18/12/2024

Breve Reflexão sobre os Símbolos

Prólogo.

1. “o homem produz símbolos”; esta sentença de Jung demonstra o que concerne a algo fundamentalmente humano, dir-se-ia, humano, demasiadamente humano, a saber, a produção de símbolos; mas por que o homem produz símbolos? Simples, porque não consegue abarcar de uma vez o todo, e por isso, ao produzir símbolos, produz uma parte que está em ordem ao todo e que demonstra algo do todo. Isto, em si, constitui-se de algo inerentemente humano; os símbolos são caractere indiscutível do que é realmente humano; por isso, sem símbolos, sem humanização.

2. Deste modo, se faz necessário investigar o que concerne aos símbolos, tendo em vista a importância e a utilidade deste assunto; pois, em tudo que é essencialmente produzido pelo ser humano, se tem algo simbólico; na verdade, todo o saber humano tem algo simbólico; portanto, a compreensão sobre os símbolos diz respeito tanto a própria natureza humana, quanto sobre a natureza do saber, bem como sobre o que concerne a vida humana como um todo. Por isso, no preceito jungiano, o que o homem é, diz respeito ao que produz a partir do que se é; assim, o ser humano em sua humanidade, produz símbolos.

 

Capítulo I: O homem como animal simbólico.

3. A pressuposição jungiana, demonstra o fato de que o ser humano é um animal simbólico; pois, o ser humano, é um ser moral-espiritual-cultural; e, como ser cultural, produz símbolos; portanto, é um animal simbólico em tudo o que é e faz; por isso, o ser humano está imbuído em símbolos e para produzir símbolos; pois, a função do homem em relação a cultura é produzir cultura; e ao fazê-lo, desenvolver o saber; e o saber só se desenvolve em consonância com a simbologia, já que pelo preceito dos sábios se compreende que todo conhecimento é simbólico.

4. Portanto, ao se referir ao homem como um animal simbólico, se fazem três coisas: primeiro, se evoca o modo de operar da inteligência; ora, a inteligência opera de modo a apreender os indivisíveis e combinar os divisíveis; ou dito segundo os termos utilizados por Piaget, por assimilação e acomodação; embora os termos de Piaget sejam incompletos, a descrição da dialógica assimilação-acomodação é mais facilmente entendida; pois, em seu operar, primeiro a inteligência capta o objeto, depois o acomoda a algum outro conhecimento já captado; e os símbolos sempre são os primeiros objetos a serem captados pela inteligência; logo, os símbolos existem e coadunam-se com o desenvolvimento da inteligência; por isso, sem símbolos, ou símbolos mal-feitos ou mal dispostos, a inteligência não se desenvolve e o ser humano é emburrecido.

Segundo, se estabelece o preceito concernente ao ajuste do homem ao objeto percebido; ora, ao assimilar e acomodar algum objeto inteligido, o ser humano faz seu próprio ajuste a este objeto; e observe-se bem, faz um ajuste ao objeto, e não ajusta o objeto a seu próprio gosto; pois, a inteligência ao acomodar algo, trata posteriormente, de ajustar este algo através não em sua totalidade, pois é algo impossível, mas o ajustar no máximo possível; assim, o ajuste do homem ao que ele percebe e conhece, é apenas parte do que se pode conhecer sobre este objeto; pois, como afirma Olavo de Carvalho, “na percepção isso jamais ocorre porque não posso me relacionar com nenhum ente na sua totalidade”. E este ajuste, por sua vez, demonstra que o homem ao ser um animal simbólico, ao se relacionar com a natureza, se relaciona com outros seres simbólicos, já que todos os seres vivos são, em suma, animais simbólicos.

Terceiro, a designação dos símbolos como “matriz de intelecções”; ora, se o homem se ajusta aos símbolos, ao realizar a acomodação de algum objeto inteligido, então, se deve compreender que nos símbolos se tem os gérmens necessários para a intelecção; assim, se observa a precisa definição de Susanne Langer, que chama os símbolos de “matriz de intelecções”; e realmente, os símbolos possuem os gérmens que atinam a assimilação de um objeto, ao este ser percebido, ao mesmo tempo em que proporciona que um objeto percebido seja acomodado com algum conhecimento já existente, para abalizar outras intelecções; na verdade, os símbolos fornecem os elementos necessários para todo o processo concernente a intelecção e ao operar da inteligência.

5. Deste modo, o ser humano, enquanto um animal simbólico, percebe os símbolos, se relaciona com outros entes simbólicos, bem como abaliza tudo quanto concerne ao operar da inteligência a partir dos símbolos; por isso, se pode afirmar que em tudo quanto é humano, demasiadamente humano, se tem uma ampla estrutura simbólica; e o ser humano vive e desenvolve tudo quanto diz respeito a vida natural neste amplo escopo simbólico; logo, o simbolismo natural é elemento inescapável da vida natural, e isto em todos os sentidos.

 

Capítulo II: A definição de símbolo.

6. Ora, diante de afirmação do homem como um animal simbólico, surge a questão sobre o significado dos símbolos; e, sobre isso, duas coisas são afirmadas: primeiro, quanto a definição de símbolo; ora, definir o vocábulo símbolo não é coisa fácil; pois, este vocábulo adquire conotações diversas nos mais variados campos do saber; por isso, para definir símbolo é necessário estabelecer uma definição geral e englobante que permeie basicamente todo o amplo escopo da aplicabilidade deste conceito aos campos do saber.

Assim, se define símbolo como algo que representa algum objeto, o qual, nesta representação evoca a tensão entre o objeto representado e aquele que percebe este objeto; com isso, símbolo pode ser definido como um signo amplo, já que expressa a coisa representada em vários ângulos e modos, tal como um prisma que reflete a luz; o que o prisma reflete são efeitos da luz ao permeá-lo, mas não é propriamente a própria luz; o mesmo se dá com o símbolo e a coisa a que ele se refere.

Além disso, se compreende que o vocábulo símbolo, pode ser definido a partir da díade da relação fundamental do ser humano com o Ser Superior e com os outros seres vivos; logo, os símbolos são parte do que se compreende da realidade, mesmo que os símbolos não consigam se referir a um objeto em sua totalidade, o que per se é impossível; mas ao se referir a algo deste objeto, por si mesmo, reflete este objeto tal como o prisma ao receber a luz. E fundamentalmente esta é a natureza do símbolo em relação ao objeto significado.

7. Segundo, quanto aos sinônimos de símbolo; ora, ao definir símbolo desta maneira, e ao ter aclarado anteriormente algumas de suas propriedades, tal como na definição da Sra. Langer, se pode aferir alguns sinônimos para o vocábulo símbolo; e, entre as muitas possibilidades, dois aspectos são salientados.

Primeiro, a que pressupõe o símbolo como a percepção de um dado da realidade; ora, esta definição se estabelece em consonância com o processo inerente a percepção, a qual, por sua vez, demonstra que toda a realidade, uma totalidade, é percebida com os dados que da mesma emanam, os quais, são parte do todo e estão em relação com o todo; por isso, um dado percebido, é uma percepção sobre um ente existente, não em sua totalidade e nem na totalidade que lhe abarca, mas de parte de sua totalidade, a qual atinou a percepção e a esta se mostrou, e vice-versa; logo, um símbolo é como um dado percebido de um ente existente, e as mais das vezes, o símbolo é a expressão deste dado.

Segundo, a que define símbolo como círculo de latência; ora, esta definição provêm da significação feita aos símbolos por Olavo de Carvalho, ao este afirmar “que símbolo não é mais do que outro nome para círculo de latência”, e assim “podemos definir símbolo..., como uma parte que anuncia totalidades latentes”; com isso, símbolo traz em si a tensão inerente do objeto percebido e seu “intelector”, ao mesmo tempo em que anuncia uma totalidade maior deste objeto que não fora totalmente captada, a qual anuncia tanto que há mais a conhecer sobre o objeto percebido quanto em relação ao todo ao qual faz parte este objeto; portanto, se pode afirmar que símbolo tem por sinônimo os círculos de latência já que estes anunciam uma parte de uma “totalidade latente”.

8. Ora, nestas duas se abaliza uma definição de símbolo; mas não somente isso, pois, o que concerne aos símbolos permeia tudo quanto o ser humano faz; no laborar da vida cotidiana, se tem símbolos e mais símbolos, bem como se produzem símbolos de símbolos, e assim por diante; no entanto, ao se compreender que o símbolo é definido como um círculo de latência se compreende tudo quanto diz respeito a apreensão dos objetos reais na realidade; e, isto, por sua vez, demonstra as latências dos entes existentes, os quais, por isso mesmo, também são entes simbólicos; e se são entes simbólicos, então, são inteligidos por outros entes simbólicos; logo, etc.

 

Capítulo III: A importância e a utilidade do símbolo.

9. Assim, ao ter se evocado aspectos sobre a importância do símbolo, se pode então concluir ao se designar o que concerne a utilidade do símbolo; e, sobre isso, três aspectos são salientados: primeiro, a respeito da aplicabilidade dos símbolos; ora, os símbolos se aplicam em vários aspectos concernentes ao saber, já que a primeira abstração de um ente é justamente através de seu símbolo; no entanto, os símbolos ao funcionarem como uma “matriz de intelecções”, fornecerem os gérmens necessários para atinar o ato intelectivo para a abstração de um determinado ente; por isso, os símbolos se tornam efetivamente aplicáveis a toda expressão do ente assimilado.

Deste modo, a aplicabilidade dos símbolos refere-se não somente a significação de algo, mas fundamentalmente a utilização do elemento simbólico de um ente para a compreensão deste ente e para o desenvolvimento da própria percepção, a fim de aclarar a assimilação de um objeto pela inteligência; e isto, por sua vez, demonstra que os símbolos estão em conformidade com as concepções comuns da mente que todos conhecem e aprovam; logo, se constata que os símbolos são aplicáveis em tudo quanto diz respeito a este tipo de concepção comum da mente, tanto para a intelecção quanto para a compreensão do referente ao que o símbolo se refere; etc.

10. Segundo, a respeito da comunicabilidade dos símbolos; ora, os símbolos comunicam algo; e, com isso, se constata que os símbolos possuem certa comunicabilidade; pois, se um símbolo representa algo, então, comunica algo sobre este algo representado; logo, em tudo o que é simbólico haverá comunicabilidade entre si, bem como com os seres humanos; pois, a percepção da comunicabilidade dos símbolos é algo inerente ao ser humano, mesmo que as mais das vezes não busca compreender os aspectos dialógicos desta comunicabilidade.

Por isso, Schelling afirma que a figura humana já é em si mesma uma imagem do universo (cf. Philosophie der Kunst, 608); pois, o ser humano sendo uma imagem do universo, possui em si mesmo o que concerne para entender o universo; logo, figura humano como uma imagem do universo se torna um símbolo que açambarca e se relaciona com outros símbolos, e que nesta inter-relação explica os símbolos; por esta razão que alguns autores antigos falam do homem como um microcosmo; e, com isso, se pode constatar que, sendo o homem um microcosmo, então, se relaciona com o macrocosmo, de modo a haurir uma imagem do universo que permeie toda as esferas da vida humana.

11. Terceiro, a respeito da disposição simbólica do saber; ora, se a figura humana é uma imagem do universo, então, nesta imagem e na inter-relação com outros entes, se conseguirá perceber a disposição simbólica do saber; pois, como “todo conhecimento é simbólico”, a própria disposição do saber também é; e, evidentemente, isto engendra tudo aquilo que diz respeito ao modo como os símbolos atinam a percepção para a intelecção de algo; o símbolo é o que primeiro é entendido a partir do conhecimento sensível; logo, onde houver um símbolo existe uma “matriz de intelecções”, as quais, por sua vez, aponta para toda uma ampla teia de fenômenos referentes a algo, que constituem este algo e demonstram sua essência, seja algo complexo seja algo incomplexo dizível.

12. Deste modo, concluo esta breve reflexão, onde pude delinear o que significa os símbolos, ao modo de introdução, a fim de responder o que vossa dileção me indagara; embora, a reflexão sobre os símbolos permeie uma ampla gama de assuntos e tópicos, e principalmente em tempos coevos onde se reveste de uma imensa dificuldade desde a implementação de uma inculturação anti-simbólica e de normas sociais anti-símbolos, a reflexão sobre os símbolos se tornou quase como um totem de épocas passadas; e mesmo diante deste cenário, se deve recuperar a reflexão sobre o símbolo, pois esta permeia tudo quanto diz respeito ao saber humano e a vida humana.

Então, no que fora dito, creio ter dito o suficiente para explicar o que concerne a este assunto; mas, se possível não deixe de ler os seguintes livros: (i) “O Homem e Seus Símbolos”, de Jung; (ii) “Imagens e Símbolos” de Mircea Elíade, entre outros do mesmo autor; (iii) “Philosophie der symbolischen Formen” de Ernst Cassirer - deste livro se tem uma edição espanhola muito boa; (iv) “Símbolos Fundamentais de la Ciência Sagrada” de René Guénon, e outros livros dele sobre os símbolos; (v) “Von Heiligen Zeichen” de Romano Guardini - deste livro se tem uma edição espanhola muito boa; (vi) “O Saber e o Enigma” de Olavo de Carvalho; entre tantos outros livros; mas se conseguir ler estes e compreendê-los, certamente, conseguirá melhor compreender os símbolos a partir deste texto introdutório que lhe escrevo.

13. E termina aqui esta breve reflexão a respeito dos símbolos. Bendito seja Deus por todas as coisas. Amém. 


Tomás de Aquino e a Imaculada Conceição

1. A compreensão sobre o dogma da imaculada conceição é um tema controverso; pois, é um dogma; todavia, a forma como se apresenta este dogma não está em conformidade com o que a Palavra de Deus afirma e nem com o que os Concílios Ecumênicos afirmaram sobre a regra de fé e prática da cristandade com respeito a este assunto.

2. E, para melhor compreender o que é a imaculada conceição, se volta as pressuposições de Tomás de Aquino; evidentemente, se sabe que Tomás não elaborou uma análise aprofundada, ordenada e específica sobre este assunto; todavia, deixou pressuposições e ponderações, as quais são suficientes para se compreender alguns aspectos do que concerne a imaculada conceição enquanto dogma em relação a cristandade latina; pois, todos os dogmas da fé estão em ordem a Santíssima Trindade, ou do contrário não são dogmas.

