Prefácio.
Depois de ter afirmado algo sobre o conhecimento a
respeito de Deus na epístola I, Pseudo-Dionísio passa a afirmar algo sobre a
natureza de Deus na epístola II; pois, Deus, em Seu Ser, é Aquele que é; e,
sendo Aquele que é, transcende a toda perfeição e a toda definição; logo, a
epístola II de Pseudo-Dionísio versa sobre alguns aspectos que concernem a este
aspecto, mais propriamente, a respeito da incompreensibilidade de Deus.
Deste modo, ao se adentrar na compreensão desta
epístola, se vai aclarar alguns aspectos fundamentais a respeito deste tópico
imprescindível do estudo a respeito de Deus; pois, como tudo quanto diz
respeito a doutrina sagrada é sobre Deus, então, os aspectos principais que
concernem a Ele, são o ponto de partida e base indiscutível para a reflexão
teológica.
Pois, o nosso conhecimento a respeito de Deus, será
sempre imperfeito, fragmentário e parcial; enquanto, que Deus é perfeito, total
e absoluto. Logo, para compreender algo sobre Ele, se deve obter algum
princípio que abalize este conhecimento de modo menos imperfeito.
Ora, para se compreender algo a respeito dEle, é
necessário compreender um princípio simples, que açambarca tudo o que
necessário de antemão conhecer sobre Ele; e este princípio abaliza aquilo que
de menos imperfeito se pode conhecer a respeito de Deus; e o conhecimento menos
imperfeito que se alcança do Ser de Deus, é aquele que é engendrado pela
designação da incompreensibilidade de Deus.
E a epístola II do Corpus Dionysiacum, mesmo
que de maneira incompleta, evoca alguns aspectos sobre esta designação. Por
isso, adentra-se a explicação desta epístola, a fim de aclarar os aspectos
fundamentais que Pseudo-Dionísio demonstra a respeito da natureza perfeitíssima
de Deus, e no que versa a respeito desse princípio fundamental do estudo sobre
Deus.
Soli Deo Gloria!
In Nomine Iesus!
22 de setembro de 2024.
Texto de Pseudo-Dionísio (Epist. II).
Como, porém, aquele que está acima de tudo está também acima da Tearquia e da bonarquia? Se por deidade e bondade entenderes a coisa mesma do dom benéfico e deífico e a inimitável imitação do Super-Deus e Super-Bom segundo a qual nos deificamos e tornamo-nos bons, (dado que este é, pois, o princípio da deificação e bonificação dos deificados e dos feitos bons), Aquele que é super-principal a todo princípio, como está acima da predita deidade e bondade enquanto Tearquia e bonarquia, à medida que é inimitável e incompreensível, excede as imitações e as relações dos imitantes e participantes.
A. Proêmio.
1. “Porque eu conheço que o Senhor é grande e que o
nosso Deus está acima de todos os deuses” (Sl 135.5); estas palavras
competem à matéria e ao assunto desta epístola; pois, o Deus único e
verdadeiro, é tão excelso, que ultrapassa qualquer possibilidade de definição e
compreensão; donde, ser reafirmado a proposição do doctor magnificus, de
que Deus é o “ser acima do qual não se pode pensar nada maior, seja no
pensamento seja na realidade” (Prosl., II). Logo, está acima de tudo
tanto na realidade quanto no pensamento, seja em relação aos entes reais seja
em relação aos entes de razão.
2. E, tal Ser, ao ser assim designado, propugna dois
efeitos gerais a respeito de Si na compreensão humana: primeiro, a descrição de
Sua natureza perfeitíssima, pois, está além de toda perfeição. “Que deus é
tão grande como o nosso Deus?” (Sl 77.13). Segundo, tal natureza
perfeitíssima demonstra a infinitude de Deus, um dos distintivos de Sua
super-perfeição, pois, tal como diz Damasceno, Deus é infinito, indeterminável,
o que é impossível figurar, impalpável, invisível (cf. De Fide Orth., I,
4); etc.
Logo, o Deus único e verdadeiro, é entendido como
Aquele que está acima de toda compreensão e de toda elucubração, pois, Sua
super-perfeição transcende completamente a simples possibilidade de
compreensão, dada a limitação e a falibilidade da razão.
3. Portanto, Ele está acima de todos os deuses, isto
é, está além de toda compreensão a respeito da divindade ou das preceituações
sobre as divindades estabelecidas por todos os povos em todas as épocas; com
isso, o Deus vivo e verdadeiro, está além da compreensão, e está é uma nota
distintiva de Seu Ser, já que como diz o Apóstolo, Ele habita numa luz
inacessível (cf. 1Tm 6.16).
