A maneira dialética de pensar, ou o modo dialético de
pensar, é o pior dos males que atinge os homens modernos, os homens
crepusculares, os homens do crepúsculo do pensamento ocidental; pois, ao se
instaurar o modo dialético de pensar, e sendo isto instaurado nos seres
humanos, a consequência direta fora a desintegração da mente; os homens
modernos são, em primeira instância, homens com a mente desintegrada; e as
consequências disso são tão terríveis e tão abruptas que no todo são
indescritíveis. Em suma, e quase sem exceção, isso define a vida do homem
moderno.
Portanto, ao se buscar compreender no que consiste o
modo dialético de pensar, se deve entender que desde que Hegel instaurou seu
domínio no “eu” da cultura, a cultura e todas as suas expressões passaram a
emanar e a impregnar tudo e todos com o modo dialético de pensar; isto se
entranhou de modo tão profundo que chegou ao ponto de quase não se ter
possibilidade de se aperceber ou de se compreender a loucura total que é
instaurada pelo modo dialético de pensar.
Mas, como isso se entranhou? Simples, pela transmissão
do modo dialético de pensar instaurado por Hegel, e que foi inoculado através
do “eu-poético” da cultura, o qual permeia todas as manifestações da
inteligência em determinado povo ou sociedade, ou num geral, em todos os povos
e em todas as sociedades; ou seja, é transmitido tanto no particular quanto no
universal.
E como isso se transmite? Ora, isso se transmite, como
afirmara Olavo de Carvalho, “por impregnação passiva de hábitos, de
símbolos, de reações emocionais, de giros de linguagem, sem necessidade de
aprendizado consciente nem possibilidade de filtragem crítica”; assim, as
manifestações culturais, tais como livros, cinema, filmes, novelas, desenhos,
redes sociais, etc., são utilizadas como instrumentos para impregnar o modo
dialético de pensar; e quanto mais influência tem algum destes meios, o mesmo se
torna em instrumento mais eficaz para impregnar o modo dialético de pensar.
E isso se constata pelo fato de que, após isso se
instaurar, em quase todas as manifestações culturais não se tem aprendizado
consciente e nem filtragem crítica de certo ou errado (no sentido da verdade) e
nem filtragem crítica do que pode ou não pode (no sentido da moral); ou seja,
não se tem mais verdade e nem moralidade; a verdade se torna em mentira, e a
mentira se torna em verdade; o errado se torna certo e o certo se torna errado;
a moral se torna em imoralidade e a imoralidade se torna em moral; etc.
Deste modo, se faz necessário compreender de maneira mais específica no que concerne e quais as consequências do modo dialético de pensar e como ele perverte e subverte totalmente o funcionamento da mente, tornando os seres humanos em seres irracionais, e sujeitando-os aos ímpetos da vontade de poder da ideologia dominante. Pois, um indivíduo com mente desintegrada é apenas um idiota útil para a ideologia dominante.
I
A primeira e mais fundamental definição para se
compreender as consequências terríveis do modo dialético de pensar, é
compreender o modo como a mente funciona; pois, para se compreender a
desintegração da mente a partir do modo dialético de pensar se deve entender
como a mente funciona, para com isso se compreender as consequências da falsa
dialética na mente.
Ora, existem dois modos de compreender como a mente
funciona - e mente aqui como signo para designar todo o cérebro -, a saber:
primeiro, a partir da compreensão sobre a consciência; segundo, a partir da
compreensão sobre o intelecto.
1. Primeiro, a partir da compreensão sobre a
consciência; ora, a mente se subdivide em duas partes, ou dois lados: a
primeira é a consciência; a consciência, em suma, é a consciência-de-si (não no
sentido hegeliano), isto é, é quando o indivíduo toma consciência de si, de
quem é; e a consciência ou reflexiona uma vida integrada ou uma vida
desintegrada; por isso, a consciência é a porta de entrada para a formação da
personalidade, bem como é a chave para a lucidez, tanto em relação a si quanto
em relação ao outro; é na consciência que se atina a formação da personalidade,
da vida integrada e da lucidez diante da realidade.
