que desta matéria
primeira, foi surgindo todos os corpos celestes, quanto as formas corpóreas do
Orbe; por isso, a substância do Orbe demonstra que existe no funcionamento da
máquina cósmica um princípio que dá origens a outros fenômenos naturais,
obviamente, em razão deste funcionamento.
E esta matéria primeira, a matéria escura (e a energia
escura), servem como “massa de modelar” na estrutura cósmica, já que tudo
quanto concerne aos corpos celestes se desenvolve sob os processos naturais que
ocorrem na e através da matéria escura, que está em todo o cosmos e com
possibilidades de expansão imensas; logo, de acordo como a expansão do universo
a partir da matéria escura, se desenrola outros fenômenos cósmicos, que tanto
se estabelecem em ordem aos processos de geração dos corpos celestes e inferem
nas formas corpóreas que estão no Orbe, e isto as mais das vezes em
inter-relação, quanto proporcionam o que é necessário para que esse processo se
estenda a proporções em imensidão de expansão; logo, quanto mais estes
fenômenos se movimentam, no funcionamento da máquina do cosmos, mais o Orbe se
expande, e cresce em fenômenos de expansão, tais como, por exemplo, a geração
dos buracos negros, a geração de estrelas e similares.
13. Portanto, a ordem das coisas naturais segue uma
ordenação primeira, que se mantém a mesma, mas que faz com o funcionamento do
cosmos se ordene à expansão, isto é, faz o cosmos tender naturalmente a
expansão; ora esta ordem pode ser sumariada de dois modos: primeiro, a
substância da tecitura cósmica onde o universo se expande; segundo, a formação
e a geração dos corpos celestes maiores.
14. Primeiro, a substância da tecitura cósmica onde o
universo se expande, a matéria escura; e esta substância, que em sentido
físico, pode ser chamada de substância do Orbe, dá a firmeza para a expansão
cósmica de modo que, em sentido absoluto, os corpos celestes em geral não
fiquem vagando ao que se conhece como vácuo absoluto (ou nada absoluto); logo,
esta substância está presente em todo o desenvolvimento da vida cósmica, bem
como proporciona o desenrolar deste desenvolvimento em suas esferas modais acima
do firmamento, já que na matéria escura também tem, pela densidade desta
matéria, a energia escura; e a confluência desta matéria com esta energia,
forma a estrutura gravitacional da máquina cósmica, que é diferente da
estrutura gravitacional dos planetas. E isto pode ser enquadrado no obrar de
Deus no mundo por segundas causas, através das quais, mantém o funcionamento de
todo o Orbe.
15. Segundo, a formação e a geração dos corpos celestes maiores, a saber, o campo das galáxias e o que vem amalgamado; pois, a formação dos corpos celestes maiores, e a colocação destes em movimento pelo Primeiro Motor Imóvel, proporciona um equilíbrio de funcionamento do cosmos, que ao ter sido colocado em movimento, neste movimento contém tudo o que é necessário para o funcionamento em geral da máquina cósmica; portanto, a formação das galáxias, gera outra galáxias, dando origem a um conjunto de galáxias; estas por sua vez, ao serem formadas, em suas esferas, proporcionam a geração dos corpos celestes, como estrelas, planetas e similares, os quais, dão uma certa ordem sistêmica no âmbito das galáxias, podendo formar vários sistemas integrados e diversos em uma mesma galáxia; com isso, estes corpos celestes maiores ao serem formados, e ao serem colocados em movimentos, em consonância com a matéria prima cósmica, dão origem ao processo geracional dos corpos celestes, em suas mais diversas esferas e em seus mais diversos modos e formas; e tudo isto, em ordem de eminência, grandeza e função. E este processo geracional também pode ser enquadrado no obrar de Deus no mundo por segundas causas.
Capítulo IV: A perfectibilidade do cosmos.
16. Ora, a ordem das coisas naturais, demonstra a
perfectibilidade do cosmos; pois, o cosmos, é tanto perficiente quanto
perfectível; em um sentido é perficiente, já que é suscetível de ser
aperfeiçoado, pois o universo se expande imensamente, bem como os fenômenos
naturais são sempre constantes; e em outro sentido é perfectível, já que é
completo, pois o universo tem seu funcionamento com leis estabelecidas e
imutáveis; assim sendo, já que o universo é perfectível, em sua
perfectibilidade demonstra o modo como também é perficiente; logo, a
perfectibilidade do cosmos atesta sua perficientibilidade.
