1. A polêmica, isto é, o instrumento teorético para
debates, diatribes e/ou disputas, tem grande utilidade; embora, não a polêmica
pela polêmica; pois, a disputa pela verdade não pode ser feita com espírito de
chicana; no entanto, em épocas onde a degeneração cultural atinge graus
terríveis, se faz necessário reaver o espírito polêmico, a fim de testemunhar
da verdade, contra todas as doutrinas e práticas que estão contra a verdade; e
o espírito polêmico, neste sentido, vem imbuído com uma série de proposições,
que para muitos que estão desapercebidos chega a parecer pedantismo.
Todavia, quando a verdade é solapada e vituperada, o
espírito polêmico em prol da verdade deve ser evidente, ainda que isso gere
críticas e acusações de pedância e arrogância; pois, o silêncio diante da
vituperação da verdade é negar a própria verdade. Por isso, a polêmica em
função da verdade e pela verdade sempre é correta, ainda que para isso se tenha
que enfrentar uma hoste de soberbos mesmo que estes estejam mascarados sob os
véus da religião.
2. Assim, a polêmica tem três utilidades: primeiro,
repreender e redarguir; segundo, instruir na reta razão; terceiro, ensinar a
verdade.
Primeiro, repreender e redarguir; ora, a polêmica é
útil para repreender, isto é, corrigir do erro e mostrar o caminho da verdade,
tanto no sentido moral quanto no sentido intelectual; além do que, a repreensão
sincera de acordo com a verdade, se for exercida em quem a recebe, produz fruto
de justiça, mesmo que no momento gere alguma tristeza (cf. Hb 12.11); além disso, a
polêmica é útil para redarguir, isto é, para corrigir os desvios do caminho da
verdade, seja na vontade seja no intelecto.
Segundo, instruir na reta razão; a polêmica também é
útil para instruir na reta razão; pois, um dos maiores males que atingem o
homem hodierno é o impedimento da razão, isto é, a falta de instrução na reta
razão e a criação de práticas e/ou “hábitos” irracionais; a polêmica é útil para corrigir
este mal que assola a vida humana, e ao corrigir este mal, instruir no
caminho e nos preceitos da reta razão.
Terceiro, ensinar a verdade; a polêmica é útil, ao repreender,
redarguir e instruir, para ensinar a verdade, seja na própria repreensão seja
em alguma forma de instrução; pois, sempre o ensino da verdade é útil e
proveitoso; todavia, nem sempre o ensino da verdade advém com apenas lições ou
algo similar, mas muitas vezes advém com a polêmica e pela polêmica, através da
refutação dos erros contrários a verdade. Por isso, a polêmica é útil em todos
os sentidos para ensinar a verdade e o que concerne a verdade.
3. Deste modo, a polêmica tem uma tríplice utilidade;
todavia, se deve sempre ter o cuidado para que a polêmica não engendre o
orgulho e a soberba; não é porque se defende a verdade, e que se deva fazê-lo
com certa veemência em momentos da degeneração cultural, que isso coloca quem
defende a verdade em estágios avançados da divinização; o caminho da piedade é
a humildade, não o das polêmicas; no entanto, a piedade não impugna as
polêmicas, embora se desenvolva melhor e de forma mais sóbria sem as polêmicas;
no entanto, algumas vezes se faz necessário que homens piedosos tenham que
palmilhar os penhascos escorregadios das polêmicas.
Pois, em certos contextos e em certas situações, mesmo
os que palmilham o caminho da piedade, tenham de se defrontar com a polêmica,
principalmente pela falta de homens preparados para defender a verdade no
sentido racional; quando isto ocorre, o que se deve fazer é cada vez mais
buscar o caminho da piedade, e crescer ainda mais em humildade através da
Oração, para que que o excesso das polêmicas não torne o solo do coração um
depósito de pedras que sufocam o agir da graça de Deus.
Por isso, a polêmica tem seu lugar; e, em épocas de
graus terríveis degeneração cultural, se torna ainda mais necessária; mas, o
espírito da polêmica jamais deve ser um espírito de chicana, conquanto deva ser
sempre um espírito de alerta e vigilância, posto que os demônios atuam onde não
há verdade, seja em relação a reta razão seja em relação a doutrina revelada;
pois, onde não há verdade não há racionalidade; mais propriamente, onde não há
verdade se tem o impedimento da razão; e Satanás é o artífice de tudo aquilo que gera o impedimento da razão.
4.
Portanto, para defender e ensinar a verdade, a polêmica tem grande utilidade; e
o preceito aos fiéis é que defendam a fé que de uma vez por todas lhes foi outorgada (cf. Jd 1.3); em muitos aspectos, defender a fé também é defender a
verdade, é defender a racionalidade; pois, a fé, em muitos casos, não é atacada
propriamente em seu conteúdo revelacional, mas através de doutrinas e práticas
irracionais.
A fé
cristã, em tempos hodiernos, tem sofrido ataques, em sua maior parte, não por
conta da doutrina revelada em si mesma, mas pela aceitação de práticas
irracionais que são expressão inconcussa de obra demoníaca; os demônios, posto
que não podem corromper a fé verdadeira, buscam incentivar práticas irracionais
para impedirem que haja fé verdadeira; por isso, onde há prática irracional não
há fé.
Assim,
a defesa da fé começa pela defesa da reta razão e pela defesa da verdade; na
verdade, a defesa da reta razão e a defesa da verdade é o mesmo que a defesa da
fé; neste sentido, a polêmica é um instrumento assaz eficaz e sumamente
necessário.
5.
Com isso, se constata que a todos quantos o bondoso Deus outorgar sabedoria e
entendimento para defender o Santo Evangelho (cf. Fp 1.16), estão imbuídos, com
a mesma responsabilidade, de também defenderem a verdade, sempre com piedade e
mansidão (cf. 1Pe 3.15), mas também, quando necessário, confrontando e
argumentando contra os soberbos, já que é parte da fé não respeitar os soberbos
(cf. Sl 40.4); por isso, contra os soberbos a polêmica é extremamente
necessária.
Além
disso, é necessário que também se afirme que aqueles que enveredam pelos
caminhos da polêmica não podem ser soberbos ou insolentes; já que a insolência
é evidência de vida sem virtude e de vida contra a verdade; e em tempos hodiernos
se assomou tantos seres incautos para “defender a verdade”, que a
própria verdade é por estes solapada; a verdade polêmica é feita por aqueles
que vivem em virtude e na verdade, não por seres sem caráter, pedantes e
luxuriosos que estão imbuídos do espírito de chicana.
Ora,
se estes aspectos forem observados, certamente a polêmica verdadeira será
valorada e os polemistas virtuosos e piedosos serão reconhecidos e melhor
valorizados para a glória de Deus, pois, os que ensinam a justiça, seja de que
forma for, resplandecerão como o fulgor do firmamento (cf. Dn 12.3); e isto é o
que concerne aos verdadeiros polemistas.
E
estas breves palavras parecem ser suficientes por ora para evocar em que
sentido a polêmica é útil à fé cristã.
θεῷ χάρις!
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