Outrossim, é por esta razão que a Sagrada Escritura,
por exemplo, fala daqueles que tem a consciência cauterizada (cf. 1Tm 4.1-2),
isto é, daqueles que estando despersonalizados por causa de lutarem contra a
lei da consciência, desintegram a própria vida, prostituem a personalidade, e
ficam totalmente dementes ou retardados quanto a realidade (embora, na maior
parte das vezes não são tidos como doentes mentais); assim, existe o perigo da
consciência ser estrupada por vários meios, os quais acabam por cauterizar a
consciência e impedir que a mesma funcione corretamente.
Portanto, a primeira parte da mente, ou o primeiro
lado do cérebro, é a consciência; e primeiro também no sentido de importância;
pois, somente com a consciência desperta e consciente de si, é que o “eu” se
forma de modo racional e integrado; do contrário, a personalidade se sujeita a
todo tipo de prostituição, desfigurando-a; na verdade, a consciência só se
atina ao se encontrar com a realidade tal como a mesma é, sem lentes
ideológicas; com isso, a consciência que é consciente de si, se torna
consciente do outro, e de que está indubitavelmente diante do Totalmente Outro
(Deus); e ao se tornar assim, a consciência passar a sentir e a assentir
corretamente (isto é, o sentimento consciente e o assentimento consciente se
atinam de maneira sóbria ao que é verdadeiro e ao que é bom).
Ademais, a consciência se desenvolve plenamente e
sobriamente, a partir da experiência real, da experiência com a realidade, e a
medida do auto-conhecimento; só quem se conhece, se sabe, é que desenvolve a
consciência-de-si; a lógica que permeia a consciência não tem a ver com
mecanismo de raciocínio, tal como no intelecto, mas com o funcionamento sóbrio
e em tudo consciente; e consciência-de-si diante da presença do Ser, o qual
abaliza a consciência e a torna participe em toda a realidade como parte da própria
realidade.
Por isso, a consciência é consciência desenvolvida
quando tem consciência-de-si, diante de si, do outro, do mundo e de Deus; e
quando tem consciência de si, do outro, e de que está na presença de Deus,
desenvolve as propriedades da autoconsciência. Ou mais propriamente, nisto
concerne o desenvolvimento pleno da autoconsciência.
A consciência, portanto, funciona de maneira circular
e “cíclica” de acordo com esta estruturação, que se cristaliza na dialógica
entre a síntese formal e a síntese real a partir da experiência com a
realidade; e esta experiência é o que abaliza o desenvolvimento do intelecto.
2. Segundo, a partir da compreensão sobre o intelecto;
ora, a segunda parte da mente é o intelecto; e o intelecto é o que abstrai a
experiência da realidade, a partir da consciência, e dá forma adequada a esta
experiência de acordo com o funcionamento do próprio intelecto; o intelecto tem
três operações fundamentais: a abstração dos indivisíveis, ou simples
intelecção; a abstração dos divisíveis, ou a demonstração, ou o compor e o
dividir; e o raciocínio. Estas três operações são o fundamento da lógica; por
isso, a lógica é expressão da coesão de raciocínio, o que por sua vez é a
demonstração da continuidade de uma personalidade bem formada; etc.
Com isso, o intelecto funciona de maneira lógica; a
ilogicidade e a irracionalidade são parte do mal-funcionamento ou da obstrução
do intelecto; portanto, o que a consciência experiencia da realidade, o
intelecto entende e compreende; a autoconsciência só é plena, quando é
autoconsciência entendível e explicável; assim, existe uma estreita e
indissolvível relação entre a consciência e o intelecto, já que a consciência
abstrai a experiência, e o intelecto compreende logicamente esta experiência;
deste modo, o funcionamento do intelecto se dá a medida que a consciência se
desenvolve, e vice-versa.