17. E, quanto ao cosmos ser perfectível-perficiente,
isto se dá pela própria estrutura predicatória da realidade; pois, o ser humano
ao inteligir algo do cosmos, o faz ao predicar algo da realidade; e ao predicar
algo, esta predicação sempre se defronta com a dialógica
perfectível-perficiente, pois a uma o que fora predicado é completo, porque
fora predicado, mas também é suscetível de ser aperfeiçoado, já que o que é
predicado nunca é predicação sobre tudo ao mesmo tempo, pois é impossível no
mesmo ato predicatório se predicar tudo quanto concerne a determinado ente.
Assim, na própria compreensão se tem esta dialógica,
que permeia totalmente o cosmos; e, tal como fora afirmado sobre a ordem das
coisas naturais, se compreende que o cosmos, em si mesmo, fora criado para ter
esta dialógica, que se demonstra na própria expansão do cosmos. Logo, tudo na
ordem cósmica é ao mesmo tempo perficiente e perfectível; e a demonstração da
perfectibilidade do cosmos evidencia isso.
18. Deste modo, se pode evocar a perfectibilidade do
cosmos em três princípios: primeiro, quanto a ordem de eminência dos corpos
celestes; segundo, quanto a ordem da grandeza dos corpos celestes; terceiro,
quanto a ordem das funções dos corpos celestes.
19. Primeiro, quanto a ordem de eminência dos corpos
celestes; pois, em ordem de eminência, os corpos celestes descendem dos mais
importantes aos menos importantes, e neste descender se tem a
perficientibilidade dos corpos celestes no processo de expansão, já que neste
processo, o cosmos funciona em sua perfeição natural.
20. Segundo, quanto a ordem da grandeza dos corpos
celestes; pois, os corpos maiores influem mais no modo do funcionamento do
cosmos do que os corpos menores; além disso, os corpos maiores servem de
elementos de geração de corpos menores, bem como de sustentação dos movimentos
dos corpos menores; pois, a grandeza dos corpos maiores está acima da dos
corpos menores não somente em relação a eminência, mas propriamente em relação
a sua natureza enquanto peça da máquina cósmica.
21. Terceiro, quanto a ordem das funções dos corpos
celestes; e isto em relação a máquina cósmica, pois, os corpos celestes, de
acordo com suas grandezas na máquina cósmica, tem uma função específica, de
maneira específica e de maneira geral, quanto ao funcionamento desta máquina;
assim, cada corpo celeste, ou cada forma corpórea que está no cosmos, tem uma
função, a qual está em ordem ao funcionamento da máquina do cosmos, tanto para
a continuidade quanto para a preservação incólume deste funcionamento até os
limites máximos da expansão, o que é elucubrável, mas não é observável.
22. Assim, se pode evocar a estrutura cósmica; pois,
tendo compreendido o que concerne ao cosmos como uma máquina, no sentido geral,
se pode prosseguir para compreender o que concerne ao cosmos quanto a sua
estrutura; deste modo, se deve pontuar a estrutura do cosmos, de acordo com a
ordem das grandezas dos elementos cósmicos, pois, esta estrutura primordial
continua funcionando; todavia, este aspecto não é elucubrado, pois, geralmente
inicia-se a elucubração sobre o cosmos a partir da grandeza dos corpos quanto
ao funcionamento destes no movimento do Orbe.
23. Portanto, a estrutura do cosmos, é permeada por dois princípios: primeiro, em relação a ordem da processão dos elementos cósmicos; segundo, de acordo com o movimento dos corpos, que igualmente se subdivide em dois aspectos: um, em relação a grandeza dos corpos, o outro, em relação ao ímpeto para o movimento da máquina celeste. E, para a compreensão sobre a estrutura do cosmos, é necessário primeiro elucubra-se sobre a ordem da processão dos elementos cósmicos, tanto para se entender o modo de funcionamento do cosmos, a saber, aquilo que move o Orbe, quanto para se entender as características da expansão do cosmos que está imbuída nessa ordem de processão.
Capítulo V: As categorias cósmicas.
24. Deste modo, se estabelece sete princípios para se
compreender esta ordem de processão: primeiro, a matéria escura; segundo, o
espaço; terceiro a luz; quarto, o tempo; quinto, as condições do funcionamento
do cosmos; sexto, os corpos celestes; sétimo, a ordem dos corpos celestes.
