10/05/2025

Os Dois Princípios Gerais do Desenvolvimento Teológico

O desenvolvimento da teologia inicia-se logo após a morte dos apóstolos, mais propriamente após a morte do apóstolo João, principalmente através do testemunho e dos escritos dos discípulos dos apóstolos, tais como Policarpo, Inácio, Clemente, entre outros.

E, neste desenvolvimento, logo no início, acoplam-se dois princípios, que permeiam toda a história da cristandade posterior, e que continuarão a permeá-la até o fim dos tempos.

Ora, o primeiro destes princípios é o que pode ser chamado de princípio grego, na cristandade que surge no mundo grego; e o outro, é o que pode ser chamado de princípio latino, na cristandade que surge no mundo latino.

O princípio grego surge em um mundo refinado; a Igreja que surge, se desenvolve e se estabelece no mundo grego, é a cristandade que se defronta com um mundo culturalmente refinado; enquanto que o princípio latino surge em mundo que emerge da barbárie; e a Igreja que surge, se desenvolve e se estabelece no mundo latino, é a cristandade que se defronta com um mundo culturalmente bárbaro.

E, isto, obviamente, influencia plenamente o desenvolvimento da cristandade, a partir do que se tem tanto a cristandade latina ou ocidental e a cristandade grega ou oriental; e, respectivamente, teologia latina e teologia grega.

Outrossim, é que a teologia grega permanece sendo uma teologia que tem diante de si a dialógica de uma cultura refinada, enquanto que a teologia latina permanece sendo uma teologia que tem diante de si a tensão de uma cultura bárbara; e isto também se comprova pelos pressupostos constituintes destes dois princípios; pois, a teologia grega se estabelece a partir da obra de vários teólogos (cf. PG 1-2, 5-6, etc.), enquanto que a teologia latina se estabelece e confirma a partir da obra de Tertuliano (cf. PL 1-2), que fundamentalmente é uma obra que é talhada em resposta a barbárie que assola os fiéis (os tópicos comuns da teologia de Tertuliano, e as resoluções que ele estabelece, demonstram isso).

Deste modo, se compreende que a teologia grega surge e se estabelece com preocupações e pressuposições distintas das da teologia latina, tanto devido ao contexto quanto devido aos princípios intelectuais da cultura da qual emergem e na qual se desenvolverão.

Ora, a teologia grega, por ter surgido em um mundo refinado, não terá preocupação quanto a precisão, não terá preocupação quanto a uma maior influência na cultura e não terá problemas com ambiguidades; no entanto, a teologia latina, por ter surgido em mundo que emerge da barbárie, terá preocupação com a precisão, com uma maior influência na cultura e terá problemas com as ambiguidades. Por exemplo, na teologia grega a cultura não é enxergada como “campo de batalha”, mas como lugar natural de desenvolvimento intelectual; entretanto, na teologia latina a cultura é tida como um “campo de batalha” na qual os cristãos tem de lutar; etc.

Ademais, a teologia grega é permeada por ambiguidades, mas não é por estas dominada; enquanto que a teologia latina não aceita ambiguidades, embora em vários casos seja por estas dominada. Por exemplo, na teologia grega se tem várias ambiguidades quanto a mariologia, mas nenhuma domina plenamente a teologia grega; já na teologia latina se tem estas mesmas ambiguidades, que não fazem parte do princípio latino, mas que dominam plenamente a teologia latina.

Isto, por sua vez, demonstra que a busca da teologia latina se defronta com o problema da cultura; enquanto que a busca da teologia grega se defronta com o problema de como lidar com a resposta humana ante a revelação; a tensão da teologia latina é dialética, enquanto que a tensão da teologia grega é dialógica.

Por isso, na teologia latina, se tem sempre crises e problemas de acordo com o estado da cultura; na verdade, o estado de cultura é elemento aferidor de medida para se compreender o grau e a espécie de crise que assola a cristandade latina no decorrer das épocas. Na teologia grega, se tem crises e problemas a partir do modo como se deve responder as ambiguidades, embora sem dissolvê-las plenamente, para não se tirar a tensão dialógica (a qual se estabelece primariamente na compreensão sobre a relação entre a soberania divina e a liberdade humana).

Assim, quando se tem crise na cristandade latina, se deve observar o estado da cultura; pois, as crises na cristandade latina não cessam enquanto a cultura não for edificada e/ou restaurada ao ser estado de sobriedade; portanto, não se adianta somente falar em heresias, práticas pecaminosas, etc., embora se deva fazê-lo; mas, primordialmente e principalmente, se deve restaurar a cultura ao seu estado constitutivo, para então, se solucionar a crise na cristandade latina; o caminho inverso não é possível, posto que a teologia latina surge, se desenvolve e se estabelece deste modo, de forma que permanecerá assim até o fim dos tempos.

Por isso, se pode falar que a obra que melhor dá a entender este aspecto da teologia latina, ao que concerne a mesma, suas tarefas primordiais e fundamentais, é o Apologético de Tertuliano (e outras obras de Tertuliano), enquanto que a obra que melhor dá a entender o aspecto primordial da teologia grega é o Pedagogo de Clemente de Alexandria e a Mistagogia de São Máximo o Confessor. Ora, compreendendo isso, se dá para entender, de acordo com a literatura teológica posterior, a distinção fundamental entre o princípio da teologia latina e o princípio da teologia grega. 

Portanto, nenhuma discussão ou diatribe, ou coisa similar, ajuda a cristandade quando esta está em crise, quando são feitas sem se compreender a real causa desta crise, que na cristandade latina sempre tem a ver com o estado da cultura; por isso, especificamente, as discussões quanto as crises da cristandade latina devem ser feitas de dois modos: primeiro, para preservar a doutrina e a moral, a fim de que estas crises não desfigurem a vida interna da Igreja; segundo, para identificar a causa desta crise e procurar um modo de solucionar esta crise, numa “batalha” a fim de reedificar a cultura. 

Ora, isto basta quanto para a compreensão dos dois princípios gerais do desenvolvimento da teologia ao longo da história da cristandade. 

θεῷ χάρις! 


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