Ademais, a natureza do intelecto, ao assentir da
consciência a experiência real, torna o intelecto como um todo aperfeiçoável
através do estudo e da constante atividade intelectiva; a própria alma como um
todo se descobre a si mesma pelo estudo, como afirmara corretamente Alberto
Magno; e este estudo, sendo expressão da experiência real, atina o intelecto
para suas verdadeiras funções, não somente a compreensão intelectiva ou
intelectual, mas à vida na virtude, o verdadeiro fim do saber, o qual demonstra
o fim teleológico da vida humana, a vida feliz.
Portanto, o sóbrio funcionamento do intelecto conduz a
felicidade natural; por esta razão, o Filósofo houvera afirmado que os homens
naturalmente tendem ao saber (cf. Met. 980a22); pois este tender, é o tender à
felicidade natural, adquirida mediante a compreensão de si através do
desenvolvimento do lume da luz interior, já que a perfeição natural da alma se
alcança através do desenvolvimento do intelecto.
Outrossim, é que o intelecto existe para que o homem
conheça a si mesmo no que naturalmente pode conhecer, e assim, ascenda aos
graus de compreensão sobre os objetos mais perfeitos, dos entes finitos até o
Ente Infinito.
O intelecto, portanto, funciona de maneira tríplice,
atinando a compreensão sobre as outras partes da alma, as quais são
compreendidas e estão em ordem a relação consciência-intelecto; portanto, o que
não está em conformidade com as três operações do intelecto não condiz com a
reta razão, ou seja, é irracionalidade. E a irracionalidade destrói o propósito
da vida feliz, pois a irracionalidade é o brado de vitória de Satanás ao
efetivar, por qual meio for, o impedimento da razão.
[...]
Ora, a mente sóbria se dá no funcionamento correto
tanto da consciência quanto do intelecto; o funcionamento consciência-intelecto
é o funcionamento da mente; portanto, se houver alguma desfuncionalidade, seja
na consciência seja no intelecto, haverá desfuncionalidades nas atividades
mentais; e isto tanto em graus menores quanto em graus maiores. Por isso, mente
funcionamento sobriamente é evidência de saúde mental, enquanto as
desfuncionalidades nas atividades mentais são evidência de morbidade na alma.
Assim sendo, se deve ponderar e elucubrar sobre toda e
qualquer prática e/ou doutrina também no sentido de esquadrinhar se a mesma
está em conformidade com a realidade e com o modo da mente funcionar; pois, a
instauração de uma prática e/ou doutrina irreal ocasiona obstrução na mente, tanto
na consciência quanto no intelecto.
Portanto, como a função da mente é funcionar tal como
tem de funcionar, o que por si é óbvio, se assim não ocorre, há de se averiguar
quais as consequências do não-funcionamento da mente, para se compreender quais
as causas do não-funcionamento da mente.
Aliás, que se saiba que o não-funcionamento da mente
também é chamado, em sentido tomasiano, de impedimento da razão ou impedimento
da mente. Por isso, o que não está em ordem ao funcionamento da consciência ou
do intelecto, ocasiona ou mantém o não-funcionamento da mente ou o impedimento
do uso da razão.
Por isso, práticas e/ou doutrinas irracionais
pavimentam o piche da irracionalidade na mente, tornando-a sujeita aos
tentáculos do impedimento da razão; na verdade, irracionalidade deliberada e
consciente é evidência do não-funcionamento da mente.
E com isso o que passa a valer para o indivíduo não é
mais o que é verdadeiro e bom, mas o que está em conformidade com os gostos
pessoais; e uma vez que a mente está infuncional, os gostos pessoais
irracionais serão expressão inconcussa de doença na consciência e de doença no
intelecto; não existe gosto pessoal racional que contradiga a própria lei da
consciência ou as operações do intelecto, mas gosto pessoal irracional é luta
de morte contra a lei da consciência e o erguimento de trincheiras contra as operações
do intelecto.