E, isto, evidentemente, se coaduna com as proposições desta epístola, já que delineiam o que concerne “Aquele que é super-principal a todo princípio”, pois, “é inimitável e incompreensível”. E, o entendimento sobre a incompreensibilidade de Deus, que esta epístola evoca, é o fundamento para se prosseguir em relação ao conhecimento daquilo que se pode conhecer a respeito de Deus. Logo, etc.
B. Comentário.
1. Na epístola II,
Pseudo-Dionísio prossegue para resolver mais algumas dificuldades que Gaio lhe
apresentou; no entanto, a dificuldade, embora permaneça no mesmo assunto, muda
de ordem de tema; pois, enquanto na epístola I, Pseudo-Dionísio fala sobre o
conhecimento a respeito de Deus, a partir das proposições que apresentou em “De
Mystica Theologia”, nesta epístola ele apresenta as questões concernentes
ao ser de Deus, principalmente a partir de uma dúbia que surgira do que ele
falara no livro “De Divinis Nominibus”, de que Deus é Super-Teárquico e
Super-Bonárquico (cf. DN II). Alberto confirma esta proposição ao afirmar que a
epístola II tem sua origem justamente na dúvida sobre a afirmação de que Deus é
Super-Teárquico e Super-Bonárquico[1].
2. Ora, a dúbia surge a partir de
um qualificativo teológico aplicado a Deus; e, a partir desta dúbia,
Pseudo-Dionísio esclarece a perfeição de Deus, a perfeição acima de toda
perfeição, donde, ser deveras correto afirmar que Deus é perfeitíssimo, possui
uma perfeição que sobreleva-se infinitamente a toda perfeição. E, sobre isso,
Pseudo-Dionísio estabelece dois aspectos: primeiro, estabelece a dúbia;
segundo, apresenta a natureza perfeitíssima de Deus.
3. Primeiro, estabelece a dúbia,
onde diz: “Como, porém, aquele que está acima de tudo está também acima da
Tearquia e da bonarquia?”; ora, Pseudo-Dionísio, ao concluir a epístola I,
afirma que Deus está acima de tudo; todavia, outra dúvida surgiu a Gaio a este
respeito, todavia, com respeito a algo afirmado na obra “De Divinis
Nominibus”; pois, se Deus está acima de tudo, sendo Ele Teárquico e
Bonárquico, como, então, também está acima da Tearquia e da bonarquia; pois,
sendo Deus incompreensível, ao se defini-lo, se o define a partir de categorias
humanas; o que, em si, contribui para que se entenda algo a respeito de Deus;
mas, Deus em si mesmo, está acima da Tearquia e da bonarquia, pois, transcende
completamente a toda e qualquer definição humana; Deus é infinito em relação em
Seu Ser e em relação as definições humanas, pois, Eles as transcende de maneira
infinita.
4. Logo, sendo assim, fica
clarividente a resposta à dúbia que Gaio apresentou a Pseudo-Dionísio. Mas,
esta dúbia, estabelece não somente com relação a uma dificuldade de definição e
de compreensão; mas, fundamentalmente, estabelece o problema da compreensão a
respeito da essência de Deus; conquanto se possa compreender algo a este
respeito, o Deus Vivo e Verdadeiro está muito além de qualquer definição; a
perfeição de Deus está infinitamente além de qualquer medida de compreensão
sobre a perfeição. Por isso, Deus, é definido de acordo com a Tearquia e a
bonarquia, mas também as transcende completamente.
5. Segundo, apresenta a natureza
perfeitíssima de Deus; ora, tendo estabelecido a dúbia, sua origem e suas
perspectivas, Pseudo-Dionísio prossegue e apresenta um de seus textos mais
límpidos e preciosos, ao evocar a natureza perfeitíssima de Deus, o caminho
adequado para responder a dúbia apresentada; pois, como na epístola I houvera
falado sobre a questão a respeito da possibilidade do conhecimento de Deus,
nesta prossegue para evocar aspectos sobre a natureza de Deus, “Aquele que
está acima de toda definição”.
Por isso, a ordem em que
Pseudo-Dionísio apresenta este problema, primeiro, esclarecendo a dúbia,
depois, evocando o caminho de solução desta dúbia, tem em si a raiz e a forma
de se apresentar e resolver os problemas concernentes a compreensão a respeito
de Deus; pois, conquanto se possa conhecer algo a respeito de Deus a partir de
suas criaturas, Ele permanece oculto e envolto em mistério (cf. Êx 20.21b); e, somente
Cristo é quem desvela plenamente o conhecimento sobre Deus.