25. Assim, tendo compreendido de modo geral o que
concerne a estrutura do cosmos, se pode compreender o modo de formação e
geração da máquina celeste; pois, a estrutura do cosmos demonstra a ordem
generalíssima em que o cosmos foi formado; no entanto, após a formação do
cosmos, o próprio Criador obra no mesmo por segundas causas, guiando o processo
da geração cósmica; assim, para compreender o que concerne ao cosmos em seu
funcionamento cumpre evocar cada uma destes setes aspectos anteriormente
evocados e delineá-los a partir da estrutura categórica.
26. Ora, quanto a matéria escura, se pode propriamente
intitulá-la, a grosso modo, de a substância material do Orbe; e, a partir desta
substância, se constata os inúmeros acidentes cósmicos, tais como: quantidade,
relação, qualidade, lugar, tempo, etc.; pois, a substância do Orbe, a principal
substância material do Orbe, é o “solo” o qual o Criador formou do nada (ex
nihilo) o cosmos, e sob o qual Ele forma os elementos cósmicos. Assim, em
primeira instância, a substância material do Orbe é a matéria escura, a qual,
devido a sua natureza quanto as coisas naturais, é por si mesma suficiente; por
isso, o Criador, nesta matéria que criara, decidira obrar e formar todo o Orbe;
em uma analogia bem simples, é a massa do “bolo” cósmico.
27. Ora, quanto ao espaço, após se compreender a
substância do Orbe, se observa que a mesma se difunde num lugar, e este lugar
no qual a mesma é difundida, é o espaço; é o lugar da substância do Orbe; e,
por ser formado em conjunto com a matéria escura, se torna um tipo de
substância secundária sob a substância primária do cosmos; por isso, se fala do
espaço e da distância entre um ponto e outro no cosmos.
Mas, num sentido mais apurado, se tem que o espaço é
um acidente, dado a substância do Orbe ser a matéria escura; mas após o
funcionamento pleno do Orbe, após o término da criação, também pode se
compreender o espaço como uma espécie de substância secundária que atua sob a
substância primária; ou, tomando a analogia da dupla-hélice, a hélice maior é a
matéria escura, enquanto que a hélice menor é o espaço; mas que funcionam
conjuntamente, pois, a proporção da expansão da matéria escura é a proporção da
formação do espaço.
28. E, tendo sido formado a massa cósmica, se cria um
"elemento" que perpassa a todo o cosmos, a saber, a luz; a luz
permeia todo o cosmos, e na expansão do cosmos a luz se faz presente; a luz
adentra em todo pedaço do cosmos; mesmo onde há muita densidade de matéria e
não se consegue ver o espargir da luz, a luz se faz presente, sendo permeada
pela matéria escura, e a medida que a matéria escura se dissipa naturalmente, o
fluir da luz se realiza na mesma e através da mesma, como ocorre em todos os
processos naturais; pois, a perfectibilidade da luz em relação as coisas
naturais é tão grande, que por onde a luz se difunde, ocorre a curvatura do
espaço; por isso, a luz é corretamente chamada de a primeira das obras da
distinção (cf. STh Ia, q. 67, a. 4, co.); assim sendo, a luz é a primeira obra
da distinção, no sentido de que é a primeira obra distinta da matéria escura e
do espaço que a mesma cria a medida que se expande.
29. E, quanto ao tempo, se percebe que o mesmo é
formado a medida que se forma a matéria escura; pois, a criação da matéria
prima do cosmos, ocorre com a criação do tempo; mas, em relação ao tempo
natural três considerações são feitas: primeiro, o tempo de acordo com a
criação da matéria escura, que pelos processos naturais inerentes a matéria
escura são quase que inquantificáveis; por isso, em muitos estudos científicos
são tidos em bilhões de anos, mas em função da densidade da matéria escura,
pois esta matéria ao se expandir também faz com que a dilatação do espaço seja
imensa, isto é, que as distâncias entre um ponto e outro no cosmos sejam
imensas.
Segundo, o tempo de acordo com a criação da luz, que
possui um tempo de viagem no espaço; um tempo também quase que inquantificável,
mas devido a rapidez inobservável da locomoção da luz, que por se espargir na
massa cósmica também há de ser em mesma proporção do que o tempo de “vida
útil” da matéria escura e de sua expansão.
Terceiro, o tempo de acordo com a criação das
galáxias, dos sistemas e dos planetas; pois, o tempo no planeta terra é
quantificado de modo diverso do que o de outros planetas, já que o tempo na
terra é estabelecido em função do homem em dias, meses e anos, de acordo com o
ciclo dos luminares.
Deste modo se compreende a distinção quase que
absoluta entre o tempo abaixo do firmamento e o tempo acima do firmamento.