Assim, se se tem gosto pessoal irracional, então o que
há na verdade, é o estabelecimento na mente de uma muralha que impede a razão
de funcionar; e os defensores mais ferrenhos desta muralha são os demônios.
II
A maior das artimanhas, ou o mais eficaz dos
instrumentos, para instaurar o não-funcionamento da mente é o modo dialético de
pensar, estabelecido por Hegel a partir de seu sistema da ciência; embora a
raiz do modo dialético de pensar esteja em Hegel e seja da mais alta
dificuldade de se compreender, se deve compreender o modo dialético de pensar
por suas consequências, não tanto por suas diretrizes; pois, as diretrizes
filosóficas no sistema da ciência são ínvias, enquanto que os modos de
instaurar o modo dialético de pensar são mais fáceis de serem compreendidos.
Deste modo, para uma melhor compreensão do modo
dialético de pensar a partir dos modos de instaurá-lo, se estabelece três
axiomas anatômicos: primeiro, os princípios para se instaurar o modo dialético
de pensar; segundo, as perspectivas para se instaurar o modo dialético de
pensar; terceiro, os instrumentos para se instaurar o modo dialético de pensar.
1. Primeiro, os princípios para se instaurar o modo
dialético de pensar; a primeira coisa que Hegel efetua para instaurar o modo
dialético de pensar é a transmutação dos princípios; pois, muda-se os
princípios, muda-se o modo de inteligir; assim, se se cria princípios não-reais
se vai inteligi-los e não se vai desenvolver a inteligência, que só se
desenvolve ao inteligir princípios reais; e como os princípios não-reais
escondem dentro de si uma mão-invisível, então quem os intelige sem compreender
que são não-reais se sujeita a manipulação desta mão dentro do próprio
intelecto; ou mais propriamente para compreender melhor esta simples analogia:
se torna como uma marionete.
Além disso, a transmutação dos princípios muda a ordem
dos princípios, isto é, desfigura a ordem de eminência e a ordem de dependência
dos princípios reais; se se muda esta ordem, então os princípios mais
importantes não serão valorados, enquanto que as coisas não-importantes se
tornarão em coisas importantes; e isso se aplica a tudo; com isso, a
transmutação dos princípios afeta desde o funcionamento do intelecto, até as
decisões diárias dos seres humanos; e a loucura que emana da desordem causada
pela transmutação dos princípios permeia, sem exceção, toda a sociedade; a
transmutação dos princípios gera uma loucura de valores, ou inversão de
valores, em toda a sociedade.
Por isso, se há a transmogrifação dos valores, o
ocorrerá as seguintes loucuras: o que é certo passa a ser errado e a ser
chamado de errado, e o que é errado para a ser certo e a ser chamado de certo;
bem como a mentira passa a ser a verdade e ser chamada de verdade, e a verdade
passa a ser mentira e a ser chamada de mentira; etc.
Enfim, essa é a raiz da inversão de valores da
sociedade moderna, uma raiz tão profunda que tem causas espirituais cimentadas
pela apostasia.
2. Segundo, as perspectivas para se instaurar o modo
dialético de pensar; a segunda coisa que Hegel efetua para instaurar o modo
dialético de pensar é a transmutação das perspectivas; pois, se se muda os
princípios, então se mudará as perspectivas; ora, o modo da transmutação dos
princípios, será o modo da transmutação das perspectivas; e se a
transmogrifação dos princípios gera inversão de valores, a transmogrifação das
perspectivas gerará supressão dos valores.