3. E, em relação a compreensão de Tomás sobre a imaculada conceição, se tem três textos, de momentos distintos da obra do aquinate, mas que mesmo que tenham sido de períodos diferentes de sua vida, se se compreender no contexto em que foram afirmadas tais pressuposições e a razão das mesmas, se observa que Tomás deixou vários aspectos importantes para a elucubração sobre a imaculada conceição. E diferentemente do que propugna Garrigou-Lagrange, Tomás não teve três diferentes posições sobre a imaculada conceição, mas três distintas ponderações, dado o contexto e o propósito de seus escritos que versam sobre este assunto.

I. A preservação da Virgem quanto a concepção de Cristo.

4. O primeiro texto de Tomás sobre este assunto é o do comentário as Sentenças de Pedro Lombardo, no qual o aquinate assevera: “Entendemos que se alcança a pureza mediante uma separação do contrário. Por isso, entre as realidades criadas pode haver algo criado em que nada pode ser mais puro nas coisas criadas, se não tem nenhuma contaminação do pecado. Tal foi a pureza da bem-aventurada Virgem, que foi imune ao pecado original e ao atual. No entanto, ela esteve debaixo da proteção de Deus, enquanto que nela existia a potência para pecar. Mas a bondade se dirige ascendendo ao fim que está infinitamente distante, isto é, ao sumo-bem. Entretanto, pode haver algo melhor do que um bem finito[1].  

5. Ora, a sentença de Tomás é clara e precisa: a Virgem foi imune ao pecado original e ao atual; mas, em que sentido Tomás se utiliza desta expressão? Ora, o aquinate faz tal comentário na distinção 44, a qual versa sobre a questão se Deus tem limitada qualitativamente sua onipotência; e, especificamente, o artigo 3 versa sobre a questão se Deus poderia fazer a humanidade de Cristo melhor do que é.

Ora, o artigo 3, está em ordem a Cristo, então a pressuposição sobre a Virgem também está em ordem a Ele, e não a si mesma (e isso é óbvio!); portanto, quando se refere a que a Virgem foi imune ao pecado original e ao atual, se refere a sua concepção de Cristo, isto é, em razão da humanidade de Deus.

6. Pois, ao se compreender o contexto de afirmação do aquinate se compreende a razão de sua afirmação; portanto, a imaculada conceição neste sentido, se refere a preservação da Virgem quanto a concepção de Cristo, sua gestação e nascimento, já que a santidade da Virgem se refere a Sua tarefa maternal quanto ao Filho de Deus.

E, mesmo que haja muitos que apliquem tal proposição a Virgem, mesmo alguns dos Padres, ou foi porque foram movidos pela excessiva “afetividade” teológica, ou então porque tiveram alguma desatenção quanto ao assunto.

II. O modo da preservação da Virgem quanto a concepção de Cristo.

7. O segundo texto de Tomás é da terceira parte (IIIa) da Suma Teológica, o qual evoca a questão de quando a Virgem fora santificada para ser a mãe do Filho de Deus; Tomás afirma: “Portanto, acredita-se razoavelmente que a virgem abençoada foi santificada antes de nascer do ventre” (STh IIIa, q. 27, a. 1, co.); e, noutro artigo afirma: “a santificação da bem-aventurada Virgem ocorreu após sua animação” (STh IIIa, q. 27, a. 2, co.).

8. Ora, estes dois aspectos parecem se contradizer, no que concerne a santificação da Virgem Maria; no entanto, não se contradizem, mas se referem a dois aspectos distintos na compreensão sobre a bem-aventurada Virgem Maria; pois, o primeiro aspecto, diz respeito a escolha da Virgem, isto é, a sua separação antes de nascer no ventre materno, o que toma o nome de eleição, mas que também pode ser chamado de santificação; neste sentido, a Virgem foi santificada antes de nascer do ventre, isto é, foi eleita para ser a mãe do Filho de Deus antes de nascer no ventre materno; quanto a isso, não há o que discutir, pois, a própria Escritura afirma que Deus assim procede, tal como afirma ao profeta Jeremias (cf. Jr 1.5); etc.

9. E o segundo aspecto, diz respeito a sua humanidade; ora, a santificação, isto é, a separação, se dá na alma; por isso, a Virgem fora santificada após sua animação, isto é, em Sua concepção; mas, foi santificada, quanto ao propósito de Sua eleição, assim como os patriarcas e os santos profetas da Velha Aliança, e como, por exemplo, ocorrera com João Batista; logo, neste sentido, a santificação da Virgem, isto é, sua separação para um propósito específico dado por Deus, em conformidade com Sua eleição, se dá após a animação, isto é, após Sua concepção, já que todo ser humano é concebido em pecado, tal como diz o salmista (cf. Sl 51.5, 58.3); e quanto a isso há somente uma exceção, o próprio Cristo (cf. Hb 4.15).

Ora, quanto a isso, também não há muito o que discutir, bastando apenas compreender o que concerne a santificação enquanto escolha soberana de Deus, isto é, a eleição, e a santificação quanto a separação do pecado; pois, tanto um quanto o outro, são efeito da graça de Deus. Por isso, a Virgem santa foi cheia da graça (cf. Lc 1.28); etc.

10. Assim sendo, a Virgem foi preservada do Pecado, não porque deixou de ser humana, mas devido a eleição e a graça de Deus em escolhê-la para ser a mãe do Filho de Deus; donde, Tomás afirmar: “A bem-aventurada Virgem foi santificada no ventre do pecado original no que diz respeito a uma mancha pessoal, mas ela não foi libertada da culpa pela qual toda a natureza era responsável, a saber, que ela não poderia entrar no Paraíso, exceto através do sacrifício de Cristo; como também é dito dos santos padres que existiram antes de Cristo” (STh IIIa, q. 27, a. 1, ad. 3); ora, a Virgem foi preservada do Pecado original, quanto a transmissão, isto é, Ela foi preservada do Pecado original na concepção de Cristo porque fora a Virtude do Altíssimo que a fizera conceber (cf. Lc 1.35), para não transmitir o Pecado ao fruto de seu ventre já que era pecadora como todos os seres humanos.

11. Por isso, Tomás afirma que ela foi santificada no ventre do pecado original no que diz respeito a mancha pessoal, isto é, do efeito do Pecado original quanto a Sua concepção, pelo fato de que fora gerado pelo Espírito de Deus. Mas, não foi libertada da culpa pela qual todos os homens são pecadores (cf. Rm 5.12), pela qual somente foi liberta pelo sacrifício de Cristo, donde a própria Virgem afirmar que Deus é o Seu salvador (cf. Lc 1.47), etc. E isto também é dito dos patriarcas e santos profetas da Velha Aliança, no que concerne a salvação e a eleição dos mesmos para serem mensageiros da revelação de Deus.

12. Portanto, a Virgem foi preservada do Pecado quanto a concepção de Cristo; mas, em relação a Sua eleição, Ela foi santificada (eleita) antes de nascer; e em relação a Sua tarefa como mãe do Filho de Deus, Ela foi santificada (eleita) para que o fruto de seu ventre não recebesse o efeito do pecado original que a mesma contraiu assim como todo ser humano contrai ao ser concebido. Logo, a afirmação de Tomás na questão 27 da terceira parte da Suma Teológica apresenta o modo e a maneira da imaculada conceição de Maria quanto a concepção de Cristo.

13. E aqui se faz uma breve digressão, pois que muitas das questões concernentes a Suma Teológica, já que é teologia dogmática, versa a partir das autoridades; e, em algumas questões mariológicas, Tomás procurou embasar-se na autoridade que era atribuída a Agostinho, mas que verdadeiramente não eram de Agostinho; por isso, em questões onde Tomás evoca a autoridade de Agostinho, mas que não pertencem a Agostinho, deve-se ponderar que se na época houvesse a compreensão apurada sobre estes assuntos, certamente Tomás tomaria outra diretiva nestas questões; e, em se tratando da mariologia, certamente negaria alguns aspectos que afirmou embasado na autoridade atribuída a Agostinho.

III. A preservação da Virgem quanto a culpa do Pecado Original.

14. O terceiro texto de Tomás de Aquino sobre a imaculada conceição, é feito em sua exposição da saudação angelical, no qual Tomás afirma: “Ela é, pois, puríssima também quanto à culpa, pois nunca incorreu em nenhum pecado, nem original, nem mortal ou venial[2]; ora, esta afirmação está em consonância com a afirmação anterior; embora, seja no âmbito específico da saudação angelical; pois, a anunciação fora feita para demonstrar duas coisas: primeiro, a demonstração da eleição de Maria para ser a mãe do Filho de Deus (cf. Lc 1.28-31); segundo, o modo da concepção do Filho de Deus (cf. Lc 1.34-35).

15. Deste modo, a Virgem santa é pura, isto é, é eleita e santificada para conceber e dar a luz ao Filho de Deus; pois, em relação a Sua eleição e a Sua santificação para esta tarefa, a Virgem não incorreu em Pecado, pois, fora preservada da culpa do Pecado Original quanto a transmissão para o fruto de seu ventre, e das práticas dos pecados mortais e veniais também em relação a isso, já que a fonte da graça estava em seu ventre; por isso, Isabel ao vê-la afirmara: “Bendita és tu entre as mulheres, e é bendito o fruto do teu ventre!” (Lc 1.42); a Virgem Maria é bendita entre as mulheres por causa do fruto de seu ventre.  

Portanto, a Virgem fora preservada quanto a culpa do Pecado Original ao conceber o Filho de Deus, tanto porque a concepção fora obra divina, quanto para o fruto do ventre não recebesse os efeitos do Pecado original; pois, como diz o autor aos Hebreus em tudo Cristo foi sem pecado (cf. Hb 4.15); logo, também em Sua concepção, Cristo foi sem pecado.

16. No entanto, parece que tal afirmação apoia a proposição de que a Virgem santa foi sem pecado quanto a sua vida como um todo; todavia, a teologia da saudação angelical, a mariologia concernente a este aspecto, diz respeito a este aspecto demonstrado e não em relação a vida da Virgem antes ou após a concepção de Cristo; mas, a imaculada conceição está em ordem a Cristo; ou pelo menos, biblicamente e dogmaticamente, assim deveria ser, e não a desordem doutrinária que se mantém velada neste assunto tão maltratado pela má compreensão do assunto, o que, infelizmente, alguns dos santos católicos também contribuíram para tal má compreensão.

17. E que a compreensão adequada sobre este assunto seja novamente reestabelecida, tanto para livrar a cristandade latina da aporia da ambiguidade em um dogma proclamado, quanto para que esta aporia não gere mais crises no âmbito da vida interna do catolicismo; pois, todo dogma que é proclamado com ambiguidade gera crises internas terríveis no catolicismo; e com o dogma da imaculada conceição não foi diferente. 

E que as perspectivas ora evocadas sejam observadas com atenção, tanto para evitar criticas passionais quanto para que o assunto seja corretamente entendido. 

θεῷ χάρις



[1] Tomás de Aquino, Commentarium in Librum Sententiarum, livro I, d. 44, q. 1, a. 3, ad. 3.

[2] Tomás de Aquino, Expositio Salutationis Angelicae, art. 1. 


16/12/2024

Sobre as Esferas da Natureza

Prólogo. 

1. “Como são desejáveis todas as suas obras, até a menor centelha do que se possa contemplar!” (Eclo. 42.23); ora, esta sentença de Sirach demonstra duas coisas: primeiro, a maravilha da contemplação da criação; pois, das criaturas, se chega a ver, por analogia, o seu Criador (cf. Sb 13.5). Segundo, a grandeza da criação, pois o Criador dignara suas obras em grandes e pequenas, em visíveis e invisíveis, donde afirmar: “todas as suas obras”.

2. Deste modo, em todas as obras da criação, desde as maiores, as maiores estrelas, até a menor centelha, tudo, absolutamente, são desejáveis, isto é, são belas e boas para serem contempladas e estudadas, tal como diz o salmista: “Grandes são as obras do Senhor, procuradas por todos os que nelas tomam prazer” (Sl 111.2).

Portanto, a criação, ou para se utilizar um termo filosófico, a natureza, na própria sentença sapencial de Sirach, possui duas esferas gerais: a primeira, das coisas visíveis, a das operações visíveis da natureza; a segunda, das coisas invisíveis, a das operações ocultas da natureza.

Logo, tudo quanto concerne a criação está imbuído nestas duas esferas, já delineadas no preceito de Sirach.

Capítulo I: As esferas da natureza.

3. E, a respeito das esferas da natureza, duas coisas são afirmadas: primeiro, a respeito da distinção entre estas esferas; segundo, a respeito da relação entre as esferas.

3. Ora, quanto ao primeiro, se afirma que são distinguidas duas esferas da natureza, porque os entes naturais possuem causas ocultas de efeitos naturais em suas próprias essências; e isto se dá com todos os entes naturais, principalmente com relação aos corpos físicos, onde a presença de elementos ocultos se tornam mais facilmente perceptíveis; logo, se afirma duas esferas gerais na natureza (além é claro, das várias esferas modais).

4. E, quanto ao segundo, se observa que há uma inter-relação entre as operações visíveis e as operações ocultas da natureza; e, embora pouco tenha sido descoberto a respeito dos modos desta inter-relação, se pode afirmar com absoluta certeza, que muitas das causas das operações visíveis se dá no âmbito das operações ocultas, como, por exemplo, no princípio movente que move os corpos físicos, pois se sabe que são movidos, mas não se vê o que os move; etc.

5. Deste modo, se compreende que estas duas esferas gerais são facilmente percebidas como existentes; assim, se pode afirmar que existem operações que concernem as manifestações visíveis, e existem operações que concernem as manifestações ocultas; mas, estas operações funcionam de modo tão perfeito, que é quase impossível se elucubrar sobre as mesmas de modo a distinguir na realidade um aspecto de outro. Mas, é justamente isso que demonstra a amalgama destas operações.

6. Assim, se compreende que se percebe três coisas quanto a estas operações: primeiro, os modos destas operações; segundo, os meios destas operações; terceiro, os efeitos destas operações.