6. Mas, mesmo assim, mesmo
àqueles a quem Deus se dá a conhecer, se deve compreender que Deus é
infinitamente superior e mais sublime do que toda a definição de
suma-sublimidade; isto também pode ser definido através do axioma teológico
comum do estudo sobre Deus: Deus é transcendente, mas também é imanente; Ele é
imanente àqueles que se chegam a Ele pela “perfeita ignorância”, mas mesmo a
estes, Sua transcendência permanece sua glória peculiar, pois, Ele é
infinitamente transcendente.
Logo, mesmo sendo teárquico e
bonárquico, isto é, características compreensíveis em Sua imanência, Ele
permanece soberanamente e infinitamente acima de toda Tearquia e de toda
bonarquia.
Por isso, após por a dúbia,
apresenta a natureza perfeitíssima de Deus. E, sobre isso, faz duas coisas:
primeiro, estabelece a proposição da fonte de todo bem; segundo, evoca a
transcendência absoluta de Deus.
7. Quanto ao primeiro, estabelece
a fonte de todo bem, onde diz: “Se por deidade e bondade entenderes a coisa
mesma do dom benéfico e deífico e a inimitável imitação do Super-Deus e
Super-Bom segundo a qual nos deificamos e tornamo-nos bons, (dado que este é,
pois, o princípio da deificação e bonificação dos deificados e dos feitos bons)”;
e, a respeito disso, Pseudo-Dionísio apresenta o princípio pelo qual se
compreende a fonte donde emana e flui todo bem; pois, se os seres humanos
possuem algo de bom e são deificados, isto é, se participam em algo da natureza
divina (cf. 2Pe 1.4), então, existe a participação no Sumo-Bem, a partir do
qual, por imitação se imita, de maneira imperfeita, o inimitável.
8. Por isso, toda deidade e
bondade são tidos como deíficos e dom benéfico, no qual os seres humanos
participam, e são participes de algo da natureza divina, ao ponto de se
tornarem bons e de refletirem algo do Super-Deus e Super-Bom. A deificação dos
deificados, e a bonificação dos feitos bons, tem por princípios uma causa
primeira, a qual, só pode ser Deus, o Super-Deus e Super-Bom. Portanto, a fonte
de todo bem, é o próprio Deus; donde, se apenas a participação por comunhão com
a divindade, torna aqueles que a experimentam em deificados e bonificados,
então, se observa a completa infinitude e transcendência deste Deus; o qual, em
Seu Ser, como fonte de todo bem, transcende infinitamente a toda a medida de
bem e a toda a medida de deificação. A fonte da verdadeira deificação, e da
bonificação, é Aquele que transcende a tudo e a todos.
9. Quanto ao segundo, evoca a
transcendência absoluta de Deus, onde diz: “Aquele que é super-principal a
todo princípio, como está acima da predita deidade e bondade enquanto Tearquia
e bonarquia, à medida que é inimitável e incompreensível, excede as imitações e
as relações dos imitantes e participantes”; ora, tendo Pseudo-Dionísio,
evocado a fonte de toda deificação e de toda bonificação, prossegue, para
aclarar algo a respeito desta fonte; se apenas uma pequena participação por
comunhão com esta fonte, torna seus participes em bons e deificados, então, por
raciocínio lógico, se compreende que esta fonte está acima de toda Tearquia e
de toda bonarquia. Logo, surge a questão de que a fonte donde emana todo bem, é
“Aquele que é super-principal a todo princípio”, isto é, Aquele que como
princípio está acima de todo princípio, ou, como diz Boaventura, aquele que é o
Primeiro Princípio[2];
isto é, a fonte de todo bem, é o Princípio ante o qual não se tem outro
princípio.
10. Além disso, Pseudo-Dionísio
prossegue e apresenta os qualificativos do Primeiro Princípio, a saber, “está
acima da predita deidade e bondade enquanto Tearquia e bonarquia”; ora, “Aquele
que é super-principal a todo princípio”, tem como qualificativos a Tearquia
e bonarquia, os quais, indicam que está acima de toda bondade e de toda
deidade; a Tearquia e a bonarquia são significativos a medida que se conhece
algo sobre Deus, os quais, demonstram que como Ser Teárquico e bonárquico, está
acima de toda deidade e de toda bondade; mas, Deus também está acima de toda
Tearquia e bonarquia; isto é, Deus não apenas é Tearquia e bonarquia, mas é a
deidade e a bondade que estão acima de toda deidade e bondade, pois o próprio
Deus está acima da própria Tearquia e da bonarquia, o que demonstra sua
natureza perfeitíssima, que transcende a
toda a perfeição. Mesmo os qualificativos da Tearquia e da bonarquia como os
máximos qualificativos definíveis, Deus os transcende em Seu Ser perfeitíssimo.