Por isso, a inversão de valores gera esquizofrenia
sócio-cultural, enquanto que a supressão dos valores induz a criação de uma
nova ordem de valores, totalmente distinta dos valores reais da vida (ou
verdades eternas); além disso, a supressão dos valores criará a repressão da
virtude, a tal ponto da virtude ser tida como vicio e o vício ser tido como
virtude; e assim os virtuosos serão suprimidos ou relegados ao ostracismo, e os
viciosos serão valorados e promovidos e legados aos mais altaneiros pedestais; a
supressão dos valores tradicionais ocasiona o sucesso e a promoção de
indivíduos sem nenhuma qualidade moral e intelectual.
Deste modo, a transmogrifação das perspectivas induz a
esta mudança de maneira inconsciente; muda-se as perspectivas, muda-se os
gostos e induz a certos gostos programados para serem tidos como certos; além
disso, a própria sociedade passa a ter perspectivas esquizofrenizadas; e isto,
por sua vez, sempre gerará desvios morais e intelectuais; não haverá
perspectiva moral, e assim não haverá mais padrões morais; e não haverá
perspectiva intelectual, e assim não haverá mais padrões intelectivos.
Isso, por sua vez, proporciona a sociedade a ser
dominada por seres vis, imorais, pérfidos, imbecis, etc.; ou seja, a sociedade
será dominada por tolos, fraudes e militantes.
3. Terceiro, os instrumentos para se instaurar o modo
dialético de pensar; a terceira coisa que Hegel efetuar para instaurar o modo
dialético de pensar é a subcriação de instrumentos para manipular a
transmogrifação dos princípios e das perspectivas; pois, se se transmogrifou os
princípios, e isso gerou a inversão total dos valores, e se transmogrifou as
perspectivas, e isso gerou a supressão dos valores, para se utilizar dos
efeitos destas transmogrifações, há de haver algum instrumento que canalize estes
efeitos para algum fim; os instrumentos que Hegel estabelece são justamente
para canalizar estes efeitos aos seus propósitos, os quais estão manifestos no
sistema da ciência (Phänomenologie des Geistes).
Ora, se se transmogrifou os princípios, então se
gerará grimórios em relação as verdades eternas; assim, se procurará mudar as
verdades eternas; se procurará paulatinamente se mudar a religião, não para
deixar de ser religião ou algo similar, mas para ser religião sujeita ao
sistema hegeliano; se procurará paulatinamente mudar a verdade, a liberdade, a
beleza, o bem, etc., para sujeitá-los ao sistema hegeliano; com isso, se terá
religião, verdade, liberdade, beleza, etc., mas de acordo com as normas do sistema
hegeliano.
E se se transmogrifou as perspectivas, então se gerará
grimórios em relação aos axiomas; assim, se procurará paulatinamente mudar os
axiomas inevitáveis da vida, tais como: a estática da vida em movimento
despersonalizador; o silêncio da prudência em barulho da luxuria; o casamento
em leito maculado; a substância de algo em algum símbolo; etc. No mais, os
axiomas da vida, os axiomas básicos da vida vão sendo mudados, e assim se cria
uma sociedade adoecida, de seres doentes, mas que se sequer se apercebem que
estão doentes.
Assim, em todos os meios possíveis para instaurar
gostos e axiomas para a vida, se busca instaurar o modo dialético de pensar; ao
ter sido efetivada a transmogrifação dos princípios e das perspectivas, se
obterá sucesso para implementar o modo dialético de pensar em qualquer meio que
tiver acesso as grandes massas ou que produzir o “efeito manada” nas
grandes massas; na verdade, os meios de acesso às grandes massas, as mais
variadas mídias, de livros até jornais, artes cênicas, imprensa, mídias
sociais, etc., se tornam em meio para manipular e controlar as massas; um
controle total, mas imperceptível; um controle absoluto, mas velado as ocultas.