30. E, quanto as condições de funcionamento do cosmos,
se compreende que tendo a matéria prima do Orbe, a matéria escura, e tendo os
elementos através dos quais se obtém a percepção espacial, a luz e o tempo, se
compreende que o cosmos funciona em ordem a estes aspectos; embora o
funcionamento do cosmos geralmente seja visto apenas nos corpos celestes, tal
funcionamento se dá em função da densidade da matéria escura em expansão e em
contato com o espaço e com a luz, pois assim cria-se um espectro temporal para
se definir a quantidade de tempo de duração dos elementos cósmicos.
31. Por isso, o cosmos funciona, ao ser sido Criado e
ao ser mantido e preservado pelo Criador, por três motivos: primeiro, com sua
substância primária, a qual de modo misterioso e ainda desconhecido contém tudo
quanto é necessário para a vida cósmica; segundo, com o espaço que forma-se a
medida da expansão da matéria escura; terceiro, com a luz e o tempo, pois, a
luz permeia todo o cosmos, e o caminhar da luz marca o tempo no cosmos (que
evidentemente, é diferente do tempo nos planetas). Pois, com estes três
aspectos se tem os materiais necessários para a expansão do cosmos e a geração
dos corpos celestes, tanto por Deus ao criá-los, quanto porque o Criador
prescreveu um processo geracional no funcionamento do próprio cosmos.
32. E, quanto aos corpos celestes, os mesmos passam
por dois processos: primeiro, pela criação; segundo, pela geração. Os corpos
celestes foram formados, e no funcionamento do cosmos, outros corpos celestes
são gerados de acordo com o funcionamento do próprio cosmos; pois, como há duas
espécies de corpos celestes: os corpos celestes ordinários e os corpos celestes
extraordinários, então, nestas duas espécies ocorre tanto o processo de
formação quanto de geração. Deste modo, os corpos celestes, em suas espécies
são colocados em movimento, para que a máquina do cosmos entre em
funcionamento, e que através deste funcionamento ocorra a geração de outros
corpos e assim seja mantido o equilíbrio deste funcionamento dada a imensidão
do cosmos.
33. E, assim, se compreende que a ordem dos corpos
celestes, por sua vez, desenrola-se neste mesmo sentido; pois, a formação de um
corpo celeste, pelos menos os corpos celestes ordinários, tais como algumas
espécies de estrelas, planetas, e similares, torna-se possível dentro da
substância do Orbe, e, com isso, o funcionamento dos mesmos tanto de acordo com
o movimento cósmico geral quanto com o movimento específico do corpo físico, é
permeado pela mesma estrutura categórica, a qual permeia a esfera particular
deste corpo tornando-o, por sua vez, suscetível a várias formas de estrutura
categórica.
34. E, em relação aos corpos extraordinários, tais
como algumas espécies de estrelas maiores, como estrelas de nêutrons, os
buracos negros super-massivos, etc., eles também estão nesta estrutura, mas com
função distintas da do funcionamento ordinário do cosmos, confluindo-se tanto a
preservação e expansão da matéria escura, isto é, do espaço em si mesmo, quanto
para a formação de novos elementos cósmicos, como as galáxias e suas teias de
inter-relação (os conglomerados de galáxias), etc. Assim, se compreende que em
ordem, ocorre a formação de uma galáxia, depois de outra, até se formar um
aglomerado de galáxias, e dentro das galáxias se formam sistemas que se
inter-relacionam e assim por diante.
35. Por isso, a estrutura cósmica, a grosso modo, é
categórica, perfazendo em relação ao funcionamento do cosmos, aquilo que
concerne a estrutura predicamental; logo, o cosmos como um todo, funciona deste
modo é e disposto deste modo; embora a compreensão sobre toda a estrutura
cósmica exija muito mais observações e descrições, se for aplicada esta
estrutura de raciocínio, então, se terá uma compreensão mais apurada sobre o
funcionamento da máquina do cosmos, que se feita em esferas desde a primeira,
conseguir-se-á compreender melhor o modo de formação do universo.
E, para o momento, é suficiente o que foi dito sobre a
máquina cósmica, a partir do que se pode constatar com Agostinho: “Todas as
obras de Deus são maravilhosas, pois foram executadas com sabedoria”
(Epist. 161, n. 2).
36. Termina aqui esta explicação sobre a máquina do
mundo. Bendito seja Deus por todas as coisas. Amém.
Nenhum comentário:
Postar um comentário