7. Quanto ao primeiro, se compreende que toda operação natural é imbuída de um modo, tal como as peças de um motor; por isso, os antigos falavam da “maquina mundi”, a máquina do mundo; logo, as operações da natureza se dão tal modo que se concatenam tal como peças de um motor, tanto no modo da operação como na forma que as mesmas tem nestas operações. E as operações da natureza demonstra a ordem e o preceito ordenacional na natureza, que sempre é o mesmo nas mais diversas operações visíveis, tal como Sirach afirmara: “determinou para sempre suas tarefas” (Eclo. 16.27a).

8. Quanto ao segundo, se compreende que tendo as operações um modo estabelecido, as mesmas são permeadas por vários meios naturais para alcançar o fim natural para o qual foram designadas; logo, os meios das operações da natureza, são naturais e comportam a maleabilidade necessária para comportar tudo quando concerne a determinada operação natural ou operações naturais; pois, tudo que diz respeito as operações naturais são operadas por algum meio, o que se exemplifica através do movimento: existe o movimento, o que é movido, e aquele que move ou aquilo pelo qual algo é movido; o mesmo se dá em todas as operações da natureza, numa concatenação precisa e matemática.

9. Quanto ao terceiro, se compreende que toda operação da natureza, produz efeitos; pois, não são operações isoladas, mas operações que são açambarcadas num conjunto muito maior, o que se explica na proposição sobre a máquina do mundo; assim, as operações da natureza são causadas em ordem a ordenação natural; pois, na natureza, causa, causado e aquilo que causa, estão inter-ligados de modo a que os efeitos de cada um contribuam no todo da operação natural que concerne a cada coisa ou a cada ser.

10. Portanto, os efeitos das operações da natureza, serão de dois tipos: primeiro, efeitos operantes; segundo, efeitos operadores. Ou seja, serão tanto efeitos que são operantes e operam, quanto efeitos que causam alguma coisa na operação. Logo, são efeitos que são operados, operam em si mesmos e em conjunto com outra coisa operante, bem como que operacionam o que concerne a natureza no que lhes compete; donde, se constatar que a natureza não falha nas coisas necessárias (cf. De An. 432b20; Eclo. 16.27b).

11. Assim, ao se elucubrar sobre as esferas das operações da natureza, se compreende estes aspectos, que também podem ser compreendidos a partir dos adjuntos da natureza; pois, do mesmo modo como a natureza como um todo possui alguns adjuntos naturais - os quais, segundo o Filósofo são cinco: matéria, forma, lugar, tempo, movimento; e estes adjuntos, por sua vez, são contributos para os modos, os meios e os efeitos das operações da natureza; assim sendo, concerne a tudo quanto diz respeito as operações da natureza o estar açambarcadas por estes adjuntos e com estes adjuntos. E isto também abaliza que as coisas da natureza, muitas das quais coisas incomplexas, se defrontam com os predicamentos ao de modo de serem predicadas e compreendidas, pois, todos os entes da natureza se defrontam com estes aspectos: substância, quantidade, relação, qualidade, lugar, etc.

Capítulo II: A combinação das esferas da natureza.

12. Assim sendo, compete elucubrar se é possível combinar as esferas da natureza; pois, se estas esferas se inter-relacionam, cumpre investigar sobre esta combinação, já que há uma inter-relação numa espécie emaranhado perfeito; conquanto isso seja verdade, e esta combinação exista na realidade, ainda não se conseguiu explicar a relação entre as duas esferas da natureza, dada a inconstância das leis concernentes as operações ocultas da natureza, as quais ainda não foram corretamente entendidas; no entanto, antes de propriamente se poder formular com mais exatidão as leis das operações ocultas da natureza, cumpre investigar o modo desta inter-relação a partir do que é perceptível e conhecível das operações visíveis da natureza. Pois, quanto a natureza, se conhece algo das operações ocultas a partir das operações visíveis.

13. E, quanto a isso, se afirmam três coisas: primeiro, que há uma inter-relação em ordem dos atributos próprios dos elementos naturais; segundo, que há uma inter-relação em ordem a comunicabilidade dos elementos naturais; terceiro, há uma inter-relação em ordem a princípios mais elevados.

14. Deste modo, se constata que a combinação entre as esferas da natureza há de levar em conta estes três aspectos; pois, estão amalgamados, e são inter-relacionados de modo subsequente, complementar e cíclico; com isso, as inter-relações na natureza, estão em ordem aos atributos próprios dos elementos naturais, na comunicabilidade destes elementos, e de acordo com a compreensão sobre os movimentos ocultos da natureza; e, com isto se constata que estão em ordem a princípios mais elevados, como afirmara Tomás no De Operationibus Occultis Naturae.

15. Assim, se compreende que uma coisa é a combinação destas esferas que funcionam naturalmente; outra é o entendimento preciso sobre esta combinação; e outra ainda, é a unificação teórica em campo único desta inter-relação; logo, a combinação das esferas da natureza permanece um mistério a ser elucubrado e a ser investigado, pois, tal como Sirach afirmara até mesmo a menor centelha da criação é algo desejável (cf. Eclo. 42.23).

Capítulo III: O método da resolução e da composição.

16. Ora, um modo de se compreender ou pelo menos se elucubrar sobre a combinação das esferas da natureza, é através do que Roberto Grosseteste afirmara sobre o método da resolução e da composição; pois, Grosseteste afirma que existem dois modos para o pensamento científico, respectivamente um modo para cada esfera da natureza, a saber: primeiro, a observação e experimentação das leis universais; segundo, a aplicação das leis universais a situações particulares.

17. Quanto ao primeiro, se chama método da resolução; quanto ao segundo, se chama método da composição. E os dispôs em inter-relação subsequente e complementar; logo, em primeiro lugar se estabelece o método da resolução, e, depois, se estabelece o método da composição; e, a partir disso, se compreender melhor o que concerne a compreensão das operações ocultas da natureza.

18. Vejamos, pois, estes dois aspectos. Em relação ao primeiro, o método da resolução, se afirmam duas coisas: primeiro, que a natureza possui uma ordem; pois, a natureza como um todo, está em perfeita ordem quanto ao funcionamento das coisas naturais; logo, esta ordem demonstra que na natureza tudo tem um propósito e tudo segue uma lei para o que foi designado (cf. Eclo. 16.26-29).

19. Segundo, que desta ordem emanam leis gerais ou universais; ora, a ordem da natureza está prescrita em leis naturais; destas leis, se constata a existência de algumas leis gerais ou universais da natureza; e o conhecimento destas leis constitui-se da base e do fundamento da ciência; logo, as leis gerais referem-se a ordem das coisas visíveis da natureza, que governa de maneira geral as operações ocultas da natureza; por isso, o conhecimento e entendimento sobre as leis universais da natureza, abaliza a busca pela compreensão das leis particulares da natureza, isto é, das leis inerentes as operações ocultas da natureza.

20. Em relação ao segundo, o método da composição, se afirmam três coisas: primeiro, que das leis universais da natureza se chega a compreensão das leis quânticas da natureza; ora, se se tem leis universais, que governam toda a natureza, no âmbito destas leis, se tem outras leis, que governam a esfera das operações ocultas da natureza, as leis quânticas; logo, das leis universais se pode haurir algo que abalize o conhecimento sobre as leis quânticas; por isso, daquilo que fora haurido em resolução das leis universais da natureza, pode ser composto, de vários modos e formas, quanto a esfera das operações ocultas da natureza.

21. Segundo, que as leis das operações ocultas da natureza são diferentes quanto ao modo de operação; pois, as leis universais são tidas como universais pois estão em todos os âmbitos da natureza e em todas as operações naturais; no entanto, as leis das operações ocultas não são universais neste sentido; pois, em se tratando das operações ocultas da natureza se tem dois aspectos: primeiro, as leis quânticas gerais, que concernem as operações quânticas mais gerais e mais facilmente em composição com as operações visíveis; segundo, as leis quânticas específicas, que concernem as operações quânticas mais específicas e mais difíceis de serem entendidas pois versam sobre inúmeros aspectos que não são facilmente entendíveis, mesmo aqueles em que se compreende alguma coisa quanto a sua forma e modo.

22. Terceiro, que as leis das operações ocultas da natureza estão em ordem aos princípios primeiros das operações naturais; pois, as operações ocultas da natureza não se dão simplesmente ao acaso; as mesmas são governadas em sabedoria e foram estabelecidas em sabedoria; e, no estado atual de conhecimento, se pode afirmar que as operações ocultas da natureza estão em ordem aos princípios primeiros das operações naturais, os quais são: luz, matéria, movimento, tempo; e estes princípios são suficientes para se entender que todas as operações ocultas da natureza estão em ordem aos mesmos, isto é, em relação subsequente, complementar e circular de geração, participação e processão com os mesmos ou a partir dos mesmos.

Portanto, as operações ocultas da natureza estão em relação com a luz, quanto a forma; em relação com a matéria, quanto a composição das coisas visíveis; em relação com o movimento, quanto ao modo das operações tal como na resolução; e em relação ao tempo, quanto a velocidade concernente aos efeitos das operações, as mais das vezes em relação com um ou mais dos outros três aspectos.

23. Deste modo, se constata que a partir dos dois preceitos metodológicos formulados por Grosseteste na primeira metade do séc. XIII, se pode pensar e elucubrar a respeito dos modos da combinação das esferas da natureza, quanto a explicação e formulação teórica desta combinação.

Portanto, a partir dos preceitos evocados se consegue melhor pensar este assunto, principalmente em sua aplicabilidade na ideia da teoria de campo unificado em relação as duas físicas, a clássica e a quântica; especialmente, a partir da ideia da teoria das cordas, que embora incompleta, sua aplicabilidade serve para compreender esta inter-relação; ou então, na ideia de dupla hélice aplicada a inter-relação entre as duas físicas; etc.

No entanto, o que fora dito basta por ora quanto a explicação sobre o que concerne as esferas gerais da natureza.

24. E termina aqui esta explicação a respeito das esferas da natureza. Bendito seja Deus por todas as coisas. Amém. 


26/11/2024

Sobre a Moralidade Sexual

Prólogo.

1. Tendo vossa dileção requerido meu parecer a respeito do difícil tema da moralidade sexual, resolvi escrever brevemente o que concerne a este assunto do ponto de vista da fé cristã, embasado nas Sagradas Escrituras; pois, a fé diz respeito não somente ao que se deve crer, mas também a como se deve viver; e, quanto ao como se deve viver, há também os preceitos divinos sobre a sexualidade; e a respeito da moralidade sexual há inúmeras prescrições bíblicas, que demonstram qual deve ser o entendimento de um cristão a respeito deste tema e de como deve ser a vida do fiel quanto a sua sexualidade.

2. E, quanto a isso, três coisas são afirmadas: primeiro, que a sexualidade é uma dádiva de Deus, já que criara os seres humanos com o ímpeto sexual (ou instinto sexual); segundo, que a sexualidade deve ser usufruída dentro dos parâmetros da lei de Deus, pois, somente assim é uma sexualidade que dignifica o ser humano (do contrário, usurpa a dignidade do ser humano); terceiro, a sexualidade tem parâmetros distintos para os solteiros e para os casados, já que para os solteiros é ordenado a castidade plena e para os casados é ordenado o usufruir com sobriedade o banquete do casamento.

Capítulo I: A doutrina bíblica sobre o sexo.

3. Assim, compete compreender o que concerne a sexualidade a partir destes princípios, os quais, por sua vez, apontam para a moralidade sexual cristã, que não é nem moralismo nem libertinagem; neste sentido, o moralismo é a hipocrisia velada sob rigidez religiosa e a libertinagem é a doutrinação do “sexo livre”; e ambos, tanto o moralismo quanto a libertinagem, desfiguram o propósito de Deus para a sexualidade e não condizem com aqueles que se dizem cristãos; na verdade, tanto os moralistas quanto os libertinos não são cristãos porque vituperam a vontade revelada de Deus quanto a sexualidade, pois um cristão verdadeiro segue e vive o que ordena a lei de Deus, principalmente em relação a sexualidade.

4. Deste modo, se faz necessário aclarar o que a Escritura ensina sobre o sexo; ou melhor, compreender a doutrina bíblica sobre o sexo; pois, a sexualidade diz respeito a parte sensual da alma; por isso, em coisas que excitam a sensualidade, geralmente se excita a sexualidade; no entanto, a sexualidade sóbria se mantém dentro dos preceitos da natureza, isto é, em ordem e em decência; pois, fora assim que o Criador estabelecera como lei natural da natureza humana. E a sensualidade sexual é benéfica quando exercida dentro do casamento entre homem e mulher, e isto em sobriedade; portanto, a parte sensual da alma é protegida das práticas hediondas da promiscuidade de quando do casamento orientado sobre a reta razão e sobre a Palavra de Deus.

5. E, quanto a isso, duas coisas são afirmadas: primeiro, a sexualidade está preceituada na criação original (cf. Gn 2.24); logo, diz respeito a parte do propósito de Deus para o ser humano; assim, é algo bom; mas pela corrupção do Pecado, a sexualidade pode se tornar em instrumento de destruição do indivíduo, donde a Escritura também alertar contra a imoralidade sexual (cf. 1Ts 4.3); portanto, a sexualidade deve ser entendida de um lado com a ótica criacional, de outro com a ótica da queda, e estas abalizadas pela ótica da redenção em Jesus Cristo.

6. Segundo, a sexualidade é parte do anelo do esposo pela esposa e vice-versa; pois, o anelo de um homem por uma mulher, e vice-versa, tendo em vista o casamento, onde consumam este anelo, esclarecem que a castidade em vista ao casamento é algo benéfico; pois, o desejo pela pessoa amada é algo bom que visa o casamento; e isto para o homem é como o exalar de bons unguentos (cf. Ct 1.2a), ao ponto de as virgens admirarem o homem casto (cf. Ct 1.2c) e os retos o amarem (cf. Ct 1.4e); além do que a castidade engendra a gentileza além do desejo e/ou da mera compensação sexual (cf. Ct 1.16a).

E estas, e muitas outras, são características a serem observadas, a seu modo, nos jovens cristãos, pois também são preceitos de como deve ser a conduta dos jovens cristãos.