Por isso, se querem criar uma nova perspectiva,
colocam este algo a partir destas mídias, e depois de um tempo se instaura o
que querem; pois, se se instaurou o modo dialético de pensar, então, não se
terá nenhum padrão e/ou filtragem crítica para o quer que seja, mesmo para
coisas simplórias; e com isso se sujeitará tudo e todos as consequências da
transmogrifação dos princípios e das perspectivas, não somente destas por si
mesmas, mas de acordo com os propósitos nefastos da ideologia dominante.
O domínio é de Hegel, mas a instrumentalização deste
domínio está nas mãos da ideologia histórica dominante que se estabelece a
partir de Hegel, a saber, o marxismo-comunismo. Assim, os instrumentos para
instaurar o modo dialético de pensar serão utilizados de acordo com a vontade
de poder do marxismo-comunismo.
III
Ora, em suma, é assim que se instaura o modo dialético
de pensar; mas, depois de instaurado, há de se entender como se manifesta;
pois, uma vez instaurado, dificilmente será compreendido pelos modos como foi
instaurado, porque estes parecerão irrisórios para aqueles que já foram por
isto totalmente dominados; se chamar de loucura uma prática de um louco já
tornada em “hábito” será pelo próprio louco chamada de loucura. O mesmo se dá
ao se falar do modo dialético de pensar e de suas consequências.
Por isso, ao se falar no modo dialético de pensar, se
fala ao mesmo tempo de outro aspecto; pois, a definição do modo dialético de
pensar é um signo com duplo escopo: se se fala do modo dialético de pensar, se
deve falar de sua consequência mais terrível, a saber, a desintegração da
mente. O modo dialético de pensar ocasiona a desintegração da mente.
E, uma vez que a mente está desintegrada, suas duas
partes ou os dois lados do cérebro serão adoecidos, ou seja, doença na
consciência e doença no intelecto; e a doença na consciência ocasiona várias
doenças espirituais, que se assomam ao intelecto; e a doença no intelecto
ocasiona várias doenças intelectuais, as mais das vezes, consequência direta
das doenças espirituais, e que podem se tornar em doenças psíquicas.
Portanto, ao se observar o fenômeno da desintegração
da mente, e ao se procurar descrevê-lo, se encontrará uma série assustadora de
patologias, numa variegação imensa de sintomas, que são manifestos
cotidianamente nos homens modernos como se fossem algo normal; e como são
muitas, descrevê-las todas se torna quase algo impossível; no entanto, se deve
evocar um panorama a este respeito.
Antes, porém, convém mencionar que o que Cícero
descreve sobre a “rejeição a razão” e suas consequências, é utilíssimo para se
compreender as consequências da desintegração da mente (cf. Disp. Tusc.,
IV, 23-32); pois, o modo dialético de pensar, em suma, é efeito da total
rejeição a razão; logo, a “aspernatio rationis” ciceroniana é uma
definição mais antiga para o mesmo problema, o impedimento da razão.
E neste mesmo sentido, também convém mencionar o que
Pascal fala sobre o divertimento (cf. Pens., 11, 137, etc.), já que tal
conceito contêm inúmeros insights formidáveis a respeito das consequências da
desintegração da mente; pois, mente desintegrada é mente sujeita aos
divertimentos, e mente desintegrada é mente que procurará para si divertimentos.
Cícero e Pascal apenas não o definiram como modo
dialético de pensar, mas evocaram várias características das consequências da
desintegração da mente; como fora dito, para Cícero isto se definia como
rejeição a razão, e para Pascal, divertimento; aliás, quanto a isso também se
poderia evocar a glosa tomasiana sobre o impedimento da razão (cf. In II
Thess., cap. II, lect. 2), que em suma é o que ocorre quando se instaura o
modo dialético de pensar; etc.
Tendo dito isso, se evoca um brevíssimo panorama
dessas consequências ou manifestações; pois, o modo dialético de pensar
ocasiona a desintegração da mente, e se tem várias manifestações distintas
desta desintegração; e entre estas, se evoca apenas duas, a saber: primeiro, em
relação a vida pessoal; segundo, em relação a religião.