Logo, como diz Pseudo-Dionísio, Ele está acima da predita deidade e da bondade,
e, por isso, é Super-Teárquico e Super-Bonárquico.
11. E, depois, Pseudo-Dionísio
prossegue e evoca mais um pressuposto, que Deus excede completamente e
plenamente mesmo aqueles que participam em algo da divindade pela comunhão com
Ele; por isso, “à medida que é inimitável e incompreensível, excede as
imitações e as relações dos imitantes e participantes”; logo, por ser
inimitável e incompreensível, excede absolutamente a qualquer imitação, e as
relações dos imitantes e participantes; isto é, por mais que os homens possam
conhecer algo de Seu ser através de Cristo, e possam participar de sua bondade
e deidade enquanto em comunhão com Ele, Deus excede infinitamente a qualquer
relação imitante-imitado e a qualquer relação participante-participado. Isto é,
a verdadeira divindade, o Super-Deus, está acima de tudo e de todos, mesmo
daqueles que possam possuir algumas características provenientes da
participação no bem e da emanação do Sumo-Bem; por isso, é Super-Teárquico,
isto é, está acima de toda Tearquia, e é Super-Bonárquico, isto é, está acima
de toda bonarquia.
12. Assim, Pseudo-Dionísio
estabelece a resposta adequada a respeito da dúvida de Gaio, no que concerne a
leitura do segundo capítulo da obra “De Divinis Nominibus”, a partir da
qual Gaio encontrara uma dubitação sobre a afirmação de que Deus, sendo
Tearquia e bonarquia, também está acima destas; logo, ao esclarecer esta dúbia,
também pontifica o caminho para esclarecer alguns aspectos efusivos e escrever
um dos textos mais significativos sobre a natureza de Deus, o Ser perfeito que
está acima de toda perfeição, isto é, Deus é o Ser Perfeitíssimo, quem nem
mesmo as mais sublimes palavras humanas para descrever as perfeições, são
suficientes para descrever a natureza infinita de Sua perfeição.
E, isto, assim como na epístola
I, está em ordem a vários aspectos do programa teológico dionísico, pois, este
tem por objetivo central falar sobre Deus e sobre seus mistérios, e
descrevê-los a partir do encontro com Cristo; é parte dos aspectos de um significativo
programa teológico, que tem por base a centralidade teocêntrica a qual é
abalizada pelo enfoque cristológico.
13. Pois, a designação da natureza perfeitíssima de Deus, não somente demonstra a infinitude de Seu Ser, mas também Sua incompreensibilidade; por isso, se entender sobre a incompreensibilidade de Deus, é a única maneira de avançar na compreensão a respeito do que se pode conhecer de Deus; pois, assim, os homens adentram na caligine divina, e o buscam não de acordo com suas próprias capacidades, mas naquilo que o próprio Deus revelou de Si e que se torna plenamente conhecido através de Cristo (cf. Jo 1.18; Hb 1.1-2).
C. Dúbia.
Em
relação as pressuposições estabelecidas ao se explicar a epístola II, surgira uma
dúbia: se Deus, sendo perfeito, está acima da perfeição.
<Dúbia Única>
Acerca da dúbia, procede-se
assim: se Deus, sendo perfeito, está acima da perfeição.
E parece que não.
I. [Argumentos].
1. A perfeição é o que de mais
sublime pode ser afirmado sobre algo ou alguém; logo, se se fala que Deus é
perfeito, então, é o que de mais sublime que se pode afirmar sobre Ele;
portanto, não é necessário e nem possível outra descrição além de se afirmar
que Ele é perfeito; logo, Deus, sendo perfeito, não está acima da perfeição.
2. Ademais, o próprio Deus diz: “Eu
Sou o que Sou” (Êx 3.14); ora, o que é, demonstra sua perfeição pelo que é;
portanto, se Deus é, nisto demonstra sua perfeição, a qual não requer nada mais
do que simplesmente ser; portanto, etc.