E para a mulher a torna agradável tanto fisicamente (cf. Ct 1.5) quanto na virtude (cf. Ct 1.10), bem como torna sua face aprazível e digna (cf. Ct 4.3), e ainda a demonstra como uma mulher amigável e livre da mancha da promiscuidade (cf. Ct 4.7) ao ponto de ser reconhecida como um jardim fechado (cf. Ct 4.12); e estas, e muitas outras, são as características da mulher virtuosa antes do casamento. E na verdade tais características são preceitos de como deve ser a conduta das jovens cristãs.

Por isso, de quando da castidade, o homem anela por sua futura esposa, e a mulher anela por seu futuro esposo, a fim de usufruírem da bênção de se tornarem uma só carne a partir do casamento (cf. Ct 4.10). Deste modo, os anelos que convém a sexualidade tal como orientada por Deus deve ser em função do casamento e a serem usufruídos apenas nos limites sacrossantos do casamento.

7. E estes dois aspectos explicam de modo geral o que concerne a doutrina bíblica sobre o sexualidade; pois, a partir da vontade revelada de Deus, se compreende o que concerne a sexualidade, a qual deve ser pensada entre os fiéis tendo em vista ao casamento; pois, o casamento é preceito natural, e assim é preceituado a todos os seres humanos; embora, a alguns Deus pode conceder o dom do celibato ou chamar ao celibato (ou em função da disciplina sacerdotal, seja pela obrigatoriedade tal como na Igreja Católica, seja como opção disponível tal como na Igreja Protestante); mas a compreensão sobre o celibato não é o objetivo deste escrito; por isso, quanto a compreensão sobre a sexualidade estes dois aspectos evocados ajudam na compreensão sobre o propósito da sexualidade segundo a fé cristã, a qual está em consonância tanto com a Palavra de Deus quanto com a reta razão.

Capítulo II: A fé cristã e a moralidade cristã.

8. Assim sendo, se compreende que a fé cristã tem imbuída uma moralidade; uma moralidade bíblica; mas sempre uma moralidade que permeia todas as partes da alma; pois, a fé diz respeito a todo o indivíduo: corpo, alma e espírito; portanto, como a sensualidade diz respeito a uma parte da alma em relação com o instinto corporal, então, necessariamente, se tem prescrições bíblicas quanto a moralidade sexual; no entanto, as prescrições bíblicas não são meras proibições legalistas, como muitos que se dizem “cristãos” apregoam para viverem de forma desleixada o “sexo livre”.

Mas, as prescrições bíblicas em relação a sexualidade estão em consonância com a dignidade inerente a natureza; a dificuldade ou a não-aceitação, e em alguns casos até o escárnio - e, pasme-se até por parte de muitos que se dizem “cristãos” - com relação a moralidade sexual; isto, na verdade, é expressão do coração dominado pelo Pecado; pois, aquele que conhece a Deus em Cristo, que foi lavado e regenerado pelo Espírito Santo (cf. Tt 3.3-7), sabe que os mandamentos de Deus não são pesados (cf. 1Jo 5.3), antes são deleitosos (cf. Sl 1.2), e nisto se aplica principalmente os preceitos bíblicos quanto a sexualidade.

Por isso, aqueles que se dizem cristãos mas escarnecem dos preceitos bíblicos quanto a sexualidade, na verdade, não são cristãos, pois tal tipo de escárnio demonstra a raiz do que domina o coração, a saber, o Pecado e o ímpeto do movimento demoníaco.

9. Portanto, para se compreender o que concerne a moralidade sexual de acordo com a fé cristã, há de se ater a uma concepção geralmente deixada de lado ao se analisar tal tema, a saber, o desejo; pois, compreender o que concerne ao desejo é compreender o que concerne a moralidade sexual de acordo com a fé; pois, o desejo é fruto da abstração de algo que atraiu a parte sensitiva da alma; por isso, o desejo é como uma semente, que uma vez plantada e regada, acaba por nascer; e este é o “processo” da tentação e do pecado; pois, o desejo engendra a concupiscência, e a concupiscência uma vez concebida, dá luz ao pecado e este sendo consumado gera a morte (cf. Tg 1.15); logo, o desejo é o que atina a concupiscência.

Assim, a sexualidade uma vez desfigurada estará em forma a ser gestada a partir do desejo; e o desejo como afirma Tomás, tudo o que fazemos provêm do desejo (cf. I Thes., V, 2); por isso, uma vez que o desejo se engendra em algo pecaminoso, geralmente para a sexualidade, então, o ato sexual se torna como que um ato que substitui a oração naqueles que não seguem a moralidade sexual bíblica; pois, a sexualidade corrompida se torna um “deus” no coração dos incrédulos e dos infiéis, e mesmo daqueles que dizendo-se “cristãos”, mas não o são; deste modo, se fala tal como alguém já disse no “altar da idolatria sexual”.

Pois, a não-observância dos preceitos bíblicos quanto a moralidade sexual gesta no coração o princípio da idolatria, que uma vez consumado, torna o coração um altar de idolatria sexual; pois, se constata a seguinte atitude daqueles que dizendo-se cristãos mas não seguem os preceitos bíblicos sobre a moralidade sexual, a saber: o escárnio, a maledicência e a inveja que emanam sempre que a repreensão quanto a moralidade sexual acutila os pseudo-cristãos ao ouvirem sobre os preceitos divinos quanto a sexualidade.

10. Com isso, se pode afirmar que a fé cristã, quanto a sexualidade, é uma moralidade cristalina e benéfica, em que estabelece ao ser humano a vontade revelada de Deus, através das Escrituras, ao mesmo tempo em que prescreve o caminho da dignidade sexual daqueles que convém àqueles que temem a Deus; logo, a fé cristã tem uma moralidade sexual prescrita a todos quantos creem em Cristo como único e suficiente Salvador, e que buscam viver de forma a agradar a Deus e de forma digna do evangelho.

Capítulo III: A moral sexual e as virtudes da juventude.

11. Ora, tendo feito estas ponderações, posso prosseguir e evocar a aplicação básica sobre este assunto àqueles que mais sofrem com questões referentes a moral sexual, a saber, a juventude; pois, criou-se uma doutrinação, calcinada nas labaredas do inferno, de que a juventude não precisa de moral sexual; grande engano, pois a juventude é que mais precisa de moral sexual, da moralidade sexual bíblica, para que a juventude seja viçosa e forte, e não tropega e instrumento de manipulação como atualmente se constata na maior parte dos jovens (e não só dos jovens em quase todo mundo, independente da faixa etária); mas em relação a moral sexual isto se constata de maneira mais abrupta na juventude.

Pois, as virtudes inerentes a juventude são a força e jovialidade; e, tais virtudes, muitas vezes confundem-se com permissividade para com o “sexo livre”; na verdade, as virtudes inerentes a juventude só são experienciadas na castidade que honra a Deus, e não na promiscuidade do “sexo livre”; pois, o “sexo livre” promete liberdade e prazer, quando na verdade traz aprisionamento e vazio na alma; a força da juventude, elogiada pelo evangelista dos segredos de Deus (cf. 1Jo 2.14b), é uma força na e para a castidade; pois, do contrário, esta força e jovialidade se transforma em sua própria antípoda, gerando vícios e mais vícios na alma e no corpo.

Assim sendo, se faz necessário evocar que apresentem alguns preceitos bíblicos sobre a moralidade sexual na juventude; e, sobre isso, se fazem duas coisas: primeiro, se evoca as virtudes que concernem aos moços; segundo, se evoca as virtudes que concernem as moças.

12. Primeiro, se evoca as virtudes que concernem aos moços; ora, as virtudes que concernem aos moços quanto a moralidade sexual são apresentadas em quatro preceitos, os quais são: primeiro, a retidão do caráter (cf. Ct 1.4e), que é definido como “unguento derramado” (cf. Ct 1.3b), que significa espiritualmente o exalar das virtudes.

Segundo, a piedade, que é definida como “ramalhete de mirras” (cf. Ct 1.13a), que significa espiritualmente uma vida em sacrifício agradável a Deus, que o Apóstolo emprega como fruto do Espírito (cf. Gl 5.22).

Terceiro, o falar honesto e sincero, pois a sinceridade e a verdade são elementos de preservação e conservação (cf. Pv 10.9, 11.3), que é definida como gotejar mirra (cf. Ct 5.13b), que significa a linguagem que reflete a graça de Deus, que o Apóstolo chama de falar temperado com sal (cf. Cl 4.6).

Quarto, o anelo por uma moça deve ser demonstrando antes de tudo na piedade em respeito a própria moça (cf. Ct 4.6, 5.10), para que os mandamentos de Deus sejam cumpridos no relacionamento, através do qual homem e mulher se unem em casamento para honrar a Deus em seus corpos e a partir do amor conjugal. Por isso, um jovem (ou a jovem) temente a Deus, e que professa a fé cristã, deve proceder de modo respeitoso e honroso, de acordo com os preceitos divinos para o casamento.

13. Segundo, se evoca as virtudes que concernem as moças; ora, as virtudes que concernem as moças quanto a moralidade sexual são apresentadas em quatro preceitos, os quais são: primeiro, agradabilidade e docilidade (cf. Ct 1.10, 2.14), que são características das mulheres que temem a Deus e não estão despersonalizadas, pois a mulher virtuosa é louvada por seu caráter (cf. Pv 31.10).

Segundo, simplicidade na verdade e beleza que emana do caráter (cf. Ct 4.1), pois, a vida na verdade em sinceridade com Deus faz com que a beleza da mulher virtuosa emane tal como o exalar dos bons perfumes (cf. Ct 4.10).

Terceiro, guardar-se para o casamento, pois o anelo do amor pelo esposo é consumado no casamento; por isso, a moça virtuosa deve compreender que este tipo de amor não deve ser despertado antes da hora (cf. Ct 3.5), isto é, antes dos benditos laços do casamento; pois, a maior virtude de uma moça cristã é demonstrada na castidade que honra a Deus e que procura seguir seus mandamentos, a fim de se guardar para o casamento sob a bênção e a proteção de Deus.

Quarto, o temor do Senhor, pois a mulher que tema ao Senhor será louvada (cf. Pv 31.30); assim, a moça que tema ao Senhor buscará se guardar neste temor e em função deste temor, já que o temor do Senhor é aborrecer o mal (cf. Pv 8.13a); e, quanto a uma moça, o significado de aborrecer o mal, também tem imbuído o evitar a contaminação pela imoralidade sexual.

14. Assim, nestas características ficam demonstradas apenas algumas características, dentre as muitas, que a Escritura prescreve sobre a moralidade sexual e sobre o jovem pode guardar puro o seu coração (cf. Sl 119.9); com isso, estes preceitos evocados são uma sumula de tudo quanto a Escritura ensina a este respeito; no entanto, não esgotam o assunto, que deve ser analisado com mais cuidado e com mais profundidade por quem a este tema se dedicar. E, se observa que, um rapaz ou uma moça que se dizem cristãos, devem necessariamente possuir estas características, principalmente em relação a questões envolvendo a moralidade sexual; pois, do contrário, não são cristãos, já que a imoralidade sexual, as práticas do “sexo livre”, são totalmente contrários a vontade de Deus para a sexualidade.

Capítulo IV: A fé verdadeira evidencia-se na vida correta.

15. Com isso, vossa dileção pode se aperceber do que concerne a respeito da moralidade sexual de acordo com a fé cristã; pois, a fé verdadeira evidencia-se na vida correta; e quanto a isso, principalmente em relação a moralidade sexual; assim sendo, os fiéis tem uma moralidade bíblica na qual se baseiam inclusive em questões envolvendo a sexualidade, já que pelos costumes dos povos bárbaros a sexualidade é apresentada envolta em muitas promiscuidades; e, mesmo nos povos antigos que aderiam a poligamia, mas viviam em certa ordem, se tem menos promiscuidades do que na doutrinação do “sexo livre” que, infelizmente, tem influenciado muitos que se dizem “cristãos” em tempos coevos.

16. Portanto, o que concerne a fé verdadeira também diz respeito a moralidade sexual gostem os hodiernos ou não; a perfeição da vontade revelada de Deus nas Escrituras não muda com o passar das épocas, mas permanece incólume, pois a lei do Senhor é perfeita (cf. Sl 19.7-9), e condiz com tudo quanto é necessário para ensinar, repreender, educar na justiça e ensinar os homens e as mulheres no caminho da salvação (cf. 2Tm 3.16-17), e da vida correta diante de Deus mesmo em questões sexuais, tal como o Apóstolo assevera: “Porque esta é a vontade de Deus, a vossa santificação: que vos abstenhais da prostituição, que cada um de vós saiba possuir o seu vaso em santificação e honra, não na paixão de concupiscência, como os gentios, que não conhecem a Deus” (1Ts 4.3-5).

17. Deste modo, estas descrições ora evocadas são suficientes para uma compreensão geral a respeito da moralidade sexual quanto ao que está nas Sagradas Escrituras; e, saiba vossa dileção bem, e assim também o ensine de todas as formas, de todos os modos e em todas as ocasiões, que aqueles que se dizem cristãos mas não seguem os preceitos bíblicos quanto a moralidade sexual, enganam-se a si mesmos e estão em caminho de perdição, pois não conhecem a Deus, já que vituperam a lei de Deus e blasfemam da moral sexual estabelecida pelo Criador, que é bendito eternamente.

18. Por isso, certo de vossa compreensão, e de vossa amizade, bem como os rogos das bênçãos de Deus, e também pedindo que vossa dileção abstenha-me de qualquer critica mais aguda quanto a qualidade deste escrito, termino estas palavras lembrando que se achar por bem aprofundar este assunto, ou indicar para outrem que assim o faça - ou a qualquer um que ler este escrito -, que poderá encontrar nos escritos de outros teólogos reflexões mais profundas, principalmente nos seguintes escritos de Agostinho a respeito deste assunto:

(i) “De Bono Conjugali” (Sobre os Bens do Matrimônio).

(ii) “De Sancta Virginitate” (Sobre a Santa Virgindade).

(iii) “De Continentia” (Sobre a Continência).

(iv) “De Nuptiis et Concupiscentia” (Sobre as Núpcias e a Concupiscência).

(v) “De Conjugiis Adulterinis” (Sobre os Matrimônios Adulterinos).

E, todos estes escritos, senão quase todos, estão disponíveis em língua portuguesa, o que facilita o acesso e a leitura a um público mais amplo.