1. Primeiro, em relação a vida pessoal; ora, a
desintegração da mente afeta tudo quanto diz respeito a vida pessoal, a vida
individual; pois, a desintegração da mente, como fora dito, calcifica o
impedimento da razão; e isto por sua vez, torna o “eu” do indivíduo totalmente
sujeito a tudo aquilo que é anti-humano; todavia, a partir da efetivação da
desintegração da mente, como ocorre a total inversão dos valores, tudo aquilo
que for anti-humano e destruir a dignidade humana, será valorado como se fosse
algo bom, e pior, tais práticas e/ou doutrinas serão defendidas ferrenhamente
por quem as pratica.
Por isso, a vida pessoal se torna anti-pessoal a
partir da desintegração da mente; por esta razão, os “gostos” pessoais passam a
ser a medida de todas as coisas; e os “gostos” pessoais, a medida que ocorrera
o impedimento da razão, serão sem exceção irracionais; ou dito de outro modo,
não serão mais ‘gostos” pessoais, isto é, “gostos” evocados pelo indivíduo por
si mesmo, mas serão “modas” instituídas para se tornarem “gostos” pessoais, ou
para tornar o indivíduo sujeito a algum preceito ideológico, ou então algum
divertimento para velar qualquer possibilidade de entendimento da miséria que o
domina na vida pessoal.
Assim sendo, a vida pessoal se torna totalmente
dominada por práticas e/ou doutrinas que são contra a própria dignidade do
indivíduo; e tais práticas se tornam naquilo que se tornou comum falar nos
ambientes religiosos como “pecados de estimação”, ou seja, os pecados
mortais que são estimados e valorados como se fossem virtudes, e que são
defendidos como se fossem obra divina; na verdade, em sentido racional, se
assoma ao indivíduo tudo o que é irracional, e em sentido espiritual, tudo que
é pecaminoso; pois, irracionalidade e pecaminosidade estão em estreita
consonância.
2. Segundo, em relação a religião; ora, se a
desintegração da mente afeta todo o “eu” do indivíduo, então permeará
totalmente a esfera religiosa; o religar e o reler se tornam totalmente
sujeitos ao que domina a mente de um indivíduo; por isso, se alguém está com a
mente desintegrada, então, a religião que faz parte de sua vida se tornará não
mais em expressão de religião pura e simples, mas manifestação dos “gostos”
pessoais; assim, a religião passa a ser “vivida” de acordo com gostos pessoais
irracionais.
Na verdade, a desintegração da mente torna os
indivíduos em buscadores de criar uma religião a imagem de si; não o criar uma
religião a partir do nada, ou criar uma religião que ainda não existe; mas,
transmogrifar a religião existente (principalmente o cristianismo), em
expressão da vontade e dos “gostos” pessoais.
Ora, isto se comprova de muitos modos, mas se observa
uma característica peculiar em todos aqueles que buscam moldar ou “viver” o
cristianismo a partir dos gostos pessoais, a saber: as práticas de um
cristianismo moldado a partir dos gostos pessoais serão totalmente contra os
preceitos morais da Sagrada Escritura, e ao se criticar tais práticas, aqueles
que as praticam procurarão argumentos religiosos e “teológicos” para comprovar
tais erros.
Além disso, este tipo de cristianismo, que é a maior
parte do que se diz cristianismo em tempos hodiernos, é um cristianismo água com
açúcar (a expressão é de C. S. Lewis!), é um cristianismo diluído; pois, ao se
criticar os gostos pessoais instaurados em uma mente desintegrada, as mais das
vezes a manifestação não será abrupta ou violenta, mas sim em obstinação e
soberba, ou seja, na permanência insidiosa nas práticas errôneas, e pior, na
arrogância desvelada em cultivar a doutrina dos demônios na vida pessoal
enquanto se evoca a suposta “fé”; não existe fé verdadeira onde há obstinação;
pois, em se tratando da fé a obstinação é fruto da mente desintegrada e/ou da
vontade corrompida e não da experiência com a verdade.