II. [Em Contrário].
1. Mas, em contrário, diz o
Apóstolo: “Ó profundidade das riquezas, tanto da sabedoria, como da
ciência de Deus! Quão insondáveis são os seus juízos, e quão
inescrutáveis, os seus caminhos!” (Rm 11.33); ora, se é insondável
e inescrutável, então, está além de definição; e, como o termo perfeição é uma
definição, logo, Deus está além da perfeição; portanto, Deus, sendo perfeito,
está acima da perfeição.
III. [Solução].
1. A perfeição refere-se a uma
definição de excelência e sublimidade; mas, como Deus é insondável e
inescrutável, então, transcende a toda definição, mesmo a definição de
perfeição; logo, sendo perfeito, isto é, sendo definível, transcende em Seu Ser
toda esta definição, isto é, transcende a toda perfeição; donde, ser correto
afirmar que Deus, sendo perfeito, transcende a toda perfeição; ou mais
propriamente, Deus é perfeitíssimo, a saber, possui uma perfeição que está
infinitamente acima de toda perfeição.
2. Além disso, o salmista afirma:
“A toda perfeição vi limite, mas o teu mandamento é amplíssimo” (Sl
119.96); ora, se a Palavra de Deus, a revelação que Deus outorga de Si, está
além da perfeição, então, o autor da Palavra, o próprio Deus, é ainda mais
perfeito; pois, a perfeição da Escritura é efeito da perfeição de Deus;
portanto, se a Escritura está acima de toda perfeição, Deus, está ainda mais
além desta perfeição; donde, se afirmar que Deus é infinito; pois, a infinitude
de Deus, demonstração de Sua simplicidade, confirma sua natureza perfeitíssima,
isto é, sendo perfeito, está além de toda perfeição, pois, Sua perfeição não
possui limites; e isto de dois modos: primeiro, em relação a Si mesmo, pois, é
perfeição infinita em Si mesmo; segundo, em relação aos seres humanos, pois,
para estes é sempre infinitamente perfectível.
IV. [Respostas aos Argumentos].
1. Quanto ao primeiro se responde
que a perfeição é o termo pelo qual se descreve sublimidade; no entanto, em
relação as coisas definíveis e compreensíveis a partir do intelecto humano;
neste sentido, mesmo a perfeição de algo, possui limite, pois, o intelecto não
concebe algo além do limite da perfeição; no entanto, ao se afirmar que Deus é
perfeito, se compreende que o mesmo está além do limite da perfeição; pois, a
perfeição aplicada as coisas humanas possui limite, e ao se definir Deus como
perfeito, se aplica a mesma definição a Causa Primeira; logo, na própria
designação de perfeição aplicada a Deus, se compreende que Deus está além do
limite da perfeição humana, bem como está além da própria perfectibilidade da
perfeição; pois, toda perfeição humana é perfectível, enquanto que a perfeição
divina é super-perficiente. Portanto, a perfeição em Deus, transcende toda a
descrição de perfeição, mesmo a que se faz sobre Deus; pois, Deus é o ser
absolutamente e infinitamente perfeito.
2. Quanto ao segundo se responde que, Deus, em Seu ser, como Aquele que é, demonstra Sua perfeição, em simplesmente Ser o que é; logo, em Seu Ser, se compreende Sua perfeição; ora, como Deus é infinito, então a perfeição de Deus é infinita; donde, se afirmar que a perfeição divina demonstra em suas perfeições; pois, embora em Seu Ser não seja necessário nada mais do que simplesmente o mesmo é, em Seu Ser transcende completamente a toda perfeição; portanto, sendo perfeito, em sua perfeição, transcende a toda perfeição; por isso, é perfeitíssimo. Somente Aquele que é, é perfeito e transcende em Seu Ser a própria perfeição, pois, é a perfeição sem medida ou extensão. Logo, se Deus é, então, é perfeito e transcende a perfeição; portanto, como Ele é, transcende a toda a perfeição; logo, etc.
[1] cf. Alberto Magno, Commentari In
Epistolas B. Dionysii Areopagitae, epist. II, A, In: Op. Om., XIV,
875.
[2] cf. Boaventura, Brevilóquio
[1ª ed. Campinas, SP: Ecclesiae, 2018], prol., § 6, n. 6, pág. 69.
Neste mesmo sentido também o evoca Duns Scotus, de
Deus como Primeiro Princípio (cf. Duns Scotus, Tratado do
Primeiro Princípio [1ª ed. São Paulo: É Realizações, 2015]).
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