No mais, que o bondoso Deus a conduza nesta compreensão para Sua glória e para a edificação de vossa fé e a de todos os fiéis no que diz respeito a este tema tão difícil.

19. E termina aqui esta breve explicação a respeito da moralidade sexual. Bendito seja Deus por todas as coisas. Amém. 


23/11/2024

Breve Explicação sobre o Argumento de Autoridade

1. A complexidade da explicação do argumento de autoridade, requer muitas e muitas análises, para exemplificar o que concerne ao mesmo tanto na filosofia quanto na teologia, principalmente quanto a teologia; no entanto, para a compreensão do que concerne a este argumento, se faz necessário pelo menos uma breve explicação para abalizar este assunto, a fim de que este argumento seja entendido em sua natureza, tarefa e propósito; pois, geralmente ou se descuida quanto ao significado ou se deixa de lado este argumento sem realmente compreender o que concerne a sua função em relação ao conhecimento. 

2. Por isso, fundamentalmente se afirma que o argumento de autoridade é o argumento que concerne a doutrina sagrada; diferentemente de no lume da luz interior, na qual o argumento de autoridade é o argumento mais fraco (cf. STh Ia, q. 1, a. 8, arg. 2), no lume luz superior, o argumento de autoridade é o argumento mais forte e o mais preciso já que seus princípios são obtidos por divina revelação (cf. STh Ia, q. 1, a. 8, ad. 2); assim, o argumento de autoridade é fraco e débil na filosofia, mas na teologia é o argumento mais forte e o mais importante. Pois, na filosofia, não se convém apoiar na autoridade (razão) humana, tal como Tomás de Aquino assevera, pois a filosofia não consiste em saber o que pensaram os homens, mas no que consiste realmente a verdade (cf. In De Cael. Exp., I, lect. 22); e o conhecimento da verdade, racionalmente advém da reflexão sobre a realidade. 

3. Portanto, na teologia convém o argumento de autoridade, por onde se inicia e onde termina a reflexão teológica, diferentemente da filosofia e da intenção do filósofo; pois, Agostinho afirma que o modo de proceder na elucubração sobre o que consiste a fé, a saber, a Trindade, se dá de dois modos: por autoridade e pela razão (cf. De Trin., I, cap. 2, n. 4). Ora, sendo a confissão sobre a Trindade o vértice sobre o qual consiste a fé, como dissera Tomás (cf. De Rat. Fid., cap. 1), então, convém que em tudo quanto diz respeito a fé se proceda de modo semelhante; logo, se tem que o argumento de autoridade é o mais adequado e o único e suficiente em ordem de eminência em relação a doutrina sagrada; assim, tendo se estabelecido o argumento de autoridade na teologia, se pode prosseguir e utilizar o argumento pela razão (ad rationem). 

4. Ora, o argumento de autoridade na teologia se dá de dois modos: primeiro, pela autoridade da Sagrada Escritura; segundo, pela autoridade dos santos doutores. Ora, o primeiro é o mais importante e regula o segundo; donde, a Escritura, a revelação dada de forma permanente, é a autoridade no que concerne as coisas divinas; além disso, se tem a autoridade dos santos doutores da Igreja que buscaram interpretar a Escritura de forma correta, e no que estão em fidelidade a Escritura possuem autoridade consultiva; pois, a Escritura possui a autoridade normativa. Ou dito entre outros termos, se tem em relação a teologia duas autoridades: a Escritura e a Tradição; a Escritura, a norma que regula; a Tradição, a norma que é regulada; a Escritura, a autoridade normativa; a Tradição, a autoridade consultiva. Além disso, se afirma que a Tradição é autoridade, pois provém da vida eclesial, da Igreja, que neste quesito é dotada de autoridade infalível por Deus para a interpretação da Sagrada Escritura. 

5. E em todos os tempos, a reflexão teológica que realmente é digna deste nome, fora feita deste modo; aliás, este é o modo como se desenvolve a reflexão teológica: primeiro, na exposição da Escritura; segundo, pela explicação racional que emerge dos ensinamentos bíblicos. E, isto se prova, por exemplo, com relação a doutrina da Trindade. Agostinho burilou o que concerne a doutrina da Santíssima Trindade, a partir da autoridade da Escritura no De Trinitate; depois de Agostinho, Boécio tomou os ensinamentos do bispo de Hipona, e os burilara quanto ao sentido racional em sua obra homônima, o opúsculo De Trinitate; assim, pois, a reflexão sobre a Trindade se estabeleceu de dois modos: primeiro, pelos dois modos de autoridade; segundo, pela razão. E isto foi feito nos mais variados tópicos da ciência sagrada. Pois a autoridade consultiva sempre é burilada por outra autoridade consultiva, e isto sempre em ordem a autoridade normativa. 

Outrossim, é que na contextura da teologia sagrada, o que se desenvolve a partir do argumento pela razão só tem valor derivado, posto que os mistérios sagrados não são açambarcados totalmente pela reta razão; ou dito em outros termos, não se resumem a simples reflexão racional; embora esta tenha algum valor e alguma utilidade, não é o mais importante no que concerne aos mistérios da Sagrada Escritura. 

6. Certamente estas palavras são suficientes para uma breve explicação do que concerne ao argumento de autoridade, principalmente para distingui-lo em sua utilização tanto na teologia quanto na filosofia. 

θεῷ χάρις


20/11/2024

Comentário a Epístola V de Pseudo-Dionísio

Prefácio.

 

Após as quatro primeiras epístolas direcionadas a Gaio, se chega a epístola V, direcionada a Doroteu; embora mude-se o destinatário, o assunto é o mesmo que o da epístola I, que também versa sobre um aspecto da obra De Mystica Theologia; a diferença é que, enquanto na epístola I se fala sobre a possibilidade do conhecimento a respeito de Deus, nesta epístola se fala sobre a concreção deste conhecimento no fiel a partir da caligine divina; pois, o verdadeiro conhecimento de Deus, tal como fora dito anteriormente, produz nos homens dois efeitos; etc.

Portanto, o que concerne a caligine divina, tal como analisado noutras epístolas está em ordem a obra De Mystica Theologia; pois, duas coisas são afirmadas a título de introdução sobre esta obra: primeiro, o que concerne o conhecimento a respeito de Deus; segundo, o que concerne ao modo de alcançar este conhecimento.

E estes dois aspectos estão inter-ligados de acordo com a obra mencionada; no entanto, Pseudo-Dionísio os trabalha nas epístolas I, III e V; o primeiro aspecto nas epístolas I e III; o segundo aspecto na epístola V.

Mas, como se pode constatar, os aspectos estão imbuídos nestas epístolas de maneira conjunta; portanto, o que versa uma epístola também versa as outras duas, e vice-versa; pois, a diferença está no modo como se apresentou a indagação a Pseudo-Dionísio, e, evidentemente, daí segue sua forma de responder de modo diverso.

Deste modo, se constata que estas epístolas que versam sobre os temas concernentes a teologia mística, são um modo de introdução a esta icônica e enigmática obra da história da teologia; a fonte de muita coisa boa que surgiu depois, mas também donde emanaram muitos princípios errôneos que corroeram tanto o catolicismo quanto o protestantismo.

As várias reprimendas de Lutero quanto a teologia dionísica (cf. WA 6, 562; etc.), principalmente quanto a teologia mística (cf. WA 39/1, 389s), se baseiam justamente contra a linha de pensamento errado que emergiu desta obra (por exemplo, os tipos errôneos de misticismo que desfiguraram a cristandade nos sécs. XIV e XV, etc.); mesmo que o próprio Lutero não tenha se apercebido da raiz deste erro, ele pelo menos se apercebeu dos problemas que emergiram desta obra na baixa escolástica (os problemas do “dionisianismo afetivo”), e contra os mesmos se vociferou de forma contundente e muitas vezes de maneira correta.

Aliás, isto fora algo que muito antes de Lutero houvera sido percebido por Alberto Magno, mas que infelizmente poucos ou quase ninguém dera a devida atenção – com a exceção de seus alunos, principalmente Tomás de Aquino. Pois, fora Alberto Magno quem se apercebera de forma cabal e cirúrgica dos problemas terríveis do “dionisianismo afetivo”.

Portanto, ao se adentrar a explicação destas epístolas, aquilo que fora afirmado de antemão, que se procuraria o equilíbrio entre as duas linhas de interpretação do Corpus Dionysiacum, se mostra mais evidente; conquanto, em relação aos problemas que emergem da obra De Mystica Theologia, se deva não propriamente equilibrar estes aspectos, mas se deve seguir no “dionisianismo intelectual”, para se evitar os erros e os desvios terríveis que a afetividade traz para a reflexão teológica e para a existência eclesial, o que os sécs. XIV e XV bem como a cristandade hodierna (catolicismo e protestantismo) demonstram de maneira inconcussa.

Assim, ao se concluir o comentário as cinco primeiras epístolas, se estabelece a base introdutória do Corpus Dionysiacum, ao mesmo tempo em que se apresenta uma série de reflexões e explicações que ponderam sobre vários problemas teológicos fundamentais que estão em ordem a duas das obras de Pseudo-Dionísio (cf. DN e MT), mas que também servem para abalizar muitos problemas teológicos fundamentais já que nestas epístolas estão imbuídos implicitamente muitos tópicos que concernem aos artigos da fé.

Soli Deo Gloria!

In Nomine Iesus!

19 de novembro de 2024.


Texto de Pseudo-Dionísio (Epist. V)[1].

A caligine divina é a “luz inacessível” na qual, diz-se, “Deus habita” (cf. Êx 20.21; 1Tm 6.16). E se a excelência da sua claridade a torna invisível, e o excesso da efusão da sua luz mais que substancial a faz inacessível, é, todavia, nela que nasce quem é digno de conhecer e de contemplar Deus. É por este ‘não ver nem conhecer’ que ele se eleva verdadeiramente para além da vista e do conhecimento. Sabendo que está para além do sensível e do inteligível, ele diz com o Profeta: “Maravilhoso é para mim o teu conhecimento, tão elevado, que eu não posso atingi-lo” (Sl 139.6) [cf. DN II, 1; EH II, II.7; IV, II].

Foi assim que o divino Paulo conheceu Deus, diz-se. Ele soube que Deus está para além de todo o entendimento e de todo o conhecimento. Por esta razão é que ele diz que os seus “caminhos são impenetráveis” e “insondáveis os seus decretos” (cf. Rm 11.33), que “os seus dons são inexprimíveis” (cf. 2Co 9.5), e que a “sua paz ultrapassa toda a inteligência” (cf. Fp 4.7). Pois ele encontrou quem está para além de todas as coisas, e soube, de uma maneira que está para além de todo entendimento, que a causa da existência de todas as coisas está para além de todas as coisas.


A. Proêmio.

1. “Nuvens e obscuridade estão ao redor dele” (Sl 97.2a); ora, estas palavras do salmista foram engendradas teologicamente nesta epístola; pois, de modo geral, três coisas são afirmadas a respeito de Deus: primeiro, de Deus em si mesmo, isto é, de Seu Ser. “E disse Deus a Moisés: EU SOU O QUE SOU” (Êx 3.14a). “Porque o Senhor é Deus grande e Rei grande acima de todos os deuses” (Sl 95.3). “Vive o Senhor, na verdade, no juízo e na justiça; e nele se bendirão as nações e nele se gloriará” (Jr 4.2).

Segundo, das obras de Deus, ou seja, das coisas que dEle emanam. “Tu só és Senhor, tu fizeste o céu, o céu dos céus e todo o seu exército, a terra e tudo quanto nela há, os mares e tudo quanto neles há; e tu os guardas em vida a todos, e o exército dos céus te adora” (Ne 9.6). “Digno és, Senhor, de receber glória, e honra, e poder, porque tu criaste todas as coisas, e por tua vontade são e foram criadas” (Ap 4.11).

Terceiro, o caminho para Deus, a saber, o Senhor Jesus Cristo. “Disse-lhe Jesus: Eu sou o caminho, e a verdade, e a vida. Ninguém vem ao Pai senão por mim” (Jo 14.6). “Porque há um só Deus e um só mediador entre Deus e os homens, Jesus Cristo, homem” (1Tm 2.5).

2. Portanto, a primeira maneira de conhecer algo de Deus é a partir das coisas que dEle emanam, já que nesta vida o fiel não o pode ver em essência, mas, nesta vida, como efeito da graça, Ele é conhecido de modo geral “a partir das criaturas, de acordo com a via da causalidade, a da excelência e a da remoção” (STh Ia, q. 13, a. 1, co.); logo, se vê a Deus, por analogia, nas coisas criadas (cf. Sb 13.5); por isso, se afirma que das coisas que dEle emanam, se pode conhecer algo sobre Ele; no entanto, das coisas que dEle emanam não somente se diz sobre as coisas criadas, mas também sobre o que nEle está envolto, isto é, sobre o que emana dEle em Sua habitação e de Sua presença (cf. Êx 40.34-35; 1Rs 8.12; 1Tm 6.16).

3. Por isso, do preceito do salmista se diz que em Deus se tem envolto nuvens e obscuridade ou escuridade; ou seja, em Deus se tem a nuvem de Sua glória (cf. 2Cr 5.14), e a caligine (cf. Êx 20.21b); ora, a nuvem representa a transcendência de Seu Ser, impossível de ser contemplado tal como é, e a caligine representa o que dEle pode ser conhecido e entendido, através da via da negação (cf. MT, I, § 1).

Ora, isto é o que concerne a esta epístola, posto que versa sobre a caligine divina, na qual, se demonstra que Deus está “para além da vista e do conhecimento”; e isto tanto evidencia o que concerne a caligine, quanto sobre o modo como Deus pode ser conhecido na caligine; por isso, nesta caligine e através desta caligine, é “que nasce quem é digno de conhecer e de contemplar Deus”; logo, etc. 


B. Comentário.

1. Após as quatro epístolas a Gaio, se adentra a epístola V, para Doroteu[2]; embora, mude-se o destinatário, e a ordem dos assuntos mude, nesta epístola continua-se diretamente a abordar problemas relacionados as obras que também foram motivo de dúvida a Gaio; todavia, a dúvida de Doroteu se refere a designação que Pseudo-Dionísio faz sobre a caligine divina no cap. 1 de “De Mystica Theologia”; e, Alberto assevera que esta caligine é aquela na qual é dito que Deus é e na qual é dito que Ele é visto[3], isto é, é a descrição pela qual se fala sobre Deus e na qual Deus habita (cf. Êx 20.21b; 1Rs 8.12; 1Tm 6.16).