Pois, a instauração dos gostos pessoais como se fosse
cristianismo é aquilo que o Apóstolo chama de doutrina de demônios (cf. 1Tm
4.1); e a principal manifestação deste tipo de “cristianismo” é a vida pessoal
totalmente contrária aos preceitos morais, bem como uma vida pessoal permeada
por gostos irracionais. Portanto, a desintegração da mente afeta totalmente a
prática religiosa, principalmente em relação ao cristianismo que em si é uma
religião racional.
Por isso, quem mais perde com a desintegração da mente
é o verdadeiro cristianismo, e quem mais ganha é o falso cristianismo. Com
isso, a valoração de práticas irracionais é evidência de que o que se tem é
falso cristianismo e não verdadeiro cristianismo.
Pois, a fé verdadeira não tolera irracionalidade e não
comporta irracionalidade; portanto, como a desintegração da mente ocasiona
irracionalidade absoluta, então onde há desintegração da mente não há fé
verdadeira.
E, em suma, esta é, quanto a esfera religiosa, a
consequência da desintegração da mente.
[...]
Assim, a desintegração da mente ocasiona efeitos
terríveis tanto na vida pessoal, quanto nas manifestações religiosas, etc.; e
por causar efeitos terríveis na alma do indivíduo, por conseguinte causará
efeitos terríveis na alma da sociedade; as consequências no indivíduo se tornam
posteriormente em consequências sociais; com isso, a desintegração da mente
primeiro permeia os indivíduos e os desintegra, depois domina toda uma
sociedade e a corrompe de tal modo a fim de que não haja possibilidades de se
resolver este inominável problema.
Deste modo, se constata que a vida na modernidade é
uma vida com a mente desintegrada, a religião na modernidade é expressão dos
gostos subjetivos do freguês; vida pessoal irracional e religião irracional,
eis a sina que permeia os homens na contemporaneidade; e quanto mais se afundam
em tais práticas, mais difícil se torna de se conscientizar os homens deste
estado inumano no qual estão vivendo; ou mais propriamente, quanto mais
destruído está um indivíduo mais difícil se torna mostrá-lo os efeitos desta
destruição.
Além disso, ao calcificar esta destruição, a estrutura
pública, o estamento público, existirá contra as estruturas da consciência,
isto é, manterá a desintegração da mente, só que elevada a nível estatal; ou
seja, o aparato público, até mesmo a dita “opinião” pública, gerará estruturas estatais
para reprimir as estruturas da consciência, causando total desordem
sócio-política e em alguns casos também desordem jurídica. Numa sociedade em
desordem, o inconsciente público é expressão inconcussa de desintegração da
mente já cristalizada a no mínimo três gerações passadas (isto é, a no mínimo
150 anos). Isto, por si, define os homens modernos e as sociedades modernas.
***
Assim, concluo esta reflexão, dir-se-ia uma
meditação anamnésica, a fim de explicar brevemente e de maneira mais simples
possível o fenômeno do modo dialético de pensar, ou mais propriamente sua
consequência, a desintegração da mente; na verdade, o que se conclui agora é
uma breve e simplória tentativa, utilizando da pressuposição voegeliana, de
explorar aspectos da consciência existencial, a qual nos homens modernos é
dominada pela desintegração da mente. Deste modo, compreender no que concerne e
quais as consequências do modo dialético de pensar é tarefa dos intelectuais e
filósofos hodiernos, que encontrarão neste tema o tronco comum de quase todos
os males da modernidade.
Que o Deus Altíssimo outorgue intelectuais e filósofos
para lutar contra o modo dialético de pensar, e assim recuperar aos homens
aquilo que eles têm de mais belo nesta vida, a racionalidade.
θεῷ χάρις!