2. Assim, a designação dionísica de “caligine divina”, pressupõem uma série de aspectos do que se constitui o modo de se conhecer as coisas divinas, tal como Pseudo-Dionísio delineara no capítulo inicial da obra “De Mystica Theologia”. E, sobre isso, Pseudo-Dionísio estabelece sete aspectos: primeiro, estabelece a questão; segundo, evoca a sobre excelência da luz na qual Deus habita; terceiro, estabelece o pressuposto da não-visão desta luz como parte da compreensão sobre esta luz; quarto, evoca a pressuposição de que Deus está para além do sensível e do inteligível; quinto, evoca o exemplo dessa pressuposição a partir da vida do Apóstolo; sexto, apresenta os pressupostos teológicos que o Apóstolo estabelecera a partir do modo como conhecera Deus; sétimo, estabelece que o conhecer Deus que o Apóstolo demonstra é fruto de uma experiência que ele tivera.

3. Primeiro, estabelece a questão, onde diz: “A caligine divina é a ‘luz inacessível’ na qual, diz-se, ‘Deus habita’ (cf. Êx 20.21; 1Tm 6.16)” (cf. MT I, 3); ora, o primeiro aspecto, é referente a designação da “bruma divina”, ou mais corretamente, a caligine divina[4]; pois, a caligine refere-se a luz inacessível na qual o próprio Deus habita, a qual é descrita na Escritura de dois modos: primeiro, um modo negativo, quando se diz: “Moisés, porém, se chegou à escuridade, onde Deus estava” (Êx 20.21b); segundo, um modo afirmativo, quando o Apóstolo afirma: “aquele que tem, ele só, a imortalidade e habita na luz inacessível” (1Tm 6.16a).

Logo, Pseudo-Dionísio evoca dois aspectos sobre a compreensão a respeito do conhecimento sobre Deus, a saber: que Ele habita na caligine, isto é, habita de maneira que o ser humano por si não consegue se achegar a Ele, e habita na luz inacessível, isto é, numa luz que nenhuma luz exterior, inferior ou interior consegue alcançar e/ou compreender.

4. Por isso, a designação da caligine divina, demonstra que Deus não é entendível nem pelas artes mecânicas, nem pelo conhecimento sensitivo e nem pelo conhecimento filosófico; embora, por estes se possa saber algo sobre Deus do ponto de vista geral, isto é, que é o Ser Supremo e o Primeiro Princípio (cf. Sl 19.1; Rm 1.19-20); todavia, por meio destas luzes, não se consegue compreender a Deus e nem se adentrar a caligine divina, a qual só acessível através da graça e pela Sagrada Escritura.

Portanto, apenas o hábito da graça, permite ao fiel contemplar Deus nesta vida, antevendo a glória aurifica da eternidade; pois, enquanto nesta vida a caligine divina se oculta, e só se pode conhecê-Lo através de um enigma por espelho (cf. 1Co 13.12a), na eternidade, se adentrará a própria habitação de Deus, pois que, “então, veremos face a face; agora, conheço em parte, mas, então, conhecerei como também sou conhecido” (1Co 13.12b). A proposição teológica da caligine divina evoca a distinção entre o contemplar a Deus nesta vida e a contemplação de Deus na vida eterna.

5. Segundo, evoca a sobre-excelência da luz na qual Deus habita, onde diz: “E se a excelência da sua claridade a torna invisível, e o excesso da efusão da sua luz mais que substancial a faz inacessível, é todavia nela que nasce quem é digno de conhecer e de contemplar Deus”; ora, após ter evocado a questão sobre a caligine divina, passa a considerar a sobre-excelência da luz na qual Deus habita.

E, sobre isso, faz três coisas: primeiro, demonstra a natureza desta luz, onde diz: “E se a excelência de sua claridade a torna invisível”; isto é, esta luz é tão excelsa, que em sua natureza como luz, ou seja, em “sua claridade”, a mesma se torna invisível, isto é, está além de toda visão e compreensão humana.

Segundo, demonstra os efeitos da efusão desta luz, onde diz: “e o excesso da efusão da sua luz mais que substancial a faz inacessível”, isto é, mesmo que esta luz seja espargida em excesso de efusão, por causa de sua natureza, “da sua luz mais que substancial”, isto é, de sua luz que se sobreleva a toda substância e substanciação humana, o que, por si, “a torna invisível”, ou seja, incompreensível, a torna além de qualquer abstração sensível ou de qualquer conhecimento intelectual.

Terceiro, evoca aqueles que são nascidos a partir desta luz, onde diz: “é todavia nela que nasce quem é digno de conhecer e de contemplar Deus”, isto é, é nesta luz e a partir desta luz, que os homens são nascidos de novo para poderem contemplar a Deus; e, Cristo, é quem ilumina os homens para os tornar dignos de conhecerem e contemplarem a Deus (cf. Jo 8.12); donde, aqueles que são por esta luz iluminados, mediante a graça, podem compreender que esta luz que receberam é uma luz maravilhosa (cf. 1Pe 2.9). Somente aqueles que são por Deus iluminados podem compreender algo sobre Seu ser. Portanto, a caligine se torna acessível apenas aos que receberam a graça da iluminação superior.

6. Pois, conquanto a caligine divina seja inacessível, a mesma se torna compreensível quando há esta iluminação; por isso, o Apóstolo orara: “tendo iluminados os olhos do vosso entendimento, para que saibais qual seja a esperança da sua vocação e quais as riquezas da glória da sua herança nos santos” (Ef 1.18). Logo, Deus ilumina aqueles que recebem Sua graça, para que possam compreender algo sobre caligine, e assim, se tornem dignos de conhecê-Lo e de contemplá-Lo, ainda que, como dissera o Apóstolo, o seja em enigma por espelho (cf. 1Co 13.12a); portanto, a sobre-excelência desta luz inacessível, é tão alta que nenhum homem a pode atingir, isto é, nenhum homem a pode contemplar por si mesmo; por esta razão, a Escritura afirma: “Deus nunca foi visto por alguém” (Jo 1.18a).

7. Terceiro, estabelece o pressuposto da não-visão desta luz como parte da compreensão sobre esta luz, onde diz: “É por este ‘não ver nem conhecer’ que ele se eleva verdadeiramente para além da vista e do conhecimento”; ora, se esta luz é inacessível, então, somente a não-compreensão da mesma a torna realmente compreendida; pois, somente quem é de Deus nascido pode contemplar algo sobre esta luz, ainda que não a possa ver totalmente. Portanto, somente assim se pode conhecer algo e entender algo sobre a caligine divina; pois, “é por este ‘não ver nem conhecer’”, isto é, pela compreensão de que esta luz não é vista e nem entendida que se pode conhecer algo a respeito da mesma, já que a não-compreensão de algo que é necessário se compreender, pois diz respeito a fim último do ser humano, ou leva o ser humano a blasfêmia, tal como nos infiéis (cf. Sl 53.1-5), ou então, leva os homens ao desespero, isto é, a humilhação diante de Deus (cf. Zc 1.3); logo, em meio a este desespero os homens correm a Deus, e este desespero se torna, tal como dissera Lutero, em “desesperatio fiducialis” (desespero consolado).

Por isso, o pressuposto da não-visão desta luz, é a base para a compreensão sobre esta luz; pois, aquele que reconhece que não a pode conhecer, é por Deus ajudado a entender esta luz, já que o próprio Deus outorga, como dádiva imerecida, como dádiva graciosa, o que é necessária para a compreensão desta luz, tornando a iluminação para a compreensão desta luz um dom perfeito; e, sobre isso, diz a Escritura: “Toda boa dádiva e todo dom perfeito vêm do alto, descendo do Pai das luzes, em quem não há mudança, nem sombra de variação” (Tg 1.17). Portanto, é justamente por não “ver e nem conhecer” esta luz, que o fiel “se eleva verdadeiramente para além da vista e do conhecimento”, isto é, para onde esta luz habita, ou seja, onde Deus realmente se encontra.

8. Quarto, evoca a pressuposição de que Deus está para além do sensível e do inteligível, onde diz: “Sabendo que está para além do sensível e do inteligível, ele diz com o Profeta: ‘Maravilhoso é para mim o teu conhecimento, tão elevado, que eu não posso atingi-lo’ (Sl 139.6)”; ora, se Deus somente é contemplado quando se eleva para além da vida e do conhecimento, então, Deus está para além do sensível e do inteligível; e, Pseudo-Dionísio justamente evoca esta pressuposição; pois, ao se compreender e perceber que Deus está para além do sensível e do inteligível, isto é, está além de toda forma de compreensão puramente natural, o que resta é romper em efusivo louvor, pois, assim se entende que os mistérios divinos devem antes ser adorados do que estudados, como já acertadamente Melanchthon afirmara: “Tanto mais correto que tenhamos adorado os mistérios da divindade, do que que os tenhamos investigado[5]; mas isso não significa que não devam ser estudados, mas que o estudo sobre os mistérios da divindade é um ato doxológico, senão engendra-se no “dionisianismo afetivo” (a qual fora propugnada a partir do Corpus Dionysiacum, por muitos comentaristas, e de maneira cabal por Thomas Gallus).

Portanto, ao se compreender que Deus está para além do sensível e do inteligível, o fiel há de romper em efusivo louvor tal como o salmista afirmara e tal como Pseudo-Dionísio também evoca, a saber: “Maravilhoso é para mim o teu conhecimento, tão elevado, que eu não posso atingi-lo (Sl 139.6)”.

Logo, esta atitude do salmista deve ser a mesma atitude daquele que ao contemplar a Deus, entende que Ele está para além do sensível, isto é, está além de todo conhecimento por experiência, e está além do inteligível, isto é, está além de todo conhecimento intelectual; o que faz com que a alma do fiel, pelo efeito da graça, rompa em efusivo louvor e adoração ante a majestade de Deus (cf. Mt 11.25).

9. Quinto, evoca do exemplo dessa pressuposição a partir da vida do Apóstolo, onde diz: “Foi assim que o divino Paulo conheceu Deus, diz-se. Ele soube que Deus está para além de todo o entendimento e de todo o conhecimento”; ora, depois de evocar a pressuposição de que Deus está para além do sensível e do inteligível, e que somente Deus pode dar o conhecimento de Si, passa a evocar um exemplo para confirmar esta pressuposição, a saber, o exemplo a partir da vida do Apóstolo. Pois, o Apóstolo conhecera a Deus desta forma, a saber: “Ele soube que Deus está além de todo o entendimento e de todo o conhecimento”. Deste modo, a vida do Apóstolo é um exemplo desta pressuposição, a qual, permeia toda a teologia e toda elucubração sobre o conhecimento a respeito de Deus. Ora, o Apóstolo conheceu Deus deste modo; e todo aquele que, pelo efeito da graça, se torna digno do conhecimento de Deus, também o conhece desse modo.

10. Sexto, apresenta os pressupostos teológicos que o Apóstolo estabelecera a partir do modo como conhecera a Deus, onde diz: “Por esta razão é que ele diz que os seus ‘caminhos são impenetráveis’ e ‘insondáveis os seus decretos’ (cf. Rm 11.33), que ‘os seus dons são inexprimíveis’ (cf. 2Co 9.5), e que a ‘sua paz ultrapassa toda a inteligência’ (cf. Fp 4.7)”; ora, tendo o Apóstolo conhecido a Deus do modo como fora anteriormente descrito, ao conhecê-Lo, o Apóstolo rompera em efusivo louvor e adoração; e, Pseudo-Dionísio apresenta o que concerne ao modo como o Apóstolo conhecera Deus, e como exprimira este conhecimento que tivera; e, “por esta razão”, isto é, por causa do modo como conhecera Deus, “é que ele diz”, isto é, que o Apóstolo faz declarações efusivas, as quais, constituem o cerne de sua teologia, e o âmago da teologia neotestamentária.

11. E, sobre isso, evoca três aspectos: primeiro, sobre incompreensibilidade da sabedoria divina, onde evoca a sentença do Apóstolo: “os seus ‘caminhos são impenetráveis’ e ‘insondáveis os seus decretos’”; ora, esta declaração do Apóstolo provém de uma singular passagem da epístola aos Romanos, na qual afirma: “Ó profundidade das riquezas, tanto da sabedoria, como da ciência de Deus! Quão insondáveis são os seus juízos, e quão inescrutáveis, os seus caminhos!” (Rm 11.33). Logo, o Apóstolo, em seu conhecimento de Deus, pode contemplar e experienciar que Deus, em seus caminhos e decretos, isto é, em suas obras e ações, está além de toda compreensão; este princípio retoma a declaração que está no profeta: “Porque os meus pensamentos não são os vossos pensamentos, nem os vossos caminhos, os meus caminhos, diz o Senhor. Porque, assim como os céus são mais altos do que a terra, assim são os meus caminhos mais altos do que os vossos caminhos, e os meus pensamentos, mais altos do que os vossos pensamentos” (Is 55.8-9). Ora, deste modo se afirma que Deus é insondável e inescrutável.

Segundo, que as dádivas divinas são inexprimíveis, onde evoca a sentença do Apóstolo: “os seus dons são inexprimíveis”; ora, as dádivas divinas, entre elas a maior, a saber, a salvação, são inexpressáveis, isto é, estão além de qualquer definição e compreensão, donde Deus, em suas dádivas, também ser reconhecido como Super-Teárquico e Super-Bonárquico. Ora, para o Apóstolo as dádivas divinas são inexprimíveis, e isto por dois motivos: primeiro, pela fonte donde provêm, a saber: dAquele que é a fonte de toda dádiva, e que está acima de toda definição; segundo, porque as dádivas em si mesma são efeito da graça, isto é, são favores imerecidos; logo, são inexprimíveis.

Terceiro, que a paz que provêm do conhecimento de Deus está acima de toda inteligência, onde evoca a sentença do Apóstolo: “a sua paz ultrapassa toda inteligência”; por isso, a paz, sendo efeito da graça (cf. Ef 2.14), está para além de toda inteligência e de todo entendimento; pois, sendo efeito da graça, a paz é sem medida e sem limites (cf. Gl 5.22-23); tal como diz o salmista: “Mas os mansos herdarão a terra e se deleitarão na abundância de paz” (Sl 37.11). Por isso, esta paz ultrapassa toda inteligência, por causa de sua fonte e de seus efeitos no fiel, a saber, guardar a mente e o coração, tal como diz o Apóstolo: “E a paz de Deus, que excede todo o entendimento, guardará os vossos corações e os vossos sentimentos em Cristo Jesus” (Fp 4.7).

12. Ora, o Apóstolo propugna estes aspectos, e outros, a partir do modo como conhecera Deus; logo, são expressões que evocam os efeitos da graça que recebera, e a qual usufruíra. Portanto, descrevem e demonstram o que é produzido no homem quando este conhece a Deus verdadeiramente.

13. Sétimo, estabelece que o conhecer Deus que o Apóstolo demonstra é fruto de uma experiência que ele tivera, onde diz: “Pois ele encontrou quem está para além de todas as coisas, e soube, de uma maneira que está para além de todo entendimento, que a causa da existência de todas as coisas está para além de todas as coisas”; ora, a experiência que o Apóstolo tivera, de quando conhecera Deus verdadeiramente, o mostrou quatro coisas: primeiro, que ele encontrou quem está acima de todas as coisas; por isso, se diz: “Pois ele encontrou quem está para além de todas as coisas”; isto é, o Apóstolo conheceu o Criador de todas as coisas, Aquele que está além e acima de todas as coisas.

Segundo, que o Apóstolo realmente obteve o conhecimento a respeito de Deus pela graça, a partir de quando, ele verdadeiramente soube quem Deus é; por isso, se diz: “e soube”.

Terceiro, a experiência que o Apóstolo tivera o mostrou, e ele soube, de um modo que está para além do entendimento, isto é, de maneira gloriosa e efusiva; por isso, se diz: “de uma maneira que está para além de todo entendimento”.

Quarto, a experiência que o Apóstolo tivera o mostrou a causa de todas as coisas, pois, somente a causa de todas as coisas está para além de todas as coisas; por isso, se diz: “que a causa da existência de todas as coisas está para além de todas as coisas”.

14. A experiência do Apóstolo o mostrara estas coisas, e ele, por isso, pode irromper em efusivo louvor e adoração a Deus, de modo tal que, pode exclamar estas verdades de maneira límpida e cristalina (cf. Rm 11.36). Ou, como o próprio Pseudo-Dionísio afirma no início da obra “De Caelesti Hierarchia”: “Mas ainda, toda manifestação luminosa que recebemos e que procede da bondade do Pai, nos atrai e nos conduz ao alto com seu poder unificante, nos faz voltar a unidade e a simplicidade divinizante do Pai que nos reúne” (CH I, § 1). Ora, toda iluminação, ou “manifestação luminosa”, é o Pai, em sua imensa bondade, trazendo os homens de volta a Si, tal como fizera com o Apóstolo, na experiência que este tivera com a luz divina no caminho de Damasco (cf. At 9.3, 26.12-13); etc.

15. Assim, Pseudo-Dionísio soluciona a dúvida de Doroteu no que concerne a proposição do cap. 1 da obra “De Mystica Theologia”; e, com isso, não somente esclarece a pressuposição sobre a caligine divina, mas ao mesmo tempo em que faz isso, também efetua uma “introdução” a obra “De Mystica Theologia”. A epístola V, é uma introdução mais simples às profundezas singulares desta obra, as quais, saltam aos olhos e tornam-se não somente em elemento de conhecimento para os fiéis e sinceros na fé, mas descortina os mistérios da teologia e do verdadeiro modo de conhecer a Deus, “que é bendito eternamente” (Rm 1.25), pois, é o Deus incomparável e inigualável, tal como o salmista afirma: “Que deus é tão grande como o nosso Deus?” (Sl 77.13), o qual também foi contemplado pelo Príncipe dos Profetas: “No ano em que morreu o rei Uzias, eu vi ao Senhor assentado sobre um alto e sublime trono, etc.” (Is 6.1-3).

Portanto, a partir destes aspectos, se entende a proposição sobre a caligine divina, do que concerne ao conhecimento apofático, o qual, por vez demonstra que o conhecimento que se pode ter de Deus, não somente pode ser explicado mesmo de forma imperfeita e fragmentária, mas este conhecimento é, ao mesmo tempo, uma experiência com o poder de Deus, tal como Moisés ao adentrar a caligine divina.

16. A teologia não somente tenta explicar algo sobre Deus, mas é fundamentalmente experiência com Deus, que se torna em expressão de explicação racional fragmentária e imperfeita; a experiência não impugna a explicação, mas é a base donde surge a explicação; e quanto maior e mais efusiva for a experiência, melhor e mais admirável deve ser a explicação.

Pois, a experiência não tolhe a explicação, antes a dignifica como algo verdadeiro e que fora realmente experienciado; e a explicação não impugna a experiência, mas não deixa que a afetividade se torne o condutor do ser, mas orienta a mesma sob a reta razão.

E a experiência ou afetividade que não se orienta intelectualmente é vã e não passa de emocionalismo estéril e imbecilizante; pois, experiência ou afetividade que obnubila a inteligência sempre é movimento demoníaco, já que o que é operado pelo Diabo – no caso aqui a falsa afetividade -, “impede o uso da razão[6].

E o que fora dito basta quanto a compreensão sobre esta epístola.

 

C. Dúbias.

Em relação as pressuposições estabelecidas ao se explicar a epístola V de Pseudo-Dionísio, surgiram três dúbias:

Primeiro, se a treva divina consiste na luz inacessível na qual Deus habita.

Segundo, se Deus, que habita numa luz inacessível, pode ser contemplado.

Terceiro, se a afetividade deve orientar a teologia.

 

<Dúbia I>

Acerca da primeira, procede-se assim: se a treva divina consiste na luz inacessível na qual Deus habita.

E parece que não.

I. [Argumentos].

1. A treva não é luz, e vice-versa; além disso, se compreende que a propriedade inerente a treva é ser ausência de luz; logo, a treva divina não consiste na luz na qual Deus habita.

2. Ademais, a Escritura diz: “Deus é luz, e não há nele treva nenhuma” (1Jo 1.5); logo, se Deus é luz, evidentemente, nEle não há treva; então, a treva em Deus não existe; portanto, a treva divina não consiste na luz na qual Deus habita.

3. Ademais, o fim último do homem é contemplar a Deus, que a Escritura chama de herança dos fiéis; e a herança dos fiéis é na luz (cf. Cl 1.12); ora, como a herança dos fiéis é contemplar a Deus, então a herança dos fiéis é na luz, junto de Deus; portanto, a treva não consiste na luz na qual Deus habita, pois, os fiéis ao contemplá-Lo, contemplá-Lo-ão na luz; logo, etc.

II. [Em Contrário].

1. Mas, em contrário, diz a Escritura: “O SENHOR disse que habitaria nas trevas” (1Rs 8.12); logo, Deus habita nas trevas; portanto, a treva divina diz respeito a luz inacessível na qual Deus habita.

III. [Solução].

1. A descrição da treva divina, ou caligine divina, diz respeito não a essência de Deus, que sendo luz não tem treva, mas à visão que os homens tem de Deus; pois, se compreende que muita luz, ao invés de iluminar, acaba por obscurecer; ora, se se olhar diretamente para o sol, ao invés de se ver sua luz, os olhos são envoltos em trevas; portanto, ao se olhar para Deus, que habita numa luz inacessível, infinitamente superior em luminosidade a luz do sol, então, o intelecto acaba envolto em escuridade; e é justamente isso a que se refere o texto sagrado ao se referir a habitação de Deus nas trevas, não propriamente as trevas em si, isto é, a ausência de luz, mas a caligine, já que os homens per se não o podem contemplar sem serem envoltos na escuridade, tal como ocorrera com Moisés (cf. Êx 20.21b).

2. Portanto, por Deus habitar na luz inacessível, os homens, ao contemplá-Lo, são envoltos no mesmo que ocorre ao olharem diretamente para o sol; e, como Deus habita nesta luz inacessível, então, o hábito que concerne a sua compreensão, necessariamente está ligado ao modo de chegar a esta luz, que teologicamente fora chamado de treva ou caligine divina; portanto, Deus que habita na luz inacessível, é conhecido pelos homens como efeito da graça (cf. Jo 1.16), quando estes, pela própria graça, são tornados idôneos para se achegar a sua escuridade (cf. Cl 1.12), a qual está além de todo sensível e além de todo inteligível (cf. MT, I, § 1), e que somente pela graça conseguem se aproximar e adentrar a esta caligine para melhor conhecer a Deus do modo como o mesmo se dá a conhecer, a saber, de modo geral através da natureza (cf. Sl 19.1-6), e de modo particular através de Sua palavra (cf. Is 8.20; Rm 15.4).

IV. [Respostas aos Argumentos].

1. Quanto ao primeiro argumento se responde que, embora Deus habite na luz inacessível, a natureza e o esplendor desta luz, ao ser apenas pensada, envolve o intelecto na caligine; portanto, Deus habita na luz, onde não há treva, mas o intelecto humano ao contemplá-Lo, é envolto na caligine, devido ao esplendor da luminosidade desta luz. Logo, a caligine não consiste na luz na qual Deus habita per se, mas no efeito desta luz no ser humano ao contemplá-Lo.

2. Donde fica clarividente a resposta ao primeiro argumento.

3. Quanto ao terceiro se responde que, a herança dos fiéis é na luz; ora, Deus habita na luz, então, a herança dos fiéis é habitar com Deus; no entanto, isto se refere a glória celeste, onde livres do Pecado e de toda imperfeição desta vida, poderemos contemplá-Lo tal como Ele é (cf. 1Co 13.12b); todavia, nesta vida, ainda que com o efeito da graça, não podemos vê-Lo plenamente (cf. 1Co 13.12a); logo, ao contemplá-Lo nesta vida, o fiel o vê através da caligine, na qual penetra pela fé guiado pelo Espírito Santo, na qual consegue contemplá-Lo e viver diante de dEle em idoneidade pelo efeito da graça; o que, em si, é a antecâmara da glória celeste ou da visão beatífica.

 

<Dúbia II>

Acerca da segunda, procede-se assim: se Deus, que habita numa luz inacessível, pode ser contemplado.

E parece que sim.

I. [Argumentos].

1. A contemplação de Deus é o fim último do homem; logo, tudo que existe no homem é suficiente para tudo aquilo para o que naturalmente tende; portanto, como o homem tende à contemplação de Deus, então, Deus, que habita numa luz inacessível, pode ser contemplado.

2. Ademais, diz a Escritura: “E chamou Jacó o nome daquele lugar Peniel, porque dizia: Tenho visto a Deus face a face, e a minha alma foi salva” (Gn 32.30); portanto, Jacó viu a Deus face a face, isto é, o contemplou; logo, etc.  

3. Ademais, é dito sobre Moisés: “E falava o SENHOR a Moisés face a face, como qualquer fala a seu amigo” (Êx 32.11a); portanto, como Deus falava a Moisés face a face, isto significa que Moisés o contemplou; logo, etc.  

4. Ademais, o Príncipe dos Profetas diz: “os meus olhos viram o rei, o SENHOR dos Exércitos!” (Is 6.5c); ora, se o profeta Isaías viu a Deus com seus olhos, então, Deus, que habita numa luz inacessível, pode ser contemplado.

II. [Em Contrário].

1. Mas, em contrário, diz a Escritura: “Não poderás ver a minha face, porquanto homem nenhum verá a minha face e viverá” (Êx 33.20); logo, como os homens não permaneceriam vivos ao verem a Deus, logo, os mesmos, nesta vida, não o podem contemplar; portanto, Deus, que habita numa luz inacessível, não pode ser contemplado.

III. [Solução].

1. A luz inacessível, o é por dois motivos: primeiro, pela habitação de Deus, que transcende completamente o alcance humano, pois habita na eternidade (cf. Is 57.15); segundo, pela incapacidade humana de chegar per se até Deus (cf. Rm 3.11). Logo, Deus, habita numa luz inacessível, e, por isso, não pode ser contemplado em Seu ser. No entanto, como o ser humano tende para a beatitude eterna, e a beatitude eterna consiste na contemplação de Deus, então, deve haver um modo pelo qual o ser humano possa contemplar a Deus nesta vida.

2. Ora, o ser humano pode contemplar a Deus nesta vida, como efeito da graça, pois, pela graça se alcança a salvação (cf. Ef 2.8-9), e a salvação é a porta de entrada para a contemplação de Deus, já que pela graça Deus justifica os pecadores, dando-lhes acesso a Sua presença, tal como diz o Apóstolo: “Sendo, pois, justificados pela fé, temos paz com Deus por nosso Senhor Jesus Cristo; pelo qual também temos entrada pela fé a esta graça, na qual estamos firmes; e nos gloriamos na esperança da glória de Deus(Rm 5.1-2). Logo, a contemplação de Deus nesta vida, se dá pela entrada pela fé a esta graça, a qual proporciona o ser humano contemplar a Deus, ainda que nesta vida de forma imperfeita e embaçada (cf. 1Co 13.12a), ao passo que, na glória, se O contemplará de maneira perfeita e cabal, de maneira a ser afirmar como o Apóstolo afirmara: “então, veremos face a face; agora, conheço em parte, mas, então, conhecerei como também sou conhecido” (1Co 13.12b).

IV. [Respostas aos Argumentos].

1. Quanto ao primeiro argumento se responde que, embora o ser humano tenda ao seu fim último, o mesmo não é alcançado naturalmente; pois, este fim transcende as coisas naturais; logo, é necessária a divina revelação para demonstrar este fim e torná-lo conhecido; mas, o ser humano não atinge este fim per se; logo, Deus não pode ser contemplado nesta vida, a não ser como efeito da graça naquele que fora por Ele regenerado e justificado (cf. Tt 3.4-7; Rm 5.1-2).

2. Quanto ao segundo se responde que Jacó viu a Deus através de uma teofania, isto é, uma manifestação divina de forma entendível ao ser humano; mas, Jacó não o viu em Seu resplendor total; logo, Jacó o viu de modo que o próprio Deus se tornou visível a Ele, mas não na manifestação excelsa de Seu Ser na glória. Portanto, Jacó o contemplou, a partir do efeito da obra divina em se dá a conhecer, isto é, pela graça; assim, Deus pode ser contemplado a partir do efeito de Sua obra em se tornar conhecido aos homens, mas os homens não o podem conhecer per se. Além disso, Deus se mostrou a Jacó para salvá-lo; logo, Jacó contemplou a Deus para a salvação; portanto, o homem, nesta vida, pode contemplá-Lo como efeito da graça, já que pela graça é que se é salvo (cf. Ef 2.8-9). Logo, o ser humano pode contemplar a Deus nesta vida apenas como efeito da graça, e não per se.

3. Quanto ao terceiro argumento se responde que Moisés falava com Deus como a um amigo, e Deus falava com Ele; logo, parece que Moisés o contemplou; todavia, Deus falava com Ele, e não Moisés que o via tal como Ele é; por isso, Moisés o contemplou na manifestação de Sua glória; ora, toda manifestação da glória de Deus que é compreensível aos homens é efeito da graça; logo, Moisés O contemplou e falou com Ele como efeito da graça, e não per se; ou mais propriamente Moisés o viu pelas costas na fenda da penha (cf. Êx 33.18-23), porque encontrou graça diante de Deus (cf. Êx 33.17).

4. Quanto ao quarto argumento se responde que o Príncipe dos Profetas viu a Deus num alto e sublime trono; mas, o viu naquilo que o próprio Deus permitiu em ser visto; além disso, era profeta de Deus à Israel; logo, era separado por Deus; por isso, pode contemplá-Lo não em Si mesmo, mas em Seu trono; ora, aqueles que eram designados como profetas era para serem mensageiros das boas-novas (cf. Is 40.9); portanto, eram designados como profetas como efeito da graça de Deus para anunciar Sua vontade a Seu povo. Logo, o Príncipe dos Profetas o viu, não per se, mas como efeito da graça em sua vocação como profeta, como canal de Deus para transmitir Sua revelação; e isto se prova pelo fato de que, ao vê-Lo, o profeta exclamou: “Então, disse eu: ai de mim, que vou perecendo! Porque eu sou um homem de lábios impuros e habito no meio de um povo de impuros lábios; e os meus olhos viram o rei, o Senhor dos Exércitos!” (Is 6.5); e isto demonstra o reconhecimento de Sua pecaminosidade diante da santidade de Deus. Logo, contemplou a Deus, o que o fez ver quem ele realmente era; ora, contemplar a Deus deste modo é efeito da graça, já que ao se contemplá-Lo, se compreende a pecaminosidade do próprio coração; e este é o efeito da graça para a salvação: contemplar a Deus para se compreender Seu amor e conhecê-Lo como o Salvador; enquanto contemplá-Lo per se é virtude da felicidade eterna que os homens não alcançam plenamente nesta vida, mas apenas na glória.

V. [Resposta ao Em Contrário].

1. De fato, os homens, se vissem a Deus face a face não permaneceriam vivos, dada a excelsa glória que contemplariam (cf. Êx 33.20); por isso, nesta vida, os homens não o podem contemplar em Sua glória; todavia, o podem contemplar como efeito da graça; por isso, mesmo que habite numa luz inacessível se pode contemplá-Lo não como hábito inerente a esta luz, que aos homens naturais per se é inacessível, mas como hábito proveniente da graça, dado as “abundantes riquezas da sua graça” (Ef 2.7), nas quais, Deus provê vários meios e modos para ser conhecido pelos homens nesta vida (cf. Hb 1.1-2; etc.).

 

<Dúbia III>

Acerca da terceira, procede-se assim: se a afetividade deve orientar a teologia.

E parece que sim.

I. [Argumentos].

1. A afetividade é mais propriamente o modo de orientar a teologia pois o que importa é o amor; pois, o amor é evidência de que se é nascido de Deus (cf. 1Jo 4.7b); ora, a afetividade tem preeminência no que concerne a existência eclesial; portanto, também a tem no que concerne a reflexão teológica; logo, a afetividade deve orientar a teologia.

2. Ademais, o Apóstolo diz que o que importa é a fé que opera em amor (cf. Gl 5.6); logo, a operação da fé diz respeito ao amor; ora, o que concerne ao amor diz respeito a afetividade; logo, como o amor é o que importa à fé, então, a afetividade é o aspecto mais importante ao se elucubrar sobre a fé; portanto, a afetividade deve orientar a teologia.

3. Ademais, o evangelista dos segredos de Deus diz que não há necessidade de que ninguém ensine os fiéis pois estes têm a Unção que lhes ensina todas as coisas (cf. 1Jo 2.27); ora, esta Unção, o Espírito Santo, é chamado, a partir da processão em Deus, de Amor; logo, a afetividade é evidência da atuação do Espírito, do Amor; portanto, pneumaticamente, é evidente que a afetividade deve orientar a teologia.

II. [Em Contrário].

1. Mas, em contrário, Tomás diz que a doutrina sagrada é mais especulativa do que prática (cf. STh Ia, q. 1, a. 4, co.); logo, lida principalmente com algo especulativo; ora, se lida principalmente com algo especulativo – a saber, Deus -, então, isto deve orientar a doutrina sagrada; portanto, a afetividade não deve orientar a teologia.

III. [Solução].

1. A teologia deve ser orientada de acordo com seu princípio constitutivo mais evidente, a saber, que é uma ciência especulativa; logo, a via intelectual deve orientar a teologia, pois a glória da fé é o conhecimento de Deus (cf. Jr 9.24); e o conhecimento se estabelece pela via intelectual; portanto, a glória da fé é o conhecimento intelectual que se pode obter de Deus nesta vida através da Revelação, o qual permeia o fiel em todas as suas ações, na prática dos mandamentos; assim, inicia-se pela via intelectual e consuma-se na via afetiva, nesta ordem, pois a intelecção que se consuma mostra-se no agir correto; pois, do contrário, se tem desordem quanto a constituição do ser, já que o ser pressupõe o conhecer tanto para o próprio ser quanto para ser. Logo, no que concerne ao conhecimento das coisas de Deus, ser e conhecer estão juntos: o conhecer precede o fazer (ética), já que a medida que se conhece mais de Deus, mais o fiel vai sendo transformado pelo Espírito como efeito da graça (cf. 2Co 3.18).

2. Além disso, se constata que a via intelectual deve orientar a teologia já que a mesma é uma ciência (cf. STh Ia, q. 1, a. 2, co.); e, como compete a ciência elucubrar sobre o assunto que lhe convém - no caso da doutrina sagrada, Deus -, então se compreende que o que deve orientar a ciência é o modo do assunto que lhe convém; logo, como convém a doutrina sagrada o modo especulativo do saber, já lida com Deus, então, se constata que o que deve orientar a doutrina sagrada é a via intelectual, já que esta abaliza o que concerne as potências da alma para a compreensão e a aplicação deste saber na prática; pois, segundo Alberto o intelecto intelige tudo (cf. De Int. et Intel., trat. I, cap. 6); logo, analogamente, se pode afirmar que a via intelectual concerne a teologia já que comporta tudo quanto diz respeito aos princípios da doutrina sagrada, na qual estão ordenadas todas as matérias com relação a Deus (cf. STh Ia, q. 1, a. 7, co.); ademais, é parte constitutiva da própria existência da doutrina sagrada, sem o qual a doutrina sagrada não se estabelece como ciência. Portanto, a via intelectual não somente se estabelece em ordem ao saber, mas pela ordem disposta na própria doutrina sagrada quanto as coisas concernentes a Deus, já que tem por preceito a autoridade normativa da Escritura, pois seus princípios são obtidos por divina revelação (cf. STh Ia, q. 1, a. 8, ad. 2), a qual é fundamentalmente uma via intelectual, procedente da ciência de Deus (cf. Sl 139.6; Rm 11.33). Logo, tudo quanto concerne ao lidar com temas oriundos destes preceitos, deve ser embasado e abalizado pela via intelectual.

IV. [Resposta aos Argumentos].

1. Quanto ao primeiro argumento se responde que embora na doutrina sagrada se tenha a preeminência do amor, o amor nunca diz respeito a somente a afetividade, ou a propriamente a orientação a partir da afetividade; mas sempre o amor a partir da verdade (cf. Ef 4.15); pois, a afetividade só tem sentido na verdade e sob a verdade; portanto, aquele que nasce de Deus, nasce pelo encontro com a Verdade (cf. Jo 14.6), e assim na afetividade demonstra que é nascido de Deus, tal como diz a Escritura; portanto, a afetividade só tem valor na existência eclesial orientada sob a verdade; logo, o que concerne a reflexão teológica é a verdade seguida pelo amor, e não o amor seguido pela verdade; ora, esta ordem importa, pois diz respeito a ordem do que Deus revelou de Si, a saber, como Verdade (cf. Dt 32.4b) e como Amor (cf. 1Jo 4.8); etc. Portanto, implica necessariamente a mesma ordem no que concerne a orientação teológica, já que é a ordem imbuída do raciocínio escriturístico.

2. Quanto ao segundo argumento se responde que a proposição do Apóstolo diz respeito ao modo de operar da fé, não tanto ao que concerne diretamente a própria fé; pois, a fé opera em amor; mas a fé se estabelece a partir do conhecimento (notitia) de Deus, já que a fé vem pelo ouvir a Palavra de Deus (cf. Rm 10.17); portanto, o que concerne a fé, primeiramente e fundamentalmente está em ordem a Palavra de Deus; e, somente depois, operar em amor nas obras de caridade (cf. Gl 6.10; Tg 2.18); mas, o operar da fé só se dá a partir da Palavra de Deus, pois o que importa a fé é o que conhecimento de Deus, essência da felicidade eterna (cf. STh Ia, q. 1, a. 4, co.); logo, a Palavra de Deus é o aspecto que mais importa ao se elucubrar sobre a fé, e não a afetividade; pois, a afetividade é consequência da fé firme e sóbria, e a não a causa da fé; portanto, o que deve orientar a fé é a causa da mesma e não seus efeitos no fiel; logo, a palavra de Deus é o que deve orientar a teologia e não a afetividade.

3. Quanto ao terceiro argumento se responde que a expressão do evangelista dos segredos de Deus diz respeito a iluminação do fiel nas coisas concernentes a Deus; no entanto, mesmo nestas coisas há necessidade do ensino, pois a Escritura fora outorgada para o ensino (cf. 2Tm 3.16); logo, o Espírito Santo, o Amor, conduz os fiéis no conhecimento de Deus a partir do entendimento oriundo da explicação das Escrituras, através da qual Deus outorga sabedoria aos homens (cf. Sl 119.130); assim, a atuação do Amor, é a operação em função do conhecimento da revelação, para com isso, engendrar a afetividade; pois, afetividade sem conhecimento é emoção vã, que torna o fiel sujeito a qualquer vento de doutrina (cf. Ef 4.14), tal como as nuvens errantes (cf. Jd 1.12b); portanto, quanto a teologia pneumática, é evidente que a teologia deve ser orientada pela via intelectual, a saber, pela Palavra de Deus, e não pela afetividade, pois a maior evidência da atuação do Espírito no fiel é a santificação, a qual Ele efetua, entre outros meios, através da Palavra de Deus (cf. Jo 17.17). Logo, é pela Palavra de Deus, a via intelectual, e não pelas experiências pessoais, a via afetiva, que se deve orientar a reflexão teológica e a existência eclesial (cf. At 2.42).  

V. [Resposta ao Em Contrário].

1. Em relação a isso, se constata que a ciência sagrada é ao mesmo tempo ciência especulativa e prática, como afirma Tomás; todavia, em relação a ordem que concerne a esta ciência, é antes especulativa do que prática, dado ao seu objeto ser o assunto especulativo por excelência; ora, nisto está preceituado o que deve orientar a ciência sagrada; logo, a teologia deve ser orientada pelo preceito especulativo e não pelo preceito prático ou afetividade. Pois, a regra de fé quanto a reflexão sobre Deus se baseia na revelação de Deus e não na experiência e/ou afetividade humana, mesmo a dos mais santos doutores, como se confirma pela autoridade de Santo Agostinho (cf. Epist. 82, 1), e de outros Padres da Igreja; etc. Ora, quanto aos preceitos dionísicos, que açambarcam tudo quanto diz respeito a estes aspectos, se deve orientar pela via intelectual e não pela via afetiva. Logo, quanto ao Corpus Dionysiacum, a via intelectual é o que concerne à orientação teológica e não a via afetiva. 



[1] O texto da Epístola V provêm de uma adaptação da tradução de Mário Santiago de Carvalho (In: Medieavalia 10 [Porto: Fundação Eng. António de Almeida, 1996], pág. 77).

[2] A epístola V, constitui-se uma excelente introdução a obra “De Mystica Theologia”; pois, esta obra, de suma importância, é o escrito fundamental para se entender o programa teológico dionísico, e para se compreender os aspectos concernentes a toda a teologia mística que se desenvolveu desde então, tanto na teologia latina quanto na teologia grega.

[3] cf. Alberto Magno, Commentari In Epistolas B. Dionysii Areopagitae, epist. V, A, In: Op. Om., XIV, 892.

[4] Este é o termo em língua portuguesa mais apropriado para significar o que Pseudo-Dionísio pretende ao afirmar sobre “γνόφον” (gnofon), muito mais do que “bruma” ou “treva”, como costumeiramente se apresenta nas traduções das obras de Pseudo-Dionísio.

[5] Filipe Melanchthon, Loci Theologici - Tópicos Teológicos de 1521 [São Leopoldo, RS: Sinodal/EST, 2018], § 84, n. 4-5, pág. 39.

[6] Tomás de Aquino, Comentário a Tessalonicenses [Porto Alegre, RS: Concreta, 2015], 2ª Epístola, Cap. II, lect. 2, n. 48, pág. 145. 


Explicação do “Epigrama sobre Hegel” de Karl Marx

Proêmio   O “ Epigrama II ” ou “ Epigrama sobre Hegel ” (1837) [1] é um texto fundamental da filosofia marxiana, e é um dos